Fim
de Nóbrega, Mem de Sá, D. Pedro Leitão
Carregado
de trabalhos, depois de um santo ministério, o 1º santo do Brasil, morreu o
Padre Nóbrega, em 1570. Mem de Sá, que tanto pedira dispensa do cargo onde
tantos, e tão beneméritos serviços prestara, quando foi finalmente atendido,
mais apressada a morte veio, em 72. Dom Pedro Leitão, o 2º bispo, seguiu-o de
perto, em 1573. Dom Luiz Fernandes de Vasconcelos vem por governador e traz
consigo o Padre Inácio de Azevedo com 39 padres, e muita gente e carga, em seis
naus e uma caravela. Afasta-se a nau dos padres, a Sant’Iago, para passar
pela Ilha da Palma, e é agredida por uma esquadra da Rochela de comando do
calvinista Jacques Sória, que faz sofrer o martírio a todos os padres (15 de
julho de 1570). Luiz de Vasconcelos não chegou também a bom porto, errou por
Nova Espanha, pelos Açores e aquém da Madeira foi vítima de uma esquadrilha
anglo-francesa, do comando de João Capdeville, pirata huguenote: mais 12 padres
são vítimas dos hereges. Martírio pelo Brasil.
Em
72 Dom Sebastião divide o Brasil em dois governos: o do norte, sede na Bahia,
confiado ao Conselheiro Luiz de Brito de Almeida; o do sul, sede no Rio de
Janeiro, ao Dr. Antônio Salema. A este manda escorraçar os Franceses,
traficantes em Cabo Frio, marchando contra eles à frente de 400 portugueses e
700 índios. Desta vez é definitivo. A experiência mostrou que não provavam bem
os dois governos e o mesmo Dom Sebastião reuniu-os, sob o mando único de
Lourenço da Veiga, em 78.
Sobrevém
o desastre de Alcácer-Quibir e a sucessão de Dom Sebastião, batido e morto nos
areais africanos, nesse 78. O velho e valetudinário Cardeal Dom Henrique, que
já precisa, de novo, de amas de leite, é rei efêmero de Portugal. Os
pretendentes põem-se em campo: ao duque de Bragança oferece Filipe II, em 79, o
reinado do Brasil e das colônias portuguesas, se a duquesa D. Catarina desistir
dos seus direitos à Coroa de Portugal. O Brasil virá, por fim, a manifestar-se
contra Dom Antônio, Prior do Crato. A todos se adianta, sob a ameaça da
invasão, corrompendo a dinheiro e intimidando à força, aquele Filipe II (1580).
Manuel
Telles Barreto (82-87) conclui a conquista da Paraíba do Norte. Cristóvão de
Barros conquista Sergipe, contra os índios e defende a Bahia. O fanático Filipe
II é inimigo de Inglaterra e dos hereges: em 85 embarga nos seus portos todos
os navios ingleses, holandeses, zeelandeses, alemães e hanseáticos: Lisboa não
será mais empório de especiaria. A Inglaterra responde, embargando nos seus
portos os navios espanhóis e portugueses. Francis Drake pirateia Cabo Verde, os
Açores, finalmente Faro. Será a vez das colônias. Irão às Índias buscar as
especiarias diretamente e tomarão o gosto de conquistar estas colônias: o
fanatismo levou-os até aí, pela mão. Entretanto, o Brasil sofre o assalto dos
Ingleses: Edward Fenton veio, em 82,
a São Vicente; Robert Withrington à Bahia; Thomas
Cavendish escolheu Santos, em 91; James Lancaster, em 95, Pernambuco:
desembarcam, pilham, escarnecem, e dão à vela, com algumas perdas. Ainda em
vida de Filipe II aparecem naus flamengas nas Índias. Em 98, Olivier van Hood
tenta o Rio e São Vicente; em 99 é a esquadra de Leynssen; em 604 é Paul van
Carden, depois Spilbergen: é agora o sobressalto contínuo... Virá mais.
Ganhamos os inimigos de Espanha e sofremos consequências do fanatismo dos
Filipes. Com a sorte da “Invencível Armada”, destruída nos mares do norte, em
1588, acaba-se o respeito a Espanha e, o que pior, a Portugal, além disto conquistado
e dilapidado.
Dom
Francisco de Sousa foi governador de 591 a 602; chamam-no “Dom Francisco das
Manhas”, pela muita prudência com que executou o seu programa, que foi ocupar o
Rio Grande do Norte, fortificar a costa contra os corsários e descobrir as
jazidas de ouro.
Este
século XVI não terá sido estudado, ainda a grandes passadas, sem referência a
três livros de grande valor, para compreender o Brasil quinhentista. São eles:
de Pero de Magalhães (Gandavo), latino, gramático, amigo de Camões, que lhe
reconhece claro estilo, engenho curioso
e esteve no Brasil (como auditor de fazenda na Bahia), de onde levou dois
estudos — Tratado da
Terra do Brasil, escrito
antes de 73, provavelmente em 70, impresso em Lisboa em 1826 e a História da
Província Santa Cruz, impressa em
1576, em Lisboa: são tratados informativos da terra e da gente.
