José Albano, o autor das "Redondilhas", afinava a cultura na
elegância.
Venho de falar em elegância. Muito se
tem abusado deste vocábulo num país que vive a copiar as modas europeias, as da
indumentária como as demais. Quantos homens haverá entre nós verdadeiramente elegantes,
dignos de competir com o conde d'Orsay ou com o duque de Palmella? O que se vê
por aqui é muita fazenda cara e bem talhada em desgraciosos cabides ambulantes.
De mim para mim, só me recordo de ter
defrontado um homem cuja distinção de maneiras me fazia pensar nos leões do
Segundo Império francês ou na Espanha cavalheiresca dos sombreiros emplumados, das
gargantilhas e dos punhos de rendas. Foi exatamente o poeta José Albano, que eu
conheci à porta da livraria Garnier, há quase dois decênios, com uma cabeleira
que esvoaçava sob o halo negro do chapéu de abas largas, com uma gravata de laço
mais complicado que uma operação algébrica, um monóculo inamovível que nem um
terremoto abalaria e uma bengala flexível, de aspecto misterioso, lembrando a
vara dos descobridores de fontes subterrâneas. Esse intelectual sabia envergar
a casaca ou a sobrecasaca, sabia andar na rua, sabia rir, sabia conduzir-se num
salão. Metendo nas Barbas de mago caldaico, umas mãos de cardeal moço, gostava
de conversar e sua conversa era um folhetim, um anedotário; ouvindo-o, tinha-se
a impressão de ver esses acrobatas que atravessam num salto arcos de papel em chamas,
e, quando ele nos falava de suas viagens, era como se folheássemos um livro de figuras
ou como se nos debruçássemos sobre uma carta geográfica.
Apesar de nunca perder a linha do
traje e das palavras, amava o lazzaronismo espiritual dos boêmios e teve uma vida
emborrascada por mil complicações, intimamente era um triste, era um dos tais
que nascem com uma chaga no coração. Por isso, na um sabor de alma nos seus
versos líricos, que nos prendem pela profundeza da emoção, ao mesmo tempo em que
nos encantam pela doçura prosaica, que não é raro doçura melódica, versos
reveladores de uma sensibilidade que vibrava ao mínimo toque, versos que valem
por músicas visíveis ou por sonhos palpáveis, versos tão brandos como o voo de uma
névoa.
José Albano teve também, quando quis, notas
épicas e nos últimos dias de doença e até de loucura, foi-lhe a poesia um talismã
viático.
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AGRIPINO GRIECO
AGRIPINO GRIECO
Evolução
da Prosa Brasileira (1932)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2020).
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2020).
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