A
obra de Rio Branco não é daquelas que se possam sintetizar num mero artigo,
mas, por outro, possui ela índices tão significativos, que são suficientes para
mostrar a sua magnitude e importância. A herança de um grande homem, como o seu
pai, primeiro Rio Branco — cujo governo foi no antigo regime, o mais progressista
do país, além da sua benemerência no esforço nacional pela extinção do elemento
servil e da sua considerável atuação diplomática — pôde o Barão do Rio Branco
cercar de extraordinário fulgor, pelo muito que fez, igualando, ultrapassando porventura
o insigne Visconde.
Grande
advogado e grande diplomata, Rio Branco logrou conciliar, de forma
surpreendente, essas qualidades, alargadas pelo tino de estadista e
fortalecidas pelo conhecimento minucioso e seguro da geografia e da história do
seu país. Cultor apaixonado desses estudos, desde muito moço, foi neles que
encontrou as razões e os argumentos com que, mais tarde, em pleitos memoráveis
ou em gestões diplomáticas, defenderia os direitos do Brasil a integrar seu
território, nos limites até onde o esforço nacional se estendera. E, para isso,
o uti possidetis era a prova
iniludível, tendo Rio Branco, de uma forma erudita, minuciosa e exaustiva,
demonstrando sempre a razão de nossas pretensões, sob esse acertado critério
jurídico, vencendo e convencendo da maneira mais ampla e mais completa.
Depois
dos feitos famosos de Missões e do Amapá, pelos quais acresceu o território
nacional com 30.621 e 255.000 quilômetros quadrados, respectivamente, nos quais
Rio Branco se revelou um advogado extraordinário, na Chancelaria do Brasil
iria, como diplomata arguto e firme, concluir novos tratados de limites, com a
Bolívia, incorporando o Acre, com
152.000
quilômetros quadrados e com o Peru, reintegrando no país 251.000 quilômetros
quadrados, que aquela república vizinha reclamava. É preciso, porém, que se
afirme que os 688.621 quