4/09/2023

Como se ganha uma demanda (Conto), de Rodrigo Paganino


COMO SE GANHA UMA DEMANDA

Era pelos fins de novembro, ao aproximar da noite. Soprava rijo o vento das bandas do sul e as nuvens acasteladas e escuras corriam como cavalo à desfilada. Principiavam a cair grossas gotas d'água, e ao longe já rugia a tempestade. Como é vulgar no inverno, no campo, quase que não houvera crepúsculo da tarde. Apenas se escondera o sol e já a escuridão baixava sobre os campos. No sítio onde começa a ação da história que se vai ler, não havia notícia de povoado: era a meio de uma azinhaga, que se contorcia por entre terras cobertas de restevas, e tristes como a nudez mal vestida de farrapos.

Joaquim dos Santos tinha metido o cavalo a trote para fugir à trovoada próxima e às trevas eminentes; enquanto debalde procurava orientar-se por meio dos olivais.

Joaquim dos Santos fora um dos mais endiabrados rapazes daqueles lugares. Deitara fama de si pelas proezas que fizera, e o seu nome não era bem falado naquelas vizinhanças, como um dos maiores extravagantes deste mundo.

Seu pai, que tinha alguns bens e que estimava deveras os seus dois únicos filhos, Joaquim e Raimundo, tratou de lhes dar educação decente, metendo-os no mais acreditado colégio de Lisboa.

Mas, enquanto Raimundo estudava com a melhor vontade, Joaquim fazia em água a cabeça dos professores, e piorava de dia para dia. Não podendo aturar, o diretor mandou-o para casa do pai, declarando lhe, que assim como não teria duvida de ensinar de graça a Raimundo, visto o seu bom porte e aplicação; por dinheiro algum deste mundo se resolveria a suportar o irmão nem mais um dia.

Foi grande tristeza em casa de José dos Santos. As esperanças todas que depusera em seu filho mais velho desapareciam-lhe de repente. E o velho que já pensava em o mandar a Coimbra!

Joaquim, pela sua parte, declarou-se em guerra aberta com a letra redonda. Não nascera para doutor, nem se achava com sabedoria para letradices. Queria amanhar terras e ser lavrador como seu pai. Seu irmão, que parecia um menino Jesus de freiras, que se desse a semelhantes pieguices: ele era um homem, tinha pulso para guiar a rabiça de um arado, e pernas para se segurar num cavalo.

José dos Santos só contava um defeito, ser extremoso pelos filhos como ninguém. Concordou com a vontade do Joaquim, e meteu-o no trabalho debaixo da sua direção.

Mas, nem mesmo nos primeiros dias, o novo lavrador tomou gosto àquele modo de vida. Aborrecia-se do trabalho e, mal que podia, furtava-lhe o corpo para ir procurar a companhia dos piores rapazes da terra. Encontravam-no mais na taberna do que na eira, mais no jogo de bola do que no pomar, e mais nas patuscadas do que na lavoura.

Ao passo que se ia entregando a não fazer nada, iam-lhe medrando os defeitos e engordando os vícios. Tinha fama de valentão, e tão mau se havia feito, que o próprio pai se temia dele.

Ninguém podia ter-lhe mão, não ouvia conselhos, nem fazia caso do que lhe diziam para bem. Um dia que seu irmão Raimundo se lembrou de lhe falar a preceito para ver se o fazia chegar à razão; Joaquim, que não vinha em si, deu-lhe uma sova, que o deixou em lençóis de vinho.

Foi também a última que seu pai lhe aturou. O bom do velho apenas viu chegar seu filho querido, o seu ai Jesus, que fora sempre uma joia, e do qual ninguém dizia senão mil bens, em braços, e que soube quem fora o autor de tão grande maldade, jurou que nunca mais lhe poria os pés em casa homem de tão mau coração.

Deitou luto em sinal de o ter perdido e respondia a todos que lhe perguntavam porque vestia de preto: — é por meu filho Joaquim, que morreu.

Este jurou que se havia de vingar de seu irmão, ao qual atribuía a má vontade do pai, e foi cada vez a pior, passando todo o santo dia na taberna ou no jogo.

Entre os seus companheiros de perdição havia um, que sobre ele tinha mais poder; mesmo por ser o mais depravado. Era João Simões, capaz de ler de cadeira na patifaria e de passar por doutor na pouca vergonha.

Contribuíra mais do que ninguém para estragar o rapaz e fora quem lhe ensinara melhor o mau caminho. Joaquim, também, não rezava por outro breviário, e o que João Simões lhe dizia — era para ele um evangelho.

Andavam por aqueles tempos no lugar alguns homens a desinquietar trabalhadores para o Brasil, prometendo-lhes mundos e fundos de felicidade, quando lá estivessem, e passagem paga no navio para os que quisessem ir. João, que entrava em todos os negócios de má condição, travou conhecimento com os tais meliantes, e fez-se dentro em pouco um dos mais espertos aliciadores da companhia.

Como estava corrente com tudo que se passava, pois bem sabem que a ocupação do vadio é entreter-se com as vidas alheias, viera a ser em pouco tempo o perdigueiro de melhor faro para levantar a caça. Conhecia os que tinham menos dinheiro, os que mais desejavam ganhá-lo com pouco trabalho, os que tinham melhor embocadura para o vício, e os que menos duvidavam de abandonar terra e parentes.

Onde deitava a rede tirava peixe, já era sabido. Ninguém como ele acertava tão bem.

Apenas José dos Santos pôs seu filho fora de casa, logo João tencionou seduzi-lo para embarcar, e sem grande dificuldade conseguiu convencê-lo de que era o melhor partido que tinha a seguir.

Como ele jurava nas palavras do seu mestre, acreditou em tudo quanto lhe dizia, protestando entretanto, que se fosse desgraçado grande vingança tiraria de seu irmão Raimundo, o causador de tudo, lá no seu modo de ver. João entretendo-lhe a fúria foi acompanhá-lo ao embarque, encarregando-se não só de tratar de quantos negócios porventura viesse a ter; mas ainda de realizar os planos vingativos contra o irmão.

Tornou-se assim depositário de todos os seus ódios.

João incumbindo-se desta vingança, trabalhava também por sua conta, pois jurara pela pele de Raimundo, desde que este o tratou desabridamente, e lhe voltou costas num arraial.

O desgosto de ver seu filho tão mal encaminhado levou o pobre pai à cama: e Raimundo teve de deixar os estudos em meio para vir junto do velho, governar a casa e tratá-lo na doença.

Entrementes que estava cuidando em seu pai tomou-se de amores com uma rapariga da terra; e como era boa de caráter e boa de reputação, apesar de pobre, casou-se em breve, ganhando todos com o casamento. Ele porque alcançara uma esposa extremosa, José dos Santos porque ganhava uma enfermeira solicita, tão desvelada e tão carinhosa como a melhor filha.

Porém quando o mal é de morte triste remédio lhe podem dar o saber dos médicos, ou o cuidado dos enfermeiros. A ferida do doente era mesmo no coração, não tinha cura. Apesar da maneira porque Joaquim para com ele se houvera, estimava-o porventura mais ainda do que ao seu obediente e bom Raimundo.

Caprichos do sentimento, que mais nos fazem prender a afeição, a quem menos no-la merece; o velho, embora consigo mesmo o negasse, dera parte maior do seu coração ao filho perdido.

Muitas vezes em piedosa e apaixonada analise se desculpava desta parcial fraqueza. Era a ovelha desgarrada, que cuidados maiores requeria do pastor, era a terra maninha que pedia melhor cultura, era a árvore desviada, que chamava mais atenção para lhe emendar o erro.

A lembrança do filho era o tormento, e a enfermidade mais perigosa, que o definhavam. O barbeiro-sangrador do lugar, e o cirurgião vizinho tinham feito repetidas juntas sem atinarem com a razão do mal. Resolveram por fim, que padecia do interior, e acertaram sem saber.

José dos Santos ria-se dos entes de razão dos dois físicos, e sujeitava-se resignado ao tratamento que lhe aplicavam. Seu filho, sua nora, até o netinho de peito, todos se acercavam dele inquietos e suspeitosos da verdadeira causa do mal. Porém tão calado se conservara o doente, que não tinham passado de conjecturas.

À hora da morte apenas se lhes desvaneceram as[138] duvidas, porque, conhecendo como estava, chamou-os a todos, lançou-lhes a benção, e depois erguendo os olhos ao céu, exclamou:

— Compadecei-vos também dele, Senhor, tocai aquela alma perdida, com um raio da vossa divina graça... Se algum dia tornares a ver teu irmão, meu Raimundo, dize-lhe, que lhe perdoei tudo, e, que ao despedir-me do mundo, lhe deitei, cá de tão longe mesmo, a minha benção de pai.

Casa onde entra doença, não é o dinheiro que a aguenta: a moléstia de José dos Santos foi a ruína daquela família. Durara perto de dois anos o padecer do velho; custara muito àquela organização robusta o desprender-se do mundo, lutara como um homem; o desgosto, porém, vencera-o por fim.

Tudo estava empenhado, quando o antigo lavrador faleceu: foi mister pedir dinheiro para o enterro, e Raimundo amanheceu um dia sem pai, sem haveres, e com o filho e a esposa para sustentar.

Demais a família prometia-lhe aumentar-lhe, porque Leonor, sua mulher, estava grávida de tempo: e tanto que em poucos dias deu à luz uma filhinha, formosa como um serafim, e corada como uma rosa de primavera!

Diz-se que os filhos são a riqueza do pobre. Triste ironia! — Para o que padece de necessidade a vista das crianças sem pão é tormento mil vezes maior do que a própria fome. Quantos não sacrificariam a vida de bom grado, se em paga soubessem que garantiam a existência dos seus!

Suplicio, que se não descreve, é ver os inocentes, menos sofridos e porventura mais sinceros, não disfarçarem a fome e chorarem pedindo pão.

Enquanto a desgraça o perseguia, Raimundo, sem desanimar, ia trabalhando sempre, amparado pela força de vontade e pelo sentimento do dever.

Pelo contrário a fortuna, caprichosa como sempre, sorrira para Joaquim cujos negócios lá pelo Brasil iam de vento em popa.

João Simões, que com ele se correspondia regularmente, não descansava de lhe acirrar os ódios contra seu irmão, o qual para de tudo o privar, até lhe roubara a benção paterna, fazendo com que o velho à hora da morte amaldiçoasse o filho mal procedido.

Como já se disse, sucedera o contrário; mas o Simões, que era uma alma danada, queria vingar-se de Raimundo, e não recuava, por conseguinte, diante de uma mentira, ou duas que fossem.

Ao mesmo tempo encarecia lhe a prosperidade da casa e os grandes negócios, que José dos Santos fizera nos últimos tempos: dizia-lhe, que seu irmão ficara desfrutando uma grande fortuna, que se fingia pobre para não fazer partilhas, e que se Joaquim lhe mandasse procuração para tratar desse negócio, em breve lhe mostraria, se era ou não verdade, que seu irmão queria enganar toda a gente com a sua mentirosa pobreza.

Conseguiu por fim o que desejava: e mal teve a procuração em seu poder, começou a perseguir o desgraçado Raimundo a quem já devia bastar o seu mal.

A justiça não costuma estar em casa para receber os pobres; João Simões dispunha de dinheiro, e entendia de demandas, fazia o que queria. Tais artes teve, de tais manhas se socorreu, que conseguiu em pouco, que passassem um mandado de penhora contra Raimundo, como cabeça de casal em nome de seu irmão: enquanto este, lembrando-se com saudades da pátria ia liquidando os seus negócios, para poder regressar quanto antes. Tinha ganho algum dinheiro; mas não tinha contraído amizades: e estava rico; mas só e triste.

Mudara de vida completamente: aqueles anos tinham-no amadurecido, mas também o tinham cansado e gasto. Estava velho antes de tempo, precisava descansar e não há como a terra da pátria para aliviar penas de velhice e melancolias de coração. Havia bem pouco que chegara, quando nós o encontramos, fugindo da tempestade, e orientando-se por entre campos.

Eram recordações, eram saudades, que o tinham demorado, seguindo por aquelas vizinhanças, parando diante duma árvore, descobrindo-se diante duma cruz, apeando-se muitas vezes para ir ajoelhar diante duma pedra.

Tudo lhe falava à memória, tudo lhe falava ao coração.

Aqui passara tanto tempo espreitando seus companheiros, que o procuravam, e ele escondido; ali tivera o primeiro encontro apaixonado; mais em baixo estivera com seu pai; mais além descansava este em horas de calor, ou esperava os trabalhadores das suas fazendas, ao recolherem, para lhes perguntar notícias do trabalho.

E uma pedra para junto da qual viera correndo um dia a fugir do cão do tio Fernandes, esconder-se no regaço de sua mãe, toda em sustos de principio; tão enfurecida mais tarde apenas soube que fora ele, quem desafiara o cão!

Mundo de melancólicos e piedosos fantasmas, mundo, que o alheava à realidade, que o apartava do presente, tão só, tão vazio, tão sem significação, para lhe abrir francas, patentes e compassivas as portas do passado, tudo ali se transformava para ele, e em cada cousa cuidava ver uma feição querida, uma lembrança, uma alegria ou uma dor.

Por vezes lhe rebentaram as lágrimas dos olhos, por vezes sentiu-se sufocado, por vezes desejou, embalado pela doce harmonia da saudade, adormecer de todo no dormir, em que já descansavam seu pai e sua mãe.

E, que o explique quem melhor o pensou, nas ocasiões, em que o sentimento é em nós mais plácido, mas também mais profundo; nas horas de amor duvidoso, de aspiração indefinida, de descontentamento irremediável e infundado, parece que se levanta entre nós o desejo de outra vida, de outro mundo, de outra existência, não sabemos qual, mas que nos parece ter já vivido, e para o qual nos persuadimos, teremos de voltar.

Nessas horas de estranho e amorável sentir, como desterrados de regiões bem diversas destas, desejamos ver terminado o desterro e imediata a hora de regressar.

