O
Nome
Disse
Pero Vaz: ao qual monte
alto o capitam pos nome o monte Pascoal e aa tera a tera de Vera Cruz.
Dom
Manuel, escrevendo aos Reis de Espanha, diz: mi capitan com
trece naos partio de Lisboa a nueve de Marzo dei año pasado. Em las octavas de
la pascoa siguiente llegó á una tierra que nuevamente descubrió, á la qual puso
nombre de Santa Cruz (História da Colonização Portuguesa do Brasil).
No
regimento dado a João da Nova, capitão da terceira armada, logo depois da de
Cabral, vem o nome de Ilha da Cruz (Varnhagen, História Geral;
Antônio Baião, O Comércio do Pau-Brasil,
História
da Colonização Portuguesa).
Portanto,
oficialmente, Vera Cruz, Santa Cruz, Cruz... Houve mais: Terra dos Papagaios,
pelas grandes e belas araras, que impressionavam, e Pedrálvares enviara ao
reino por Gaspar de Lemos, nome que vem em alguns mapas antigos. Cretico
(Giovanni Matteo), agente em Lisboa da Senhoria de Veneza, escrevendo dali em
22 de julho de 1501, diz, narrando a viagem de Cabral: ha discoberto
una terra nova, chiamano la terra deli Papagá, per esserli papagá longi une
brazo e piú, de vari colori, de li qual ne hanno visto doy (Paesi
novamente retrouati, 1507). Também aí vem carta de Pietro Pasqualigo, de 18
de outubro de 1501, em que diz: com la terra
dei Papagá noviter trovate per le navi di questo re che andarono in Calicut.
Logo,
porém, começou o Brasil. Escreveu João
de Barros: Per o qual nome Sancta Cruz foi aquella terra nomeada os
primeiros annos: & a cruz arvorada algus durou naquelle lugar. Porem como o
demonio per o sinal da cruz perdeo o dominio que tinha sobre nós, mediante a
paixão de Christo Jesu consumada nella: tanto que daquella terra começou de vir
o pao vermelho chamado brasil, trabalhou que este nome ficasse na bocca do povo,
& q se perdesse o de Sancta Cruz: Como que importava mais o nome de hum pao
que tinge panos: que daquelle pao que deu tintura a todolos sacramentos perque
somos salvos... (Décadas).
Recentemente,
disse Duarte Leite: Em 1503 já se
empregava o termo Brasil, porque o diz João Empoli numa carta transcrita em
Ramusio (História da Colonização Portuguesa). Capistrano de Abreu
dissera: Empoli, em 1504, chamava-a Vera
Cruz ou Brasil (Ramusio). Desde este ano o nome Brasil apareceu em
documentos portugueses e alemães e cada vez se generalizava mais (Wieser, Magalhães-Strasse
und Austral Continent, Innsbruck,
1881; Materiais e
Achegas).
“Empoli”,
não é exato. Duarte Leite e Capistrano foram induzidos em erro por Ramusio que,
na narrativa de Empoli, introduziu um aposto comprometedor, em 1550-4: depois
de terra della Vera Croce,
esclareceu: over de Bresil cosi nominata.
O texto autêntico, reproduzido na Racolta
Colombiana, parte III,
volume II, Roma, 1893, que faz fé, diz apenas Vera Crocie è si nomata. Portanto Giovanni da Empoli, feitor de
Bartolo Marchioni, numa nau de Portugal, não chama, em documento de 16 de setembro
de 1504, (o 1503, de Duarte Leite, vem do começo
dele: la partita nostra fu di Lisbona a
di 6 d’Aprile 1503...), a Vera Cruz, Brasil. Aliás, atente-se nisto:
Ramusio escreve duas vezes “Bresil”, e como, adiante, o documento fala em verzino, não parece
admitir identidade de nome entre a terra e a madeira...
Capistrano
cita Wieser, que diz, de fato: Acho o
nome Brasil já desde 1504 repetidamente em uso. A saber: Beschreibung
der Meerfahrt von Lissabon nach Calacut, vom J. 1504 (Descrição da Navegação de Lisboa a Calacut,
1504): chama terra nova de Prisilli; Empoli, no fim
de 1504, e cita Ramusio, 1563, etc.; um “diário de bordo” de 1505-6, diz: aos 6 dias de mayo foron leste hoeste com a
terra de Brazil 200 leguas e dhy se foron ao Sul ata 40 grados (publicado
por Schmeller em seu artigo: Ueber
Valentin Fernandez Alemã, etc.); finalmente,
a “Gazeta Alemã”, Newen Zeytung aufs Presillg Landt, da qual Varnhagen
dissera, citando outrem, que deviam ser informações “de 1507” , e que, na História Geral, ainda é mais decisivo e
antecipado: Julgamos de tal importância
alguns períodos dessa relação ou gazeta (que supomos haver sido escrita em
Lisboa por um estrangeiro e publicada pela primeira vez em 1506...
