A chuva
Um mercador voltava um dia da
feira; na garupa do seu cavalo tinha ele a sua mala cheia de dinheiro. A chuva caia
com violência, e o bom homem estava molhado até à medula dos ossos; maldizia
por isso o mau tempo, e queixava-se de Deus por lhe dar uma viagem tão
aborrecida.
Passando daí a instantes por uma
floresta muito espessa, viu à margem do caminho um salteador; sentiu um susto
tão grande, que supôs ser chegada a sua ultima hora de vida.
O salteador levou a coronha da
espingarda à altura do rosto e fez-lhe pontaria; porém a escorva, estando
molhada pela chuva, falhou fogo, e o mercador, chegando as esporas ao animal,
escapou felizmente de ser morto.
Depois que se viu livre do perigo,
disse consigo mesmo: — Que mal fiz eu em não suportar com paciência a chuva
como um benefício de Deus! Se o tempo fosse bom, a esta hora eu estaria morto e
os meus filhos esperariam em vão pela minha volta. A chuva que eu maldizia foi
que salvou-me a vida e a fortuna.
O que às vezes nos parece mal
Oculta um bem celeste e divinal.
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Tradução de Nuno Álvares.
Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2023.
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