Foi o aproximar da tempestade que o distraiu destas melancólicas cogitações; deitou os olhos em roda e não conheceu o sítio. Tinha-se perdido no caminho. Novas estradas, novas mudanças tinham-lhe transformado o mapa, que a memória lhe estampara no coração, via-se a meio de olivais e as árvores confundiam se já com as sombras da noite.

Seguira, sem dar por isso, o melhor caminho, a estrada nova, e que por conseguinte não era do seu tempo. Não podia estar longe o povoado, mas a chuva cada vez apertava mais, e o cavalo já não queria andar assombrado com o fuzilar continuo dos relâmpagos, e aturdido com o ribombo temeroso dos trovões.

Entretanto estava resolvido a seguir à ventura, certo de que em pouco tempo encontraria abrigo; quando diante de si, na quebra de uma azinhaga, lhe pareceu ver uma sombra rasteirinha coser-se com o muro e seguir a modos de homem, que fosse agachado, como receando ser visto.

— Quem vai aí? perguntou Joaquim que costumado às aventuras do sertão não se inquietava muito com um mau encontro.

Mas a sombra seguiu mais apressada, sem dar resposta.

Joaquim chegou esporas ao cavalo e correu sobre o vulto.

Próximo reconheceu duas criancinhas, um rapasito de sete anos, ao mais, e uma menina de seis, que de mãos dadas e tremendo de medo ambos, ajoelharam quando o viram ao pé de si, exclamando o mais velho, e que parecia mais animoso.

— Não nos faça mal, temos o pai doente e vamos levar-lhe este remédio, que lhe receitou o mestre Eusébio.

(Eusébio ainda era sangrador-barbeiro aprovado pelo proto-medicato, e facultativo à falta deles).

Depois voltando-se para a irmã, que se fazia bem pequenina para se esconder atrás dele, disse-lhe, mudando as fraquezas em forças, e num tom mais seguro, como para lhe incutir valor.

— Não tenhas medo, Isabel, aquele senhor não nos há de fazer mal, não vês que tem cara de boa pessoa!

O pequeno não podia perceber que tal fosse a fisionomia de Joaquim; esta amabilidade era pois um argumento ad benevolentiam, aprendido quase intuitivamente, na retorica saloia.

— Não faço mal, não, pobres pequenos, com este tempo, tão mal resguardados!

Isto era dito já a pé junto deles e detendo se com verdadeira compaixão ao atentar nos farrapitos, que mal os cobriam.

— Nós cá não tem duvida: o pai é que precisa mais, está tão doente.

— Há três dias que não come nada.

— E a nossa mãe, coitadinha, há oito dias que não dorme!

— E o pai, está com uma cara! Nossa Senhora nos valha, parece um defunto.

— Não digas isso, Isabel!... depois aproximando-se mais de Joaquim, com quem ia já acostumando-se, e como para lhe provar que não era criança, o rapasito continuou mais de vagar; o pai está muito mal, que eu bem vi a cara que fez ontem o mestre Eusébio, mas a mãe não desconfia e a Isabel nada sabe.

— É muito longe a sua casa?

— Não, meu senhor, é logo ali.

— Pois vamos lá, que eu também os acompanho. Já agora... Não temos outra noite, e daqui ao lugar ainda há uma boa meia légua bem puxada. Quando lá chegasse achava tudo fechado.

— Mas o senhor vai ficar muito mal acomodado, exclamou a pequena, que ainda se não afizera muito ao seu novo conhecido, a gente é tão pobre!

— Não tem duvida, minha menina, em qualquer canto me arranjo, sou fácil de contentar.

— Oh José, eu tenho medo do homem, ele vem com a gente? perguntou ao ouvido a pequenita a seu irmão.

— Tu também, sempre és uma medrosa!... E daí não sabes que lá em casa não há que levar!

— Sim, mas olha eu sempre tenho medo.

Joaquim compreendera pelo conchegar assustadiço da criança para seu irmão, e pelos modos importantes que este assumira, qual tinha sido o dialogo em voz baixa, e sorrindo-se disse à pequena:

— Não tenha medo de mim, não sou nenhum ladrão. Mas bem pelo contrário a prevenção mais assustou a criança, que não atinando com o modo porque ele ouvira a sua conversação, exclamou apressurada, mas sem olhar para o seu interlocutor:

— Eu bem sei que o senhor não é nenhum ladrão; mas... adivinha o que a gente diz!

— Então minha menina, julga-me agora feiticeiro?

— Deixe-a falar, é uma criança, ainda não fez seis anos.

— E o menino é um homem, não tem medo.

— Eu já tenho sete anos, e daí o senhor não havia de fazer mal a duas crianças, nem a meu pobre pai. Está tão doente!

— Pois deixem estar que eu verei se sei dalgum remédio, que lhe faça bem. Pelas terras, por onde andei, aprende-se muita coisa e eu conheço algumas drogas que talvez aproveitem: e daí eu quero pagar-lhes o agasalho, tenho com quê.

— O senhor dá cura ao pai? — Que bondade seria a sua!

— Não te dizia eu, Isabel.

— Ora pois então vamos lá. Digam-me seu pai é muito velho?

— Não senhor, tem trinta anos e mais alguma coisa, os desgostos é que o acabaram muito.

— Pobre homem!

— Demais a mais um tio, que anda lá por fora quer tirar-nos tudo. E daí o pai, vive tão apoquentado!

— Um tio?

— Sim, senhor, atalhou a pequena, um tio muito mau! Sempre tenho uma raiva ao meu tio!...

— Cala-te, mana, tu não sabes que o pai diz que o tio não tem a culpa?

— Então o tio anda há muito por fora! Como se chama?

— Ora o senhor não o conhece, replicou o rapaz meio desconfiado; está muito longe.

— Quem sabe, às vezes! Diga-me sempre como ele se chama.

— É o tio Joaquim.

— E está?...

— Lá para o Brasil.

— E seu pai, chama-se?

— Mas o senhor de certo não se importa com a vida da gente, respondeu o Josesito, que já não ia gostando de tanto perguntar e que receava, com aquela gíria que parece acompanhar os saloios desde o berço, que lhe pudesse porvir algum mal das suas respostas.

— Por amor de Deus diga-me como se chama seu pai.

— Assim, como assim, o senhor sempre o há de vir a saber, chama-se Raimundo.

— Então os meninos são?...

E a comoção embargou-lhe a voz.

— Somos, sim senhor, somos filhos de meu pai, eu chamo-me José, que era o nome de meu avo, e minha irmã é Isabel, porque nasceu no dia de Santa Isabel.

— Pois eu...

Mas a reflexão cortou-lhe a palavra: queria ver; queria, antes de se declarar, que aprendessem a abençoá-lo. Entretanto, agarrou-os bem para si e abraçou-os muito enternecido.

— O senhor está a chorar, disse Isabel com aquela perspicácia de mulher mesmo pequena, olhe, já vou gostando mais de si!

— Gosta, gosta, minha Isabelinha, que eu também gosto muito de ti. E tu lá, José, também és meu amigo?

— Eu engracei consigo logo ao principio. Aqui está a nossa casa; e batendo à porta: — mãe, mãe, aqui vem um senhor, que sabe dum remédio para curar o pai! Abra a porta, mãe, somos nós.

Efetivamente estavam à porta de Raimundo. A luz que vinha de dentro ao abrir, cegou por momentos a Joaquim, que só depois de se costumar à claridade é que pode dar fé do interior daquela habitação.

Era uma casa térrea, que acumulava as funções de cozinha, sala, casa de jantar e quarto de dormir dos pequenos. A um canto uma cortina de chita muito remendada resguardava-lhes a alcova; do lado direito uma porta meia aberta dando para o escuro, donde saía o som angustiado e sibilante de uma respiração irregular acusava o quarto do enfermo: junto da chaminé, onde ardiam em chama fraca e incerta alguns cavacos apanhados na estrada, via-se uma cadeira antiga de espaldar de couro e pregaria amarela. Era o único móvel de algum valor.

Uma mesa de pinho, bem tosca e bem pouco segura, umas prateleiras sobre a mesa pregadas na parede, onde se viam uns pratos quase todos rachados e alguns tachos bem velhos, três mochos em roda da mesa, uma arca carunchosa ao lado da porta de entrada, dois registros por cima da arca, uma palma e um rosário cruzando-se sobre os registros, constituíam toda a mobília, a que acrescentaremos apenas, para que a descrição seja completa, um banquinho próximo à entrada do quarto do doente e junto da arca, donde Leonor se levantara para abrir a porta aos recém-chegados.

Sobre a arca uma lamparina alumiava os santos e dava claridade para o trabalho de Leonor, que ali, ora levantando os olhos de suplica para as imagens, ora volvendo-os cuidadosa para o quarto onde jazia o esposo, remendava um capote de Raimundo, sobre o qual de vez em quando caiam as lágrimas da desgraçada.

A luz incerta do braseiro, sobre o qual e para o escurecer mais ainda estava uma panela de folha, em duas pedras, que supriam a fornalha; e o clarão mais terno ainda da lamparina, lutando com as sombras e perdendo-se na escuridão, tornavam a casa mais vasta, mais nua e mais triste.

— O pai está descansando, não façam bulha, apressou-se em dizer aos seus dois filhos a atribulada mulher. Depois voltando-se para Joaquim: — Vossa senhoria há de perdoar, os pequenos é que tiveram a culpa de o cá trazer, bem vê que não temos acomodações para hóspedes; depois a doença de meu marido...

