O cajado do pastor
Certo homem pastoreava suas ovelhas no alto de uma colina, quando notou um cortejo real que passava pela estrada próxima. De repente viu o rei descer de sua carruagem e ir caminhando até ao pé do montículo onde ele estava. Aproximando-se, o soberano fez sinal para que ele descesse, ao que o pastor, com receio de que seu rebanho se dispersasse, gritou lá de cima:
- Perdão, majestade! mas receio que minhas ovelhas fiquem aqui sozinhas e se percam.
O rei admirou-se muito da atitude ousada do homem, e resolveu ele mesmo subir o pequeno monte. Ali chegando disse:
- Então preferiste ficar com teu rebanho a atenderes ao chamado de teu rei? Muito bem! Não serás punido por isso. Ao contrário, tua lealdade e coragem me impressionaram deveras. É de alguém com tais qualidades que necessito para meu conselheiro. Que me dizes?
Por um momento o homem pensou em recusar o convite real, porém, vendo ali uma oportunidade para ajudar o seu sofrido povo, aceitou a proposta com uma ressalva.
- Grande rei, aceito com satisfação vosso convite. Peço, porém, uma semana a fim de colocar em ordem as coisas de minha família.
Decorrido esse tempo, o pastor compareceu de cajado à mão ao palácio real, sendo ali recebido com muitas pompas e honrarias.
À medida que passavam os anos, ele crescia sobremaneira no conceito do rei, que o elevou às mais altas dignidades, sendo considerado seu melhor e mais leal amigo. Isso, contudo, trouxe-lhe grandes dissabores, pois muitos nobres, movidos pela inveja, tramaram astutamente contra ele. Em vista disso, passaram a observar todos os seus movimentos, a fim de encontrar motivos para denunciá-lo ao soberano.
Era hábito do pastor, sempre depois da meia-noite, adentrar num aposento secreto do palácio. Seus inimigos viram ali a ocasião oportuna para dar cabo aos seus malignos planos. Reunidos com o rei, acusaram o conselheiro de roubo ao erário real, acrescentando que tudo estava escondido num aposento secreto, do qual só ele tinha acesso.
Embora o rei duvidasse da denúncia, achou por bem esclarecer o fato. À meia-noite, viu o pastor dirigir-se ao seu aposento desconhecido. Quando este abriu a porta de ferro, o rei apresentou-se de súbito, dizendo que queria conhecer seu quarto. Entrando, o rei estacou surpreso. Sobre uma velha mesa de madeira viu uma simples bengala de pastor.
- Que significa isso? - perguntou o soberano.
- Majestade! Esta é a mesma bengala de quando apascentava meu rebanho. Vejo-a aqui todos os dias, para nunca esquecer minha origem humilde. É só isso!
O rei admirado,
abraçou-o afetuosamente. E, como não tinha herdeiros, fê-lo o sucessor do
trono. Quanto aos seus caluniadores, a esses expulsou-os todos do seu reino.
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Iba Mendes (Fevereiro, 2023)
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