Zuína o e Saci
— Olha aqui, moleque, se você ficar na rua até tarde, a Zuína vai te pegar, viu?
Era com essa advertência que muitas mães capim-grossenses de outrora convenciam seus filhos a voltar para casa mais cedo. Não consta, entretanto, que a velha andarilha tenha feito qualquer maldade a um pequeno. Ao contrário, era comum vê-la confeccionando bonecas de panos para brincar com as meninas das redondezas, e se divertia com elas como se tivesse a mesma idade.
Se, porém, nenhuma maldade Zuína fez aos meninos, o mesmo não se pode dizer ao endiabrado Saci, o qual tentou lograr com sua magia a boa mulher. O caso foi o seguinte:
Certa vez, estava Zuína dormindo numa velha esteira de palha, lá na sua casinha de taipa em Caiçara, quando de repente foi despertada com um assovio ensurdecedor no ouvido. Mal se ergueu, sentiu que alguém lhe fazia cócegas por todo o corpo, ao mesmo tempo em que tentava lhe rasgar a saia. Ela não teve dúvida: aquilo eram artes do diabinho do Saci.
Embora não estivesse visível aos seus olhos, ela sentia que o pretinho estava bem ali do seu lado e que só havia uma maneira de se livrar das suas inoportunas travessuras. Então, mais que depressa, num esforço supremo, conseguiu levantar-se e ficar de pé. Em seguida, com um movimento brusco, estendeu os braços para frente e, girando num rodopio, acertou bem de cheio com uma das mãos na carapuça do danado. Com isso o tinhoso de uma só perna perdeu momentaneamente suas forças e ela se viu finalmente livre de suas traquinices. Mas não ficou apenas nisso. Num ímpeto de gavião, Zuína correu para pegar o gorro vermelho, pois sabia que a posse desse objeto lhe daria poder sobre o moleque amaldiçoado. Ele, porém, ligeiro como o pensamento, adiantou-se num salto, pegou a carapuça e se esvaiu como um relâmpago, deixando para trás um fumacê fedendo a enxofre.
— Deixa estar - pensou a boa velha — quando vortá de novo aqui tu vai ver o que é bom pra tosse!
Há muito que Zuína tinha guardado um cachimbo velho que achou numa de suas andanças. Com as pólvoras de uns traques que conseguira na feira de Capim Grosso, ela socou bem o explosivo no fundo do pito e o deixou bem exposto em cima do velho fogão a lenha.
Daí a dias o capeta pretinho voltou. Era uma tarde deslumbrante e o sol já descambava no horizonte. Zuína, escondida atrás de um velho armário, observava tudo por uma pequena frincha.
Assim que entrou na pequena choupana, o diabinho da mão furada já foi lançando um olhar maligno por todos os lados. Andou mais um pouco e deu de cara com o cachimbo sobre o fogão. Neste momento seus olhos acenderam como brasas, tanto era o seu deslumbramento. Sem demora agarrou o pito e começou a tragar. Quando, porém, ia dar a sétima baforada, eis que um estouro sapecou-lhe toda a cara e ele desapareceu no meio da fumaça.
Neste instante, Zuína, que deixou seu esconderijo, exclamou com ar de triunfo e dando uma gostosa gargalhada:
— Esqueceu, peste, que me chamo Jesuína
de Jesus?
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