5/17/2020

José Albano: O poeta elegante



O poeta elegante

José Albano, o autor das "Redondilhas", afinava a cultura na elegância.

Venho de falar em elegância. Muito se tem abusado deste vocábulo num país que vive a copiar as modas europeias, as da indumentária como as demais. Quantos homens haverá entre nós verdadeiramente elegantes, dignos de competir com o conde d'Orsay ou com o duque de Palmella? O que se vê por aqui é muita fazenda cara e bem talhada em desgraciosos cabides ambulantes.

De mim para mim, só me recordo de ter defrontado um homem cuja distinção de maneiras me fazia pensar nos leões do Segundo Império francês ou na Espanha cavalheiresca dos sombreiros emplumados, das gargantilhas e dos punhos de rendas. Foi exatamente o poeta José Albano, que eu conheci à porta da livraria Garnier, há quase dois decênios, com uma cabeleira que esvoaçava sob o halo negro do chapéu de abas largas, com uma gravata de laço mais complicado que uma operação algébrica, um monóculo inamovível que nem um terremoto abalaria e uma bengala flexível, de aspecto misterioso, lembrando a vara dos descobridores de fontes subterrâneas. Esse intelectual sabia envergar a casaca ou a sobrecasaca, sabia andar na rua, sabia rir, sabia conduzir-se num salão. Metendo nas Barbas de mago caldaico, umas mãos de cardeal moço, gostava de conversar e sua conversa era um folhetim, um anedotário; ouvindo-o, tinha-se a impressão de ver esses acrobatas que atravessam num salto arcos de papel em chamas, e, quando ele nos falava de suas viagens, era como se folheássemos um livro de figuras ou como se nos debruçássemos sobre uma carta geográfica.

Apesar de nunca perder a linha do traje e das palavras, amava o lazzaronismo espiritual dos boêmios e teve uma vida emborrascada por mil complicações, intimamente era um triste, era um dos tais que nascem com uma chaga no coração. Por isso, na um sabor de alma nos seus versos líricos, que nos prendem pela profundeza da emoção, ao mesmo tempo em que nos encantam pela doçura prosaica, que não é raro doçura melódica, versos reveladores de uma sensibilidade que vibrava ao mínimo toque, versos que valem por músicas visíveis ou por sonhos palpáveis, versos tão brandos como o voo de uma névoa.

José Albano teve também, quando quis, notas épicas e nos últimos dias de doença e até de loucura, foi-lhe a poesia um talismã viático.

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AGRIPINO GRIECO
Evolução da Prosa Brasileira (1932)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2020).

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