2/12/2023

Emiliano Parvo (Conto popular russo), por Alfredo Apell

 EMILIANO PARVO

Em uma aldeia vivia um campônio que tinha três filhos; dois eram inteligentes, mas o terceiro, que se chamava Emiliano, era parvo.

Quando o campônio já era velho, chamou os filhos e disse-lhes:

— Queridos filhos! sinto que breve vou morrer; deixo-vos a casa e o gado, que haveis de repartir em partes iguais; também vos deixo cem rublos a cada um.

Daí a pouco tempo o pai deles morreu, e os filhos, entretanto, iam vivendo felizes.

Depois os irmãos do Emiliano lembraram-se de ir para a cidade negociar com os trezentos rublos que o pai lhes tinha deixado, e disseram para o Parvo:

— Olha lá, Parvo! nós vamos para a cidade e levamos também os teus cem rublos, e quando tivermos feito negócio, hás de ter a metade dos lucros, e vamos comprar para ti um casaco encarnado, um boné encarnado e botas encarnadas. Mas tu ficas em casa, e se as nossas mulheres e tuas cunhadas (eles eram casados) te mandarem fazer qualquer coisa, hás de fazê-la.

O Parvo, desejando obter as coisas prometidas, disse aos irmãos que faria tudo que lhe mandassem. Em seguida os irmãos foram para cidade, e o Parvo ficou vivendo em casa com as cunhadas.

Um belo dia de inverno, quando fazia um frio de rachar pedras, as cunhadas disseram ao Emiliano que fosse buscar água. Mas o Parvo, deitado em cima do forno, disse:

— Vão vocês!

As cunhadas começaram a gritar:

 — O quê, Parvo?! Então nós é que havemos de ir? Não vês o frio que faz, que só um homem pode ir?

Mas ele respondeu;:

— Tenho preguiça!

As cunhadas tornaram a gritar:

— Que quer dizer que tens preguiça? Hás de querer comer e, se não houver água, não podemos cozer nada. Além disso, disseram:

— Está bem, quando os nossos maridos voltarem com o casaco encarnado e com o resto, havemos de lhes dizer que te não deem nada.

O Parvo, ouvindo isto e desejando obter o casaco encarnado e o boné, teve de ir; desceu do forno e começou a vestir-se.

E quando estava vestido, pegou nos baldes e no machado e foi ao rio, pois a aldeia deles estava situada mesmo à beira do rio. Quando chegou ao rio, fez um grande buraco no gelo. Depois encheu os baldes de água e pô-los em cima do gelo, e deixou-se estar ao pé do buraco, olhando para a água.

O Parvo viu nadar um pequeno lúcio no buraco; ora o Emiliano, embora fosse parvo, queria não obstante apanhar o lúcio, e por isso foi-se aproximando a pouco e pouco, e quando estava bem perto dele, agarrou-o com a mão, tirou-o da água, meteu-o no seio e queria ir para casa. Mas o lúcio, disse-lhe:

— Oh Parvo, para quê é que me apanhaste.

— Para quê? disse ele, levo-te para casa e digo às minhas cunhadas que te cozam.

— Não, Parvo, não me leves para casa, deita-me ao rio, que te faço rico.

Mas o Parvo não se fiava nele e queria ir para casa.

O lúcio, vendo que o Parvo o não largava, disse:

— Escuta, Parvo, deita-me ao rio; hei de te fazer tudo que desejares.

O Parvo, ao ouvir isto, ficou muito contente, porque era muitíssimo preguiçoso, e pensava consigo:

— Se o lúcio fizer que eu tenha tudo que desejar, não preciso de trabalhar!

Depois disse para o lúcio:

— Vou largar-te, mas hás de fazer o que me prometeste.

O lúcio respondeu:

— Primeiro deita-me ao rio, depois cumprirei a minha promessa.

Porém, o Parvo disse-lhe que primeiro havia, de cumprir a promessa e que depois o largaria. Como o lúcio via que ele não queria deitá-lo ao rio, disse:

— Se queres que eu te diga como se há de fazer o que desejares, tens que dizer já o que queres.

 O Parvo disse-lhe:

— Quero que os meus baldes com água vão por si para a montanha (pois aquela aldeia encontrava-se em cima de uma montanha) e que a água se não entorne.

O lúcio disse-lhe logo:

— Não tem dúvida; não se há de entornar. Mas lembra-te bem das palavras que te vou ensinar; as palavras são estas: "Manda o lúcio e peço eu que os baldes vão por si para a montanha!

Depois do lúcio, disse o Parvo:

— Manda o lúcio e peço eu que os baldes vão por si para a montanha!

