Conta-se que um homem poderoso e rico, muito aborrecido de sua existência na terra, decidiu doar toda a sua fortuna a quem melhor respondesse a seguinte pergunta: O que é a vida?
O tão atrativo anúncio fez com que pessoas de toda parte daquele reino rumassem numa verdadeira peregrinação com destino ao seu suntuoso palácio, a fim de satisfazer, mais que ao desejo do ilustre marajá, ao próprio e natural interesse, que era o de usufruir toda a sua imensa riqueza.
Decorreram assim agitados dez longos anos, ao cabo dos quais o nobilíssimo fidalgo deu por encerrado o disputado certame. As respostas, em número quase incalculável, foram todas compiladas em um imenso volume encadernado em ouro puro, tudo transcrito pelas mãos dos mais habilidosos calígrafos do tempo. O próprio homem as leu uma por uma. Nenhuma, contudo, fora capaz de satisfazer sua singular pretensão, nem dirimiu sua dolorosa angústia. Ao contrário, fê-lo ainda mais melancólico, e como nunca ele desejou uma resposta definitiva para seu terrível dilema existencial.
No entanto, como era homem honrado e rigoroso no cumprimento das leis morais, não encontrou outra solução senão cumprir sua promessa, escolhendo, enfim, um felizardo para o dispendioso concurso. Foi assim que numa bela manhã, clara e fresca, abandonou seu ostentoso palácio, descalço e munido apenas de um saco de pano sobre os ombros, e dali partiu, sem destino certo, em peregrinação pelo mundo. Ficou em seu lugar, desfrutando de toda sua riqueza, um vagabundo das cercanias, o qual definiu a vida como a fumaça de um charuto.
Por longo tempo ele perambulou errante por terras longínquas e desconhecidas, onde experimentou a dor e o prazer, a fome e a fartura, a guerra e a paz, a doença e a saúde, a traição e a amizade, o ódio e o amor...
Um dia, já velho e alquebrado, encontrou estendido à beira de uma estrada, um pobre mendigo todo imerso em grandes misérias, com o corpo tomado de profundas chagas e que clamava por água e pão, como se tivesse prestes a morrer. Aproximou-se então dele, enfaixou-lhe as feridas, derramando nelas vinho e óleo. Depois o conduziu à sombra de uma grande árvore, e ali lhe deu água para beber e o que restava de sua comida. Revigorado em suas forças, o pobre homem ajoelhou aos seus pés e os beijou chorando em agradecimento. A este gesto inesperado, o outro se afastou, dizendo que apenas retribuía a ele o que lhe fizeram em sua longa jornada. Em seguida ofereceu o charuto que fumava e se preparou para sair. O miserável aceitou o vicioso fumo com muitos sinais de reconhecimento e, puxando duas fumaças, balbuciou com voz de moribundo:
- A vida... a vida... é como a fumaça desse charuto.
Dizendo isso, deu mais uma tragada e inclinou a cabeça por sobre as folhas secas, acabando ali os seus dias.
O outro, que o tomou nos braços, caiu em prantos ao reconhecer naquele desgraçado o mesmo ébrio para quem havia doado toda sua fortuna.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...