De
João de Léry, que veio com Bois le Comte, o sobrinho de Villegaignon, em 57,
tornado em 58, há, escrita em 63, a Histoire d’un
voyage fait à la terre du Brésil, impressa em
78, que teve numerosas edições, traduzida em latim em 86. Aí já há ênfase brasileira,
na boca de um índio: Exultemos das gentes
que nos procuram. O mundo é o nosso bem: ele é que nos dá os seus bens. Nada
devemos aos nossos antepassados. Botei fora tudo o que meu avô me deixou.
Tenho-me por feliz dos bens que o mundo nos traz. Troca melhor que os nossos
avós, nos sobreveio. O selvagem de Lery já é nacionalista (“ufanista”,
diríamos agora...).
Livro
admirável, documentos inapreciáveis de história do Brasil, são as Cartas
Jesuíticas do 1º século:
de Nóbrega, que vão até 60; de vinte e tantos apóstolos como ele, nas “Cartas
avulsas”, que vão até 68; de Anchieta, que dispensa qualificativo, que vão até
87; nas quais se vê amanhecer o Brasil, que eles, os Jesuítas, ajudaram a
nascer e a crescer. Publicadas no século XX por Capistrano de Abreu e
discípulos seus — Vale Cabral, Rodolfo Garcia, Afrânio Peixoto, Alcântara
Machado, são como que a aurora do grande livro que se esperava, a História da
Companhia de Jesus no Brasil, que ora
publica o Dr. Serafim Leite.
Ainda,
de Gabriel Soares de Sousa, vindo ao Brasil em 67, aqui estabelecido, senhor de
engenho na Bahia, devassador curioso da terra e das minas, levando à Metrópole
amostras de ouro, prata, pedras preciosas e um roteiro, que é o Tratado
descritivo do Brasil em 1578. De 84 a 90 esperou despacho em
Madrid, finalmente nomeado capitão-mor e
governador da conquista e descobrimento do Rio de São Francisco. Tornou ao
Brasil, naufragou, internou-se no sertão, sofreu dificuldades e rebeliões com
serviçais e, abandonado dos índios que levava, pereceu perto de Mucugê, na
Chapada Diamantina da Baía. O seu livro é um tesouro de informações
brasileiras, um inventário do Brasil em 1587: publicado em 1825 pela Academia
das Ciências de Lisboa, deu-lhe Varnhagen, em 1879, 2ª edição, correta e
acrescentada, rematando na atual, de Pirajá da Silva, Notícia do Brasil, enriquecida de
sábias e imprescindíveis notas.
Os
“tratados” do Padre Fernão Cardim, da
terra e da gente do Brasil, dos quais Rodolfo Garcia fez edição próxima
(1925), são digno livro dos precedentes: memórias da infância do Brasil. Este Brasil é já outro Portugal, não lhe
falta nada, tem tudo, porém está já Portugal... pelas muitas comodidades que de
lá lhe vêm. Se os primeiros engenhos de São Vicente ficam em 6, os engenhos
da Baía já são 36, (confirmando Gabriel Soares), os de Pernambuco 66,
(confirmando Anchieta) nesse fim de século XVI e cada um — disse o jesuíta na informação — é uma grande povoação e
para o serviço deles e das mais fazendas terá até 10.000 escravos de Guiné e
Angola e de índios da terra até 2.000. Vêm cada ano 40 navios ou mais a Pernambuco e não podem levar todo o açúcar, diz
Cardim. A gente da terra é honrada: há
homens muito grossos de 40, 50 e 80 mil cruzados de seu: alguns devem muito
pelas grandes perdas que têm com escravaria de Guiné, que lhe morrem muito, e
pelas demasias e gastos grandes que têm em seu tratamento. Vestem-se, e as
mulheres e filhos de toda a sorte de veludos, damascos e outras sedas e nisto
têm grandes excessos. As mulheres são muito senhoras, e não muito devotas, nem
frequentam as missas, pregações, confissões, etc.: os homens são tão briosos
que compram ginetes de 200 e 300 cruzados, e alguns têm três, quatro cavalos de
preço. São mui dados a festas. Casando uma moça honrada com um vianês, que são
os principais da terra, os parentes e amigos se vestiram uns de veludo
carmesim, outros de verde e outros de damasco e outras sedas de várias cores e
os guiões e selas dos cavalos eram das mesmas sedas de que iam vestidos. Aquele
dia correram touros, jogaram canas, pato, argolinha, e vieram dar vista ao
colégio para os ver o padre visitador: e por esta festa se pode julgar o que
farão nas mais, que são comuns e ordinárias. São sobretudo dados a banquetes em
que de ordinário andam comendo um dia dez ou doze senhores de engenho juntos, e
revezando-se desta maneira gastam quanto têm, e de Ordinário bebem cada ano 50
mil cruzados de vinho de Portugal: e alguns anos beberam oitenta mil cruzados
dados em rol. Enfim em Pernambuco, se acha mais vaidades que em Lisboa. Em
1587 haveria 60 engenhos em Pernambuco.
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