E logo os baldes foram por si para a montanha. Ao ver isto, o Emiliano ficou muito admirado, e depois disse para o lúcio:

O lúcio respondeu-lhe que tudo havia de ser assim, mas que o Parvo não devia esquecer as palavras que lhe tinha ensinado. Depois deitou o lúcio ao rio, e foi atrás dos baldes. Quando os vizinhos viram aquilo, ficaram admirados e disseram uns para os outros: 

— Olhe o que o Parvo anda a fazer! Os baldes com água andam por si, e ele vai andando atrás deles. 

Mas o Emiliano não lhes disse nada e chegou a casa. 

Os baldes entraram na cabana e puseram-se em cima dum banco, e o Parvo deitou-se em cima do forno. 

Passado tempo, as cunhadas disseram-lhe: 

— Emiliano! então estás deitado? era melhor que fosses à lenha. 

Mas o Parvo respondeu: 

— Vão vocês! 

— O quê?! gritaram as cunhadas; olha, agora é inverno, e se não fores à lenha, terás frio. 

— Tenho preguiça! respondeu o Parvo.

— Que quer dizer que tens preguiça? disseram-lhe as cunhadas; olha que morres com frio. 

Além disso disseram: 

— Se não fores à lenha, havemos de dizer aos nossos maridos que te não deem o casaco encarnado, nem o boné encarnado, nem as botas encarnadas. 

O Parvo, desejando obter essas coisas, não teve outro remédio senão ir à lenha; mas como era muitíssimo preguiçoso e não tinha vontade de se tirar do forno, disse em voz, baixa: 

— Manda o lúcio e peço eu que o machada vá rachar lenha, e que esta venha para a cabana e se coloque por si no forno! 

O machado saltou logo para o pátio, e começou a rachar lenha, e  a lenha foi por si para a cabana, e colocou-se no forno. 

As cunhadas, ao verem isto, ficaram muita admiradas. E o mesmo acontecia todos os dias; quando mandavam ao Parvo rachar lenha, era, o machado que a rachava. 

Passado tempo, as cunhadas disseram: 

— O Emiliano! agora não temos lenha; vai à floresta buscar lenha. 

O Parvo disse-lhes: 

— Vão vocês! 

— O quê? responderam as cunhadas. A floresta fica longe daqui, e agora é inverno, e temos frio para ir à lenha. 

Mas o Parvo disse-lhes: 

— Tenho preguiça!

— Que quer dizer que tens preguiça? disseram as cunhadas; olha que terás frio; e se não fores, havemos de dizer aos nossos maridos, quando voltarem, que te não deem nada: nem o casaco encarnado, nem o boné encarnado, nem as botas encarnadas. 

O Parvo, desejando obter tudo isto, não teve outro remédio senão ir à lenha, e levantando-se, desceu do forno e começou a vestir-se depressa. 

Quando estava vestido, foi ao pátio, tirou o trenó do alpendre, pegou em uma corda e no machado, sentou-se no trenó e disse às cunhadas que abrissem o portão. Quando as cunhadas viram que ele ia no trenó sem cavalo, disseram-lhe: 

— O que é isso, Emiliano, então sentaste-te no trenó, e não engataste o cavalo? 

Mas ele disse que não precisava de cavalo, e só queria que lhe abrissem o portão. 

As cunhadas abriram o portão, e o Parvo, sentado no trenó, disse:

— Manda o lúcio e peço eu que o trenó vá à floresta! 

Logo o trenó saiu do pátio. Quando os campônios, que viviam naquela aldeia, viram isto, ficaram muito admirados, pois nem que o trenó fosse puxado por uma parelha, não podia andar mais depressa. 

E como o Parvo, para ir à floresta, tinha que atravessar a cidade, atravessou-a; mas como não sabia que era preciso gritar, para não esmagar o povo, ele ia sem gritar, para o povo se acautelar, e assim esmagou muita gente, e embora corressem atrás dele, não puderam apanhá-lo. 

O Emiliano saiu da cidade, e chegado à floresta, parou, apeou-se e disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que o machado rache lenha, e que as achas se atem por si e se coloquem no trenó. 

Mal o Parvo acabou de dizer estas palavras, logo o machado começou a rachar lenha, e as achas ataram-se por si com uma corda e colocaram-se no trenó. Depois, quando o Parvo já tinha a lenha, mandou ao machado cortar um varapau. 

E quando tudo estava pronto, sentou-se no trenó e disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que o trenó vá por si para casa.

