A PASTORINHA
No alto dum monte, via-se uma casa
que parecia ser feita para a existência dum ser feliz.
Toda a gente que passava pela
estrada pousava ali os olhos com admiração.
Era circundada por uma linda e
frondosa trepadeira de glicínias, cobrindo-a toda, e os seus cachos
ramalhetados ficavam pendentes do róseo beiral.
Todas as manhãs, mal o Sol
despontava, à hora em que os passarinhos dobravam os seus trilos, quem passava
via sempre uma pastora, sentada na beira do muro que orlava a estrada.
Um dia, passou junto dela outra
pastora, dizendo-lhe:
— Que fazes
aí todas as manhãs tão distraída, sem veres transitar ninguém? Quando aqui
passei hoje com o meu rebanho, chamei-te e não me ouviste.
— É que
estava tão triste, a pensar na doença da minha mãe, que deitei o gado a esmo
pelo campo e deixei-me com a minha tristeza. Tanto trabalho, que já me não
sinto com forças para mais trabalhar. Não nos larga a miséria. Tudo é pouco
para as nossas necessidades.
— Olha! aqui
tens esta ovelhinha que te dou e vende-a para remediares um pouco a tua vida,
disse-lhe.
— Oh!
abençoada sejas volveu a pastorinha.
— Adeus e
fica em paz.
E lá seguiu com o seu grande
rebanho.
A pastorinha ficou a chorar
comovida pela caridade da desconhecida. Depois, caiu como que num adormecimento
suave; e, passado pouco, olhou para a casa que tanto a atraía, e qual não foi o
seu espanto ao ver que cada glicínia tinha cachos de ouro!
Mas a visão foi rápida, porque logo
apareceu de novo a mesma casinha branca.
Em seguida, juntou as ovelhinhas e
foi para casa dar todas essas novidades a sua mãe, que delas ficou maravilhada,
e disse:
—Olha, minha
filha, isso foi ilusão tua... foi com certeza um sonho...
— Não, minha
mãe, não foi ilusão nem sonho. E agora vou-lhe buscar a ovelhinha que me deu a
pastora. É tão bonita que tenho mesmo pena de a vender!
— Mas a
necessidade, filha, assim o manda.
— Vendê-la...
e tão linda que ela é!
— Mas então
não a vendamos, esperemos mais algum tempo, a ver se a nossa vida se compõe.
—Pois sim,
minha mãe. Fico toda contente. Vou já ao campo sachar o milho e levo-a comigo,
que tenho medo que ela desapareça.
— Vai, filha,
e que o anjo bom te acompanhe. Tanto trabalhas, pobre inocente!
— Não diga
isso, mãe, eu não me sinto cansada. O trabalho dá vida!
E lá partiu com a ovelhinha para o
campo. Depois de muito lidar, sentou-se, e a ovelhinha estendeu-se à sua beira
lambendo-lhe as mãos e deixando-lhe cair da boca, no regaço, flores de
glicínias que se transformaram em moedas de ouro, desaparecendo logo numa
corrida doida.
A pastorinha ficou assombrada com
tudo o que via.
Ao outro dia, a pastorinha pagou as
dívidas e continuou a trabalhar. Em seguida, foi sentar-se no mesmo lugar à
beira do muro, contemplando a casa das glicínias, mas agora cheia de alegria.
E de repente presenciou a mesma
transformação, e a ovelhinha puxou-lhe pelo avental, como que convidando-a a
segui-la.
Seguiu-a até junto da maravilhosa
casa que de novo se transformou, em diferentes coloridos; e no cimo do portão,
em grandes letras de ouro, podia ler-se:
— Em nada toques, apesar da tentação.
Espera a riqueza só pelo trabalho, e aceita-a quando ta derem. Respeita o
alheio.
A ovelhinha bateu de mansinho no
rico portão, e ele abriu-se de par em par.
A pastorinha entrou, e os seus
olhos ficaram deslumbrados com tamanha riqueza que via.
E a ovelhinha desapareceu.
E logo, dentro dum cacho de
glicínias, surgiu um rosto lindo como o dum anjo, dizendo com ternura:
— Aqui me
encontrarás sempre, enquanto fores dedicada ao trabalho e boa filha. Eu sou a
deusa do trabalho e do benfazer. Em recompensa das tuas virtudes, dou-te o
bastante para te libertar da fome. Aqui tens esta glicínia. Planta-a no teu
jardim, que ela te socorrerá quando necessitares.
A pastorinha, com palavras cheias
de lágrimas, agradeceu à boa deusa e cumpriu o que ela ordenara, vivendo sempre
feliz,
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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.
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