(Varnhagen). Ora, o manuscrito da Gazeta
foi achado, posteriormente, por Konrad Haebler, em 1895, no Arquivo dos
Príncipes Fuegger, em Augsburgo, e traz a data de 1514... (Clemente
Brandenburger — A nova gazeta
da Terra do Brasil, São
Paulo — Rio, 1922). Portanto, Empoli, em 1504, e a Gazeta, em 1506, afastados...
Chamei
a atenção para o modo de Ramusio, ainda em 1550-63, escrever na sua interpolação
“Bresil”, distinguindo este nome da terra, do nome da madeira, escrito adiante,
em italiano, “verzinio”. É que, aqui, tem cabida a hipótese que aquele nome é
de origem francesa... Os nomes lusitanos Vera-Cruz, Santa Cruz, não seriam
mudados pela piedade portuguesa: foram os piratas franceses, desde antes de
1504, (quando vieram, ao dizer de Anchieta, pela primeira vez) que designaram a
terra pela riqueza conhecida, “terre du brésil”, depois daí “le Brésil”, como
ainda hoje. Nós tivemos, pela divulgação e aceitação do nome, de traduzi-lo:
“Brasil”.
Como
quer que seja já em 1510 está em Gil Vicente, no Auto da Fama, “terra do
Brasil”: mas será mesmo o Auto de 1510? De 1511, talvez: Llyuro da naao
bertoa que vay para a terra do brasyll... que partiu deste porto de Lixª a 22
de fevº de 511 é o título de
um documento publicado por Varnhagen. A nau partiu em 11, mas o livro teria
sido escrito nessa data? Tudo leva a crer, mas não é certo.
Certa
é a carta de Afonso de Albuquerque, de 1 de abril de 1512, da Índia, a el-Rei
D. Manuel, a qual (carta de um
piloto) tinha ho cabo de Bôoa Esperança,
Portugal e a terra do Brasyll... Por certo é também de 1512 o mapa de
Jerônimo Marini — Orbis Typus
Universalis Tabula Hieronimi Marini fecit Venetia MDXII — cujo
original possui o nosso Ministério do Exterior, na Biblioteca do Itamarati,
onde se lê pela primeira vez, em planta: “Brasil”. Um ano depois, e é
interessantíssimo, é o próprio Dom Manuel que mudara Vera Cruz em Santa Cruz,
segundo disse aos reis de Castela Fernando e Isabel e agora a um deles o diz,
em 13 de setembro de 1513: na teerra...
que he pegada com a nossa teerra do Brasyl (Carta a el-Rei D. Fernando, de
Castela, in: Alguns documentos).
Mas
é sempre “terra do Brasil”, como se dissesse, por abreviação, “terra do (pau)
brasil”: o documento escrito em que primeiro aparece Brasil só, como no mapa de
Marini é o de Dom Rodrigo de Acuña, de 15 de junho de 27, ao bispo de Osma,
dando conta da perda da armada que mandara Carlos V às Molucas e pedindo
interceda junto de D. João III para lhe obter a liberdade, preso que está na
feitoria de Pernambuco (nos baixios de D. Rodrigo, onde naufragara, e naufraga,
mais tarde, o primeiro Bispo, comido pelos índios). Diz ele: nos convino arrybar al Brrasil; (nesta
carta há ainda tyerra dei Brrasil e nao cargada de brrazil.
O
nome Brasil vem de longe. Disse Humboldt, vem de Samatra, e levou quatro mil
anos para nos chegar... É o nome de uma madeira tintorial, a Cesalpina
ecchinata, especiaria
trazida do Oriente à Europa, nome variamente escrito — braxile,
bresillum, brisilium, bersi, verzi, verzino, como
recentemente, há cinco séculos, o chamavam os Venezianos. Já dele falam o
geógrafo árabe Abuzeid El Hacen (IX século), Endrisi e Chrestien de Troyes no
século XII: este escreve mesmo Braisil, que dá, em
francês, a pronúncia do nome atual nesse idioma. Teria vindo à Europa depois
dos primeiros Cruzados, por volta de 1140. Tirava-se, do toro, a casca e o
líber, e apenas o cerne vermelho servia para tingir panos e fazer tinta, para
iluminar manuscritos, dando tons róseos às miniaturas. A madeira, dura e
corada, também aproveitava à marcenaria.