Logo o trenó partiu muito depressa, e quando o Emiliano chegou à cidade onde já tinha esmagado muita gente, o povo estava à espera dele, para o apanhar, e quando entrou na cidade, agarraram-no e começaram a tirá-lo do trenó, batendo-lhe. 

O Parvo, ao ver que o agarravam e lhe batiam, disse em voz baixa: 

— Manda o lúcio e peço eu que o varapau lhes parta os braços e as pernas! 

Logo o varapau saltou e começou a bater em todos. E enquanto o povo fugia, o Parvo foi para casa; e o varapau depois de ter desancado a todos, desatou a correr atrás dele. 

E assim que o Emiliano chegou a casa, deitou-se em cima do forno. 

Depois que o Parvo saiu da cidade, não se falava noutra coisa, não tanto por ter esmagado muita gente, quanto por o trenó andar por si só. 

Finalmente, os ditos do povo chegaram aos ouvidos do próprio rei. Mal o rei ouviu isso, manifestou grande desejo de o ver, e por isso mandou um oficial com alguns soldados à procura do Emiliano. O oficial, enviado pelo rei, deixou logo a cidade e foi ter ao caminho por onde o Parvo ia à floresta. 

Quando o oficial chegou à aldeia onde vivia o Emiliano, mandou chamar o regedor e disse-lhe: 

— O rei manda-me buscar o vosso Parvo para ir comigo ao palácio. 

O regedor ensinou-lhe logo a casa onde morava o Emiliano, e o oficial entrou na cabana e perguntou: 

— Onde está o Parvo? 

E este, deitado em cima do forno, respondeu:

— Para que é?

— Queres saber para que é? veste-te depressa e vamos ao rei. 

Mas o Emiliano disse:

— Que vou eu lá fazer? 

O oficial zangou-se com a resposta pouco respeitosa e deu-lhe uma bofetada. Mas quando o Parvo viu que lhe batiam, disse em voz baixa: 

— Manda o lúcio e peço eu que o varapau lhes parta os braços e as pernas. 

O varapau saltou-lhes logo em cima e começou a bater neles, e chegou-lhes a todos, tanto ao oficial como aos soldados. 

O oficial foi obrigado a voltar, e quando chegou à cidade, contou ao rei que o Parvo tinha batido em todos. 

O rei ficou muito admirado e não acreditou que o Parvo pudesse bater em todos; contudo escolheu um homem inteligente, e mandou-lhe buscar o Parvo, sem falta, nem que fosse com uma mentira. 

O enviado do rei partiu, e quando chegou à aldeia onde vivia o Emiliano, mandou chamar o regedor e disse-lhe: 

— O rei manda-me buscar o vosso Parvo; vá chamar as pessoas que vivem com ele. 

O regedor foi logo chamar as cunhadas do Emiliano. O enviado do rei perguntou-lhes: 

— De que gosta o Parvo? 

As cunhadas responderam: 

— Meu senhor, o Parvo, para fazer qualquer coisa, gosta que lhe peçam muito; à primeira vez e à segunda, recusa; mas à terceira vez, já não recusa e faz tudo; ele não gosta que o tratem grosseiramente. 

O enviado do rei mandou-as embora e disse-lhes que não contassem ao Emiliano que tinham falado com ele. Depois comprou passas, ameixas secas e figos, e foi ter com o Parvo, e quando entrou na cabana, chegou-se ao forno e disse: 

— Então, Emiliano, estás deitado em cima do forno? e deu-lhe passas, ameixas secas e pedindo-lhe que fosse com ele ao rei. 

Mas o parvo disse: 

— Estou aqui tão quentinho! pois ele nada apreciava tanto como o calor. E o enviado começou a pedir-lhe: 

— Emiliano, faz favor de vir comigo; hás de te dar bem lá!

O Parvo disse: 

— Tenho preguiça! 

Mas o enviado continuou a pedir-lhe:

— Faz favor de vir comigo, o rei vai mandar fazer-te um casaco encarnado, um boné encarnado e botas encarnadas. 

Quando o Parvo ouviu que lhe faziam um casaco encarnado, se fosse, disse: 

— Então vai tu primeiro, que eu vou atrás de ti. 

O enviado não quis importuná-lo mais, afastou-se dele e perguntou em voz baixa às cunhadas se o Parvo o não enganava. Mas elas afiançaram-lhe que não o enganava. 

O enviado voltou ao palácio, e o Parvo deixou-se estar ainda um pouco em cima do forno e disse: 

— Tenho pouca vontade de ir ao rei, mas tem de ser!

Depois disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que o forno vá direito à cidade.