— Olhe, mãe, segredou-lhe o José como quem queria dar a entender que não andara de leve, ele tem dinheiro para pagar à gente, e diz que traz um remédio que dá cura ao pai...

— Não venho para incomodar. Estou afeito a tudo, e qualquer coisa me satisfaz, uma pouca de palha e uma manta, uma manta só, coisa nenhuma que seja; mas licença de descansar aí sentado, e de adormecer com os braços sobre a mesa e a cabeça encostada aos braços. Eu sei o que são doenças, e talvez mesmo lhe possa servir de algum préstimo. Nas terras por onde andei nem sempre havia medico à mão, nem boticário ao pé da porta. Ia-se a gente curando conforme podia, e aprendendo à sua custa...

Enquanto Joaquim prosseguiu no seu arrazoado, examinava sua cunhada, que pela sua parte aproveitava também estes prolóquios para observar o hóspede que seus filhos lhe traziam.

Leonor era ainda uma formosa mulher, posto que o desgosto lhe tivesse gravado algumas rugas na fisionomia e embranquecido alguns cabelos. Morena, olhos pretos e rasgados, nariz reto e fino, lábios delgados e vermelhos, rosto oval, um destes tipos peninsulares, mescla formosa do sarraceno trigueiro e nervoso, como as filhas do norte pálidas e linfáticas.

Era esbelta e da altura própria de mulher. Tinha sentimento na fisionomia e elegância no corpo. Mostrava o que devera ter sido, antes que as mágoas a envelhecessem e os trabalhos a cansassem.

A tristeza espalhava lhe pelo rosto um melancólico mas diáfano véu, através do qual transparecia a vermelhidão do pejo ao lembrar-se da má hospedagem, que com dificuldade podia oferecer. E quanto mais olhava para Joaquim mais ia simpatizando com a cara rude mas franca do recém-chegado.

Este mostrava também ter muito mais idade do que tinha. Valera-lhe por dez um dos anos que passara no sertão: mas aquela beleza agreste do homem calejado no trabalho, aquela lhaneza não destituída de finura, que se adquire no trato licito, mas laborioso e muitas vezes bastante complicado, davam-lhe relevo às feições e imprimiam-lhe um cunho particular. Trajava simplesmente e como lavrador abastado.

Apesar da compostura que se notava no traje de Leonor, apesar do cuidado com que vestia e do asseio da sua roupa, a mão da miséria denunciava-se a todo o momento. Da miséria que não faz alarde de si, que se esconde, que se disfarça, que tem pejo do seu estado e receio de que a conheçam. Miséria timorata e desconfiada, a que tudo ofende, porque tudo a fere; que de todos foge, porque, sem quererem mesmo, todos a escandalizam. Uns pela ostentação, outros pelo dó, pela indiferença mesmo outros. Miséria que sorri por fora enquanto chora por dentro, que aparenta desapego enquanto treme pelas consequências, que encontra perigos sempre diante de si, e que sofre tanto mais, quanto receia que o desabafar seja tido como uma suplica e a franqueza como um rodeio para pedir. Miséria que se roça por nós sem que a conheçamos, e que por um nobre orgulho denomina doença a fome, desleixo o mau vestuário, extravagância a necessidade.

Tal era entretanto a que se lia no modesto e envergonhado trajar de Leonor, e que Joaquim, com a perspicácia que dá também a infelicidade, conheceu à primeira vista.

— Se não fosse a moléstia do meu Raimundo, prosseguiu ela, melhor agasalho lhe poderíamos oferecer; mas assim... Parece que Deus se esqueceu da gente a alguns anos a esta parte! E tudo por causa de um mano de meu marido... que ele não quer ouvir tal, e pelo contrário sempre defende o irmão, que no seu dizer não tem culpa do que faz um tal João Simões... mas o senhor não se interessa com isto. Vou ver se lhe posso oferecer alguma cousa de cear, e perdoará a limitação.

E, enquanto falando e dando voltas, Leonor ia preparando a ceia, e espreitando sempre o quarto de seu esposo, para se certificar se este continuava a dormir; Joaquim ficara à porta, de pé, chapéu na mão e como pasmado a comparar aquela pobreza, com as informações que recebera.

Leonor reparou na posição do seu hóspede, e indicando-lhe a cadeira de espaldar, próxima da chaminé:

— Vem molhado, e está aí em pé, sem se chegar ao menos para o lume, sente-se: ainda assim esta cadeira é a predileta de meu marido, era onde se sentava quase sempre meu sogro.

Joaquim já tinha conhecido a poltrona, mas quando Leonor lha indicou pedindo-lhe, que se sentasse, não pode dominar uma visível comoção. Teve duvida, quase medo de se sentar. Parecia-lhe ver seu pai apontando-lhe para aquela casa, para aquela miséria e expulsando-o. Afigurou-se-lhe de repente o quadro, que tantas vezes examinara. O rosto entre severo e indulgente de José dos Santos inquieto por amor do filho, que se demorava, e preparando um sermão, que levava a cabo raras vezes, porque antes de meio lhe desarmava as iras o verdadeiro afeto paternal.

