— Todos vão aos
touros, só nós ficamos para aqui, dizia a mulher.
— Um divertimento
tão chic! acrescentava a menina. O pai é um bárbaro,
um unhas de fome!
— Ora adeus!
resmungava o Eusébio. Se queres touros trata de arranjar marido. O negócio vai
mal, não dá para tudo.
Mas tanto
apertaram com o pobre homem e tais razões empregaram que ele resolveu trazê-las
um domingo, e cumpriu a sua promessa, saltando com a família na estação de
Campanhã. Chegados ao hotel, o Eusébio, que trazia apetite, preparava-se para
ir para a mesa, quando nisto lhe disse a filha com modo enfadado:
— Então o pai vai
almoçar! Eu ouvi dizer que há tanta influência… O melhor é ir já comprar o
camarote.
A mulher foi da
mesma opinião.
Em vista disso,
Eusébio, lamentando o não poder almoçar, cheio de poeira e de calor, atravessou
a ponte e comprou já com prêmio a um contratador o almejado camarote. Voltou ao
hotel caindo de fraqueza, mas o criado disse-lhe bruscamente, arrumando os
copos:
— Já passou a hora
dos almoços, agora é esperar pelo jantar.
A mulher e a filha
acharam razão ao criado.
— Está bem,
esperarei, respondeu ele, resignando-se e engolindo em seco.
Davam quatro horas
quando o negociante lembrou que seria tempo de ir fazer bem à barriga, obtendo
em resposta que a mesa redonda era às cinco e meia.
— Então é melhor
irmos indo, papá, propôs a menina calçando as luvas com dificuldade.
— Mas eu morro de
fome!
— És feito de
manteiga, homem! lhe disse a esposa prevenindo-se contra todas as necessidades
para o caminho. Vamos. Eu quero apanhar tudo de chapa sem perder pitada.
Eusébio, com uma
cara muito constrangida, lá foi com a mulher e a filha a caminho da Serra.
Quando entraram no
camarote tinham já passado as cortesias.
— Perdemos o mais
bonito! exclamou a mãe. Eu dou o cavaco pela entrada do cavaleiro…
Mal apareceu o
primeiro boi na praça a menina, muito pálida, fugiu assustada para o fundo do
camarote, gritando:
— Ai! Tenho medo
do bicho! Venha para aqui, mamã!
A mãe seguiu-lhe o
exemplo.
— Ó filha, vem
ver. Meteram-lhe agora um par de ferros! disse Eusébio, vexado pelo chinfrim
que faziam as duas.
— Pobre bichinho!
Não somos nada neste mundo! lamentou a mulher com as lágrimas nos olhos.
— Então se não
queriam ver era escusado cá virmos.
— E o papá
gostaria que lhe metessem também um par de ferros?
— Ó menina, salvo
seja!…
Nisto o povo
entusiasmado berrou:
— À
unha! à unha!
Eusébio não pôde
conter-se e correu a ver a pega, dizendo à família:
— Venham admirar,
não há perigo, a fera está catrafilada.
As duas senhoras
iam a chegar-se, tremendo, quando ele bruscamente as empurrou para o fundo do
camarote, exclamando:
— Não vejam! O boi
pôs o moço de forcado num estado que as senhoras não devem ver!…
Ouvindo isto a
consorte caiu desmaiada numa cadeira, e a filha, presa de susto, sentiu-se
agoniada.
O comerciante,
vendo este despropósito e sorrindo-lhe a ideia do jantar, chamou um trem e
pespegou com a família no hotel, gritando da porta:
— Salta o jantar!
— Agora só se for
o chá, respondeu secamente o criado. A mesa redonda já lá vai e não há nada
para comer.
Eusébio, fulo de
raiva, exclamou:
— Isto é um
desaforo! Traga-me já a conta que me quero ver daqui para fora quanto antes.
O criado obedeceu
prontamente. Eusébio leu: "Quarto, almoço, jantar e ceia para três
pessoas, 4$500 réis."
— Quatro mil e
quinhentos réis! Que grande ladroeira! Quatro mil e quinhentos réis!… Mas eu
não comi nada!
— Estivesse às
horas, respondeu tranquilamente o criado. E faça favor de se aviar senão perde
o comboio da noite.
Eusébio, cheio de
cólera… e de fome, voltou-se então para as duas e exclamou:
— Ora veem? Eu só quero que vocês me digam quem é que foi o verdadeiro touro nesta tourada!
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