No mesmo instante, um grande estrondo houve na cabana e o forno despegou-se e quando saiu do pátio, andava tão depressa que era impossível apanhá-lo; e o Parvo apanhou ainda no caminho o enviado, e depois chegaram ambos ao palácio. 

Quando o rei viu que o Parvo tinha chegado, foi vê-lo em companhia de todos os seus ministros, e vendo que o Emiliano tinha chegado em cima do forno, não disse nada; depois o rei perguntou-lhe: 

— Por que é que esmagaste tanta gente, quando ias à lenha?

Mas o Emiliano disse: 

— Que culpa tenho eu? por que é que não se acautelaram?

Nisto chegou à janela a filha do rei e olhava para o Parvo, e o Emiliano olhou por acaso para a janela onde ela estava, e vendo que era muito bonita, disse em voz baixa: 

— Manda o lúcio e peço eu que aquela linda rapariga se apaixone por mim! 

Mal proferiu estas palavras, logo a filha do rei olhou para ele, e ficou apaixonada por ele. 

E depois o Parvo disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que o forno vá para casa. 

O forno foi logo para casa e colocou-se no seu lugar.

Depois disso o Emiliano viveu feliz por algum tempo; mas em casa do rei passava-se outra coisa, pois, por causa das palavras do Parvo, a princesa apaixonou-se por ele e pedia ao pai que a casasse com o Parvo. Ora o rei ficou por isso muito zangado com o Parvo, e não sabia como havia de o apanhar. Então os ministros disseram-lhe que mandasse aquele oficial que já tinha ido buscar o Emiliano sem ter podido trazê-lo. Por castigo, o rei mandou dizer ao oficial que se apresentasse. Quando o oficial se apresentou, o rei disse-lhe:

— Escute amigo, mandei-o buscar o Parvo, e você não o trouxe; para o castigar, mando-o mais uma vez, e há de trazer-mo sem falta; se o trouxer, será recompensado, e se o não trouxer, será castigado. 

O oficial ouviu as palavras do rei e foi logo buscar o Parvo, e quando chegou à aldeia, mandou outra vez chamar o regedor e disse-lhe:

 — Aqui tem dinheiro, compre tudo que for preciso amanhã para jantar, e convide o Emiliano, e quando ele estiver a jantar em sua casa, embriague-o, para ele adormecer. 

O regedor sabia que o oficial era mandado pelo rei, por isso teve que obedecer; comprou tudo e convidou o Parvo.

Como o Emiliano prometeu ir, o oficial esperava-o com grande alegria. 

No outro dia, o Parvo foi a casa do regedor; este embriagou-o de sorte que o Emiliano adormeceu. Quando o oficial viu que estava a dormir, algemou-o, mandou vir um carro e meteu-o dentro; depois o oficial meteu-se também no carro e levou o Parvo para a cidade. E assim que chegou à cidade, levou-o diretamente ao palácio. Os ministros disseram ao rei que o oficial tinha chegado. 

E assim que o rei ouviu isto, ordenou que lhe trouxessem um tonel com arcos de ferro. Trataram imediatamente de fazer o tonel e trouxeram-no ao rei. Quando o rei tinha tudo pronto, mandou meter no tonel a filha e o Parvo, e alcatroar o tonel; e depois o rei mandou deitar o tonel ao mar, na sua presença. Deitaram-no ao mar, conforme a ordem do rei; e este voltou para a cidade. 

O tonel, lançado ao mar, flutuou nas ondas durante algumas horas; mas o Parvo dormiu todo este tempo e quando viu ao acordar que estava escuro, perguntou a si próprio: 

— Onde estou eu? pois julgava que estava só.

A princesa disse-lhe: 

— Estás num tonel, Emiliano, e eu também cá estou contigo. 

— Mas quem és tu? perguntou o Parvo. 

— Sou a filha do rei, respondeu ela, e contou-lhe a razão porque os tinham metido no tonel, depois pediu-lhe que fizesse com que se livrassem do tonel. Mas ele disse: 

— Aqui também estou quentinho! 

— Faz-me este favor, disse a princesa; tem dó das minhas lágrimas, livra-nos deste tonel. 

— Não tinha mais que fazer, disse o Emiliano; tenho preguiça! 

A princesa tornou a pedir-lhe: 

— Faz-me este favor, Emiliano; livra-me deste tonel, e não me deixes morrer! 

O Parvo, condoído das lágrimas e dos rogos dela, disse-lhe: 

— Está bem, faço-to a ti. 

Depois ele disse em voz baixa: 

— Manda o lúcio e peço eu que o mar deite este tonel em seco, na praia, perto do nosso reino; e que o tonel se parta por si quando estiver na praia! 