Leonor, que não podia acertar com a causa de semelhante hesitação, atribuiu-a a causa bem diferente.

— Não faça cerimônia, se meu marido estivesse aqui, ele mesmo lha cederia, que sempre lhe ouvi dizer, que era dever sagrado fazer bom acolhimento aos viajantes. E perdoe vossa senhoria que eu ande no meu trafego.

Neste comenos, remexera na arca, e bem vermelha de vergonha tirara um pano muito lavado, é verdade, mas cheio de remendos, e que estendera sobre a mesa; desencantara num armário velho, que pelo estado em que se achava e pelo pouco vulto que fazia nos esqueceu mencionar, duas broas de milho e alguns queijos brancos salgados; escolhera da prateleira os pratos menos quebrados, a que juntou os talheres, que apesar de serem de chumbo, pareciam de prata pelo brilho, tão limpos estavam: e indo buscar à chaminé a panela onde fervia um caldo de couves e toucinho, convidou o seu hóspede a tomar parte daquela ceia.

Não era coisa suficiente, bem o sabia, mas a sua pessoa havia de desculpar, pois que não esperava ninguém de fora nem estava no auge de o receber como desejava, pois a doença do seu homem a tinha quebrado de pernas e braços.

— E o que diz o facultativo da doença do seu marido?

— Diz, que é uma dor no interior, que lhe costuma a dar e que é de muito perigo se continua, que ele já é atreito a padecer do fígado, que segundo parece é moléstia de família, e que lhe pode subir o mal ao bofe se não puxar abaixo com força. E será assim?

— Não o creio. Deus há de afastar o agouro do tal barbeiro.

— Ele também diz, que é bom dormir, e o meu Raimundo há umas quatro horas que está descansando tão sossegado, que parece mesmo uma criança.

— Isso sim; o dormir é sempre um excelente remédio, restaura as forças e faz cobrar saúde. Daí seu marido deve estar amofinado por lhe correr o negócio mal. Não me falou há pouco de um irmão?...

— Do Joaquim, falei, sim senhor.

— Então esse Joaquim?

— É, segundo a minha opinião, a causa de tudo isto. Que o Raimundo diz que não, e jura que não era capaz de fazer uma ação destas, se soubesse do estado a que chegamos...

— Que ação, atalhou precipitadamente Joaquim?

— Uma penhora, à gente, nisto que o senhor aí vê. Na verdade vale bem a pena de incomodar a justiça, há de ficar bem rico, não tem duvida nenhuma! Mas ainda assim, Deus sabe a falta que nos faz tudo. Ficamos a pedir esmola. Até agora ainda tínhamos o nosso buraquinho para uma aflição; mas de hoje em diante...

— Que diz?...

— A verdade. Um tal João Simões, é que tem andado aceso neste negócio todo, porque tomou asca ao meu Raimundo desde que ele um dia, já de propósito, por saber que era o Simões que lhe desinquietava o irmão, lhe voltou costas no arraial de Nossa Senhora do Rosário. Depois, apresentou-se feito procurador do Joaquim, deu testemunhas... se o senhor soubesse, que testemunhas!... as caras mais atraiçoadas do lugar, em como o pai de meu marido tinha deixado muitos bens, que o meu Raimundo estragara tudo, e depois tem andado em demandas para puxar pela legitima do amigo. Legitima!... Só se foi a benção do pai à hora da morte, porque enquanto ao mais! Nem chegou o dinheiro para o enterro, que foi preciso ir pedi-lo fora.

Nestas alturas do dialogo um gemido do doente chamou a atenção de Leonor que correu à alcova de seu marido e por lá se deteve. Cansada de lidar, apenas se certificou de que o marido continuava dormindo e que o gemido fora apenas sobressalto de algum sonho angustiado, sentou-se aos pés da cama, e passando as contas de um rosário, cedeu por fim ao cansaço e adormeceu também. Os pequenos logo depois da ceia tinham ido aninhar-se para o seu cantinho, e havia muito que ressonavam.

Joaquim ficara entregue às suas reflexões.

Correram as horas, esmoreceu de todo o lume no brasido, apagou-se a lamparina, ficou a casa em trevas devassadas apenas pela luz difusa da atmosfera, que passava pelas fendas do teto: e ele cogitava ainda no passado e no presente, nos seus sonhos, nas suas aspirações, nos seus erros e nas suas culpas.

