O Descobrimento
Foi
descoberto... O Tratado de Tordesilhas, concluído a 7 de junho, assinado a 2 de
julho de 1494 em Arevalo, dizia que todos os descobrimentos portugueses ao
oriente de uma raya ou linea
derecha de polo a polo... a tresientas
& setenta leguas de las yslas del Cabo Verde, ou que, desde
essa data, viriam a descobrir os portugueses, seriam deles; para o ocidente
seriam dos Castelhanos. A linha limitante ou divisória das duas bandas do mundo
seria riscada por pilotos, como astrólogos y marineros & qualesquer
otras personas que convengan, dentro de dez meses. Isto é ao tempo de Dom
João II; Dom Manuel pede à Santa Sé confirmação do Tratado, o que Júlio II
concede, a 24 de janeiro de 1506.
A pedido dos reis de Espanha, um pontífice espanhol,
Alexandre VI (Bórgia), sem audiência de Portugal, dividira o mundo pelo meio e
dera aos portugueses um hemisfério limitado até 100 léguas de Cabo Verde. D.
João II não reclamou do Papa, negociou com Espanha: a linha seria a 250 léguas,
se os Espanhóis descobrissem novas terras ao ocidente até 20 de julho de 1494,
de 370 se isso não tivesse ocorrido até esta data. A linha do Pontífice caía no
mar, deixando a Índia, pela África, aos portugueses; a concessão a Colombo, até
onze dias da assinatura do tratado, dar-nos-ia um terço, ainda assim, do
Brasil; a linha definitiva deu-nos o Brasil quase todo, da embocadura do
Amazonas, ao limite sul de São Paulo.
A 370 léguas a oeste da ilha mais
ocidental do arquipélago de Cabo Verde... acabava o hemisfério português pelo
ocidente... Dom João II insistente, tenaz (el Hombre, como lhe
chamava Isabel a Católica) e os seus diplomatas e técnicos previram o Brasil, aí
incluído: a Espanha e a Igreja concediam-lhe a África e as Índias, supondo que
o contentavam; não, ele queria mais, e exigiu também o Brasil...
Duarte Pacheco Pereira, o grande
piloto, escritor, cosmógrafo e herói que veio com Cabral ao Brasil, e fora dos
negociantes de Tordesilhas, dirigindo-se a el-Rei D. Manuel escreveu, em 1506,
no Esmeraldo: Por
tanto bemaventurado Principe temos sabido & visto como no terceiro anno de
vosso Reynado do hano de nosso senhor de mil quatrocentos noventa & oito
donde nos vossa alteza mandou descobrir ha parte oucidental passando alem ha
grandeza do mar ociano honde he achada & navegada huma tam grande terra
firme com muitas e grandes Ilhas ajacentes a ella que se estende a setenta
grados de Ladeza da linha equinocial contra ho polo artico (Esmeraldus de Situ
Orbis).
“É achada e navegada”, traduzem os comentadores: achou-se e navegou-se o
Brasil. Mas, em 1498, Dom Manuel mandara Duarte Pacheco achar esse Brasil
suspeitado em Tordesilhas, em 1494, pelos portugueses, um deles esse Duarte
Pacheco que, em 1500, vem, com Cabral, a isso...
O depoimento de Pero Vaz, do Mestre
João, físico e cirurgião, que vinha na Armada, e do Piloto Anônimo, sobre o
descobrimento, em 1500, não revela surpresa e imprevisto... O Piloto refere “o
grandíssimo prazer” do achamento. Achar o que se procura faz isto. O imprevisto
não; esse, surpreende. Nesses documentos, os únicos de testemunhas, não há
tempestades, ao menos a invocada para o desvio da rota. Vasco da Gama passara
também ao ocidente de Cabo Verde, empegado no mar, para evitar as calmarias
africanas e dobrar de largo o Cabo de Boa Esperança, como fez Cabral, mas não
aportou ao Brasil... Mestre Joham, o físico da armada, diz a el-Rei D. Manuel:
Quando, senor, al sityo desta tierra,
mande Vossa Alteza traer un napa-mundi que tiene Pero Vaaz Bisagudo, e por ay
podrra ver Vosa Alteza el sityo desta tierra, en pero, aquel napa-mundi non
certyfica esta tierra ser habytada, o no. Es napamundi antiguo... Já o
Brasil estava em napamundi antiguo:
ao menos sabia-o um dos descobridores...
Fundado nestes dois documentos, de
Duarte Pacheco e de Mestre Joham, ambos testemunhas presenciais do achado de
1500, diz o americanista Henri Vignaud: não
poderá haver dúvida alguma que não é Cabral o primeiro descobridor português do
Brasil. (Americ Vespuce — ses voyages... 1911). Depois
disso, continuar-se-á a falar da “tempestade”, “das calmarias”, do “acaso”,
como fizeram, da quarta-feira, 22 de abril, 3 de maio, que foi domingo...
Ignorância ou teima: ou as duas.
A 22 de abril, à tardinha, houveram
vista da terra, o monte Pascoal, o arvoredo. A 23 navegaram contra a terra e
surgiram na foz de um rio. Viram homens nus, com arcos e flechas. A 24
navegaram ao longo da costa, buscando abrigo, aguada e lenha. Acharam um porto,
abrigado por arrecifes e aí ancoraram. A 26, domingo, o franciscano Fr.
Henrique Soares, de Coimbra, ajudado por outros religiosos, celebrou, num
ilhéu, a primeira missa. Na sexta-feira, 1º de maio, erigiram em terra firme
uma grande cruz de madeira, feita por dois carpinteiros de bordo, com as armas
e divisas de Dom Manuel, sendo rezada então a segunda missa. Para o reino, a
dar notícia do achado, seguiu o navio de Gaspar de Lemos. Com as araras e
papagaios, arcos, flechas, penas, amostras da terra e da gente, pretende
Castanheda fora um índio: &
mandou-lhe hu home daquela terra. A armada agora de onze navios, partiu a 2
de maio, sábado, rumo de África, para passar o Cabo de Boa Esperança pelo
largo, segundo recomendava a experiência de Bartolomeu Dias e de Vasco da Gama.
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