A
geografia apoderar-se-ia do nome, e terras do Brasil houve, antes da nossa:
Krestchmer encontrou em mapas medievais as seguintes variantes: Brazi,
Bracier, Brasil, Brasiel, Brazil, Brazile, Braziele, Braziel, Bracil, Braçil,
Braçill, Bersill, Braxil, Braxili, Braxiel, Braxyili, Brisilge.... É uma ou mais
ilhas do Ocidente, no grupo dos Açores, ou na altura da Bretanha, ou não longe
da Irlanda. Ainda hoje há uma pedra Brazil Rock, na Irlanda, e
um monte Brasil, junto à cidade
de Angra, na Ilha Terceira, dos Açores. Num mapa de 1351 já aparece esta ínsula do Brazil, nesse Açores. Em 1480
partiram de Bristol navios à procura da Ilha Brasil. Em 1497 Ayala, legado de
Espanha junto à Corte de Inglaterra, dizia que de sete anos àquela parte
partiam de Bristol, anualmente, navios à mesma pesquisa. Lá está, no mapa de
Toscanelli, (1474) ao norte e oriente, a ilha Brasil... Até 1875 o Almirantado
inglês manteve nas suas cartas essa “Brasil Rock”.
Diz
a erudição que os Árabes chamavam ao pau bakkam, que traduziram
em latim brasilium, procurando a
analogia da raiz semítica bakkham (ardente) com
a ariana bradsch, em português brasa, italiano brace, francês braise. Como se deu
tal nome à geografia, é controvertido: Brasil, indicaria
fenômenos vulcânicos notados no arquipélago açoriano; ou aí se teria encontrado
senão o verdadeiro brasil, pelo menos
algum sucedâneo, talvez a urzela. Contudo Capistrano de Abreu, reparando que
nas formas gráficas e geográficas de Kretschmer não se veem formas congêneres
do verzi ou verzino, diz poder-se
concluir que o Brasil, ilha ocidental, nada tem com o produto oriental. Conclui
que natural é proceda o nome do celta, e há quem o decomponha braza, grande, i: em todo o
caso Brasil, ilha, aparece sempre no Atlântico e sempre a W de terras primitivamente
habitadas por Celtas. Os índios chamavam à planta arabutan ou ibirapitanga.
Os
portugueses conheciam o brasil: a 19 de
outubro de 1470 Afonso V proibia aos traficantes da Guiné comerciarem que as
tintas do brasil, protegendo talvez o produto das ilhas. Quando se começou o
tráfico com os selvagens de Santa Cruz, a primeira matéria de exploração foi o
brasil. No Esmeraldo, escrito em
1505, escreveu Duarte Pacheco da terra: é
achado nela muito e fino brasil com outras muitas coisas. Terre du brésil lhe chamaram
os piratas franceses, e, depois, o menor esforço daria le Brésil, como ainda
hoje. Esse menor esforço foi a causa da troca, que tanto indignou João de
Barros: os políticos e sacerdotes, que batizam e dão nomes, não advertem que
eles prevalecem na ordem da simplicidade. Em alguns anos apenas, a Terra de
Vera Cruz já era pois, o Brasil... E era — o que mais admira, na expressão do
próprio Dom Manuel: na teerra... que he
pegado com a nossa teerra do Brasyl. Piedosamente diríamos: nome mudado na crisma...
A
palavra teve, no começo, várias acepções, que foi perdendo: Pau-brasil: Cá ha assuquer e algodão, brasil e ambre e
resgates
(Cartas avulsas de Jesuítas, 1931). Pera
ali carregarem de brasil. A terra: Todo o Brasil, que assim se pode dizer. Nestas
partes do Brasil.
A gente: Para estudantes — brasil fazem-no muito bem. Os que tangiam eram meninos brasis. A língua: Espera em pouco tempo falar tão bem brasil, como
agora italiano; às vezes lhe falava homem português e ele respondia brasil.
“Brasileiro”
foi, a princípio, o traficante ou o ocupado em tirar o brasil, como de baleia
“baleeiro” (Varnhagen). A desinência “eiro” é profissional: ferreiro,
carpinteiro. Aqui, de profissional, passou a patronímico: os mineiros que
trabalhavam nas minas gerais ficaram depois, os filhos de Minas Gerais. Contudo
tentou-se “brasiliense”, “brasílico”, brasiliano“, sem êxito, até agora.
Brasileiro ficou o filho do Brasil: que importa tal dignificação, se brasil
ficou também dignificado em Brasil?
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