O ADIVINHÃO
Era
uma vez um campônio, pobre e manhoso, chamado Besouro. Um dia, roubou a uma
velha uma peça de pano e escondeu-a num montão de palha; depois começou a
gabar-se que sabia adivinhar. A velha foi ter com ele e pediu-lhe que
adivinhasse onde estava a peça de pano.
O
campônio perguntou-lhe:
—
O que é que me dá pelo meu trabalho.
A
velha disse:
—
Dou-lhe um pud (moeda russa) de
farinha e um arrátel de manteiga.
O
campônio disse:
—
Está bem.
Depois
pôs-se a adivinhar e disse-lhe onde o pano estava escondido.
Daí
a dias, roubaram um cavalo a um fidalgo.
Foi
ainda o campônio que o roubou e levou para uma floresta, amarrando-o a uma
árvore. O fidalgo mandou chamar o campônio, que se pôs a adivinhar e disse:
—
Ide depressa, que o cavalo está na floresta amarrado a uma árvore.
Trouxeram
o cavalo da floresta. O fidalgo deu cem rublos ao adivinhão, e a fama deste
espalhou-se por todo o reino.
Nisto
desapareceu um precioso anel do rei; fartaram-se de o procurar, mas não o
encontraram. Ora o rei mandou chamar o adivinhão a toda a pressa.
Pegaram
nele, meteram-no numa carroça e levaram-no à presença do rei. O rei disse:
—
Bom dia, tiozinho; ora deite-me cartas; se adivinhar, dou-lhe dinheiro, e, se
não adivinhar, corto-lhe a cabeça.
O
rei mandou imediatamente o adivinhão para um quarto especial, dizendo:
—
Deixo-o deitar cartas toda a noite, para a resposta estar pronta pela manhã.
O
adivinhão estava sentado naquele quarto a pensar: “Mas que resposta hei de eu
dar ao rei? Deixo-me estar aqui até meia-noite, e depois safo-me; e há de ser
quando o terceiro galo cantar”.
Ora
o anel do rei tinha sido roubado por três homens da corte: o lacaio, o cocheiro
e o cozinheiro. Estando estes três a conversar, disseram entre si:
—
Se este adivinhão nos descobre, temos a morte certa. Vamos escutar aporta: se ele
não disser nada, também nos havemos de calar; mas se souber que fomos nós, não
temos mais remédio senão pedir-lhe que não diga nada ao rei.
O
lacaio foi pôr-se à escuta; de repente cantou o galo, e o campônio disse:
—
Graças a Deus, um já canta; agora espero mais dois.
O
lacaio ficou muito assustado; foi ter com os companheiros e disse-lhes:
—
Ai, amigos, ele conheceu-me; mal cheguei à porta, gritou logo: “Um já canta;
agora espero mais dois”.
O
cocheiro disse:
—
Agora vou eu.
Pôs-se
à escuta. Cantou o segundo galo, e o campônio disse:
—
Já canta o segundo; agora espero mais um.
O
cocheiro disse para os companheiros:
—
Isto vai mal, pois também me conheceu a mim.
Diz
o cozinheiro:
—
Se também me conhecer a mim, não temos outro remédio senão irmos ter com ele e
pedirmos-lhe que não diga nada ao rei.
O
cozinheiro foi pôr-se à escuta; nisto cantou o terceiro galo, e o campônio
benzeu-se, dizendo:
—
Graças a Deus, já canta o terceiro.
Ao
proferir estas palavras, correu à porta para se safar, mas os ladrões foram-lhe
ao encontro, caíram-lhe aos pés e pediram-lhe muito dizendo:
—
Não diga nada ao rei, tiozinho; tome lá o anel!
O
adivinhão disse:
—
Está bem, estão perdoados.
O
adivinhão levantou uma tábua do sobrado, e deitou o anel por baixo.
No
dia seguinte, o rei perguntou ao campônio:
—
Que tal, tiozinho?
O
camponês respondeu:
—
Já sei, o anel de vossa majestade caiu no chão e ficou debaixo desta tábua.
Levantaram
a tábua, e encontraram o anel. O rei recompensou generosamente o adivinhão,
dando-lhe dinheiro, e mandou dar-lhe de comer e beber até mais não; em seguida
foi passear no jardim; apanhou um besouro e voltou ao adivinhão, dizendo:
—
Ora se é adivinhão, adivinhe lá o que tenho fechado nesta mão?
O
campônio assustou-se e pôs-se a dizer consigo:
—
Ai! Besouro, agora é que o rei te tem nas mãos!
O
rei disse:
—
Isso mesmo, adivinhaste!
E
deu-lhe mais dinheiro, deixando-o voltar para casa com todas as honras.
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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2006.
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