SILÊNCIO ABSOLUTO
Desde que começou a trabalhar na antiga fábrica de tijolos, a estrada do velho cemitério era sua passagem obrigatória. Passava ali como se estivesse caminhando por uma rua qualquer da cidade, indiferente a tudo, como se lá dentro não estivessem enterradas pessoas que amaram e que foram amadas, pessoas de importância elevada e de significância parca, pessoas que receberam aplausos e que foram invejadas...
Mesmo à noite, quando fatigado voltava de sua extra jornada, ao beirar o grande muro do prisco sepulcrário, não sentia nada, não ouvia nada... Mesmo os pios agourentos de uma coruja invisível lhe eram tão inexpressivos quanto os próprios cadáveres, seus espectadores. Seguia por ali como se fosse a provecta estátua de um jazigo, uma estátua que agora assobiava ou cantarolava.
Porém, numa tarde de um glorioso verão, quando o sol
vermelho já se escondia na fronteira do infinito azul, ao passar rente ao
portão da anosa necrópole, o homem, enfim,
estremeceu apavorado. Um frio dolorido percorreu toda a extensão de sua espinha
dorsal, atingindo seu cérebro como se fosse a descarga de um raio fulminante. A morte então apareceu na figura de um
palhaço, de revólver em punho. Um tiro certeiro no crânio, um grito fino e
agudo, o tombo fatal, o pio de uma coruja, a sombra da noite, o silêncio
absoluto...
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São Paulo, agosto de 2023.
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