A solidão daquela casa povoava-se-lhe de vultos, todos eles conhecidos, todos eloquentes: alguns severos julgadores, outros saudosos e indulgentes amigos. Uma a uma iam-lhe correndo as cenas da sua infância, via, como em lanterna mágica, recortarem-se nas trevas do aposento as figuras de quantos havia conhecido, de todos com que lidara, e superior a todas como absorvendo-as e substituindo as, a figura veneranda de seu pai, ora exprobando-lhe terrível o quanto perseguira seu irmão; ora sorrindo-lhe amorosamente na hora derradeira e estendendo-lhe sobre a cabeça as tremulas e enrugadas mãos para o abençoar.

Ao assomar da alvorada pendendo-lhe as pálpebras adormecia também; não com o sono sossegado e reparador, que se segue às fadigas do corpo; mas com aquela modorra agitada e febril, que é o decair das grandes lutas morais. Cabecear cortado de sobressaltos, dormir carregado de pesadelos, descanso, que nos deixa mais cansado ainda.

Entre dormindo e acordando começou a ouvir o seguinte dialogo:

— Como te sentes, Raimundo?...

— Melhor, Leonor, muito melhor. Fez-me bem o sono desta noite. Já vieram?

— Quem?

— Os oficiais de justiça, os que hão de fazer a penhora.

— Não cuides nisso, que te amofinas, talvez não venham; talvez fosse tudo palavreado do Simões para assustar a gente. É impossível que não olhem ao teu estado.

— Qual olham, nem meio olham! Bem se conhece, que não entendes destas coisas. Pois tu não sabes que a justiça é cega? Taparam-lhe os olhos para que não visse a desgraça dos pobres.

— Mas teu irmão!

— Não sabe de nada, Leonor, diz-me o coração que não sabe de nada. O Joaquim teve sempre a cabeça levantada; mas no fundo não era mau rapaz. Se ele soubesse o que o Simões tem feito já lhe tinha tirado a procuração.

— Tu também sempre o defendes, és a bondade em pessoa, meu pobre Raimundo, não há para ti ninguém mau neste mundo.

— Olha, o Joaquim se não fossem as más companhias não teria feito o que fez: não gostava de se chegar para o trabalho, era o seu senão; mas não era capaz de fazer mal a ninguém, nem rapaz de mau interior.

— Foi ele que matou teu pai, e que no fim de contas nos tem levado a este estado com as suas demandas.

— Não digas isso, Leonor, que me afliges. Meu pai morreu, porque lhe tinha chegado a sua hora, custou-lhe muito a partida de Joaquim; mas abençoou-o à hora da morte. Lembras-te, não é assim? Se ele perdoou, porque não havemos nós de perdoar...

— Obrigado, irmão!

Era afogada em lágrimas a voz de Joaquim, que estava entre portas do quarto. Tinha acordado e escutado cada vez com maior atenção o dialogo, que tão de perto lhe dizia respeito. Julgou ao principio que seria sonho, conheceu depois que era realidade, e tremendo todo ergueu-se e, para melhor ouvir, aproximou-se do lugar donde partiam as vozes.

A gratidão, e talvez o remorso fizeram-lhe soltar aquelas duas palavras, que cortaram o dialogo.

Raimundo conheceu a voz, sem que pudesse distinguir-lhe o rosto, porque o irmão estava de costas para a claridade; pareceu-lhe que invocara um fantasma, estendeu para ele os braços, exclamando:

— Joaquim!

E caiu desmaiado com o abalo.

Joaquim precipitou-se chorando para junto da cabeceira do irmão, abraçou-o vezes infinitas e teve o invisível jubilo de o ver tornar a si em seus braços.

— És tu, meu irmão!... Bem me dizia uma voz cá dentro, que havias de voltar.

— Perdoas-me, Raimundo?

— Perdoei-te sempre. Tu é que tens que me perdoar.

— O quê?

— Não te haver já transmitido a benção do pai. Ajoelha, Joaquim.

— Em nome do nosso bom pai que está nos céus, eu te abençoo, meu irmão: sê bom como ele foi, e mais feliz do que eu tenho sido.

— Sê-lo-emos todos, Raimundo, porque se me deixas viver contigo, nunca mais saio da tua companhia.

Escusado é dizer agora como terminou esta história. João Simões não pôs mais pés na terra; Joaquim tinha-lhe jurado pelo corpo, e ele bem sabia que não era homem de faltar à sua palavra. Declarara que seria a sua última extravagância; mas dessa não desistia nem por Cristo. O caso era encontrar o seu procurador.

A doença de Raimundo desapareceu breve, e a alegria voltou àquela casa, para não a desamparar mais.

Muitas noites, quando se conchegava para o pé do lume, depois de ter contado aos sobrinhitos que o não deixavam por contos, uma história do Brasil, Joaquim voltava-se para o irmão e para Leonor e dizia-lhes sorrindo:

— Sempre hão de confessar que estes endiabrados pequenos são uns grandes doutores! Como eles nos souberam ganhar a demanda!...


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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2023. 

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