3/23/2025

A Mãe d'água ("Histórias da Baratinha"), por Figueiredo Pimentel


A MÃE D'ÁGUA

Foi um dia uma princesa, filha de uma fada muito poderosa, e do rei da Lua, que era o marido da fada.

Sua mãe fizera dela Rainha das Águas, para governar todos os mares e todos os rios.

A princesa era formosa como a Virgem Maria. Os cabelos verdes, muito verdes, chegavam até aos pés, e ainda arrastavam pelo chão — os fios verdes que andam boiando em cima d'água, e se chamam limo, são tranças dela. Os olhos, sem cor — eram assim como uma claridade de luar cegante.

Ficou-se chamando a Mãe d'água, e como era assim bonita, foi adorada por muitos príncipes, que com ela pretendiam casar.

Mas o seu coração já pertencia a um rei, lindo como o Sol, que, segundo se dizia mesmo, era filho dele.

Houve muitos combates, e tendo o filho do Sol saído sempre vencedor, alcançou a mão da princesa. Celebrou-se o casamento, por entre festas deslumbrantes, que duraram nove dias e nove noites.

Ao cabo desse tempo partiu o rei para o seu palácio, levando consigo a esposa.

A princesa disse-lhe, então, que três meses de ano havia de passar com a fada, sua mãe, e o resto do tempo com ele.

O rei, que lhe queria imensamente, ficou triste. Era, porém, tão bom, que consentiu, porque pensava, com razão, que se ela não fosse filha extremosa, não poderia ser nem boa esposa nem boa mãe.

Assim sucedeu, e em certa época do ano, a princesa passava com a fada no seu palácio de diamantes, no fundo do mar.

Viveram felizes alguns anos, até que a princesa teve um filho — o menino mais bonito que jamais se viu. A mãe adorava-o, o pai morria por ele, e todos quantos o viam ficavam encantados.

* * *

Chegando o tempo em que ela tinha de visitar a fada, quis levar o filhinho em sua companhia porém o rei tanto pediu e rogou, que ela teve pena do pobre, e deixou-o muito pesarosa, depois de recomendar ao esposo que lhe dispensasse todos os cuidados.

Entretanto no palácio de diamantes, a filha do rei Lua não encontrou sua mãe, que fora transformada numa flor muito grande, muito alva, dessas que nascem em cima das águas.

A princesa procurou-a por toda a parte com tal desespero, chorando tanto, que o rei das fadas perdoou a velha, dando-lhe a sua primeira forma.

Mãe e filha abraçaram-se contentíssimas, e dali saíram, navegando em uma concha de pérola e ouro, ansiosas por verem — a rainha, seu esposo e filho — a fada, seu lindo netinho.

Haviam decorridos longos anos, e o rei, vendo que a mulher não voltava, ficou desconsolado e triste.

Como na corte havia muita gente malfazeja, espalhou-se que a rainha se havia apaixonado por um príncipe do mar.

Sua majestade, a princípio não deu crédito à calúnia, mas finalmente acreditou em vista da demora.

Para se vingar, casou com outra princesa.

A madrasta, malvada e sem coração, mandou o principezinho para a cozinha, fazendo-o trabalhar como um negro.

Um dia em que o menino vinha todo sujo de carvão, carregando lenha do mato, encontrou com a princesa do mar que chegava. Não sabia quem era mas ela logo o reconheceu e o abraçou comovida. Então soube o que tinha passado.

Sem querer ver mais o ingrato, sumiu-se com o filho do seu coração para o fundo do mar.

Por sua ordem, as águas começaram a crescer... a subir... a subir... e afogaram o palácio, o rei, a nova rainha, e todos os que a tinham caluniado.



---
Pesquisa, transcrição e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sugestão, críticas e outras coisas...