Mal o Parvo proferiu estas palavras, logo o mar começou a agitar-se e deitou o tonel em seco, na praia, e o tonel partiu-se por si. 

O Emiliano levantou-se e foi com a princesa por aquele sítio onde se encontravam, e viu que estavam numa ilha muito bonita, onde havia muitíssimas e variadas árvores de fruta. Quando a princesa viu que estavam numa ilha tão bonita, ficou muito contente; e depois disse: 

— Bem, Emiliano, onde vamos nós viver? pois aqui não há nem uma cabana. 

Mas o Parvo respondeu: 

— Tu já pedes demais!

 — Faz favor, Emiliano, manda colocar qualquer casinha, disse a princesa, para nos podermos abrigar no tempo da chuva; pois a princesa sabia que ele podia fazer tudo que quisesse. 

Mas o Parvo respondeu:

— Tenho preguiça! 

Ela tornou a pedir-lhe, e o Emiliano, comovido, não teve outro remédio senão fazer-lhe a vontade. Depois afastou-se dela e disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que, no meio desta ilha, apareça um palácio melhor que o do rei, e que uma ponte de cristal ligue o meu palácio com o do rei, e que no meu haja gente de todas as condições. 

Mal proferiu estas palavras, apareceu logo um palácio enorme e uma ponte de cristal. O Parvo e a princesa entraram no palácio e encontraram os aposentos ricamente mobiliados e muita gente, que esperava as ordens do Parvo. 

Notando o Emiliano que todos eram pessoas de valor, e só ele era feio e estúpido, também quis tornar-se melhor, e por isso disse: 

— Manda o lúcio e peço eu que me torne muitíssimo esperto e tão perfeito que não haja igual! 

Assim que proferiu estas palavras, ficou logo tão bonito e esperto que todos se admiraram. 

Depois o Emiliano mandou um criado ao rei, a convidá-lo mais os seus ministros. 

O enviado do Emiliano foi ao rei pela ponte de cristal, que o Parvo tinha arranjado, e quando chegou ao palácio, os ministros apresentaram-no ao rei; e o enviado do Emiliano disse: 

— Meu senhor! o meu amo manda-me convidar-vos respeitosamente a jantar com ele. 

O rei perguntou-lhe:

— Quem é o seu amo?

Mas o enviado respondeu:

— Não posso dizer-vos quem seja (pois o Parvo tinha-lhe proibido dizer quem era o amo dele): não se sabe nada a respeito do meu amo; mas quando jantardes com ele, então vos dirá quem é. 

Tendo a curiosidade de saber quem o convidava, o rei disse ao enviado que não faltaria. 

Quando o enviado partiu, o rei foi logo atrás dele com todos os ministros. 

A volta, o enviado disse que o rei não faltaria e assim que acabou de falar, chegou logo o rei mais os príncipes, pela ponte de cristal. 

E quando o rei entrou no palácio, o Emiliano foi-lhe ao encontro, abraçou-o, beijou-o e introduziu-o no seu magnífico palácio, e sentou-se a uma rica mesa, cheia de boas comidas e bebidas. 

O rei e os ministros beberam, comeram e divertiram-se, e quando acabou o jantar, o Parvo disse para o rei: 

— Excelentíssimo senhor! conheceis-me e sabeis quem sou? 

Mas como o Emiliano trazia um rico fato, e era muito bonito, não era fácil conhecê-lo; por isso o rei disse que o não conhecia. 

— Mas o Parvo disse:

— Excelentíssimo senhor! Não vos lembrais do Parvo que foi ao vosso palácio em cima do forno, e vós mandastes metê-lo num tonel alcatroado em companhia de vossa filha, e deitá-los ao mar. Pois ficai sabendo que sou eu mesmo aquele Emiliano! 

O rei, ao vê-lo, ficou muito assustado e não sabia o que havia de fazer; mas o Parvo foi no entretanto buscar a filha do monarca e apresentou-a ao pai. Quando o rei viu sua filha, ficou muito contente, e disse para o Parvo: 

— Sinto-me muito culpado perante ti, e por isso dou-ta em casamento. 

Quando o Parvo ouviu isto, agradeceu muito ao rei; e visto que o Emiliano tinha tudo pronto para o casamento, este festejou-se com grande pompa naquele próprio dia. E no outro dia, o Parvo deu um magnífico banquete aos ministros, e para o povo mandou pôr balseiros com várias bebidas. E quando a festa terminou, o rei queria dar-lhe o seu reino; mas ele não quis aceitar. Depois o rei voltou para o seu remo, e o Parvo ficou vivendo feliz no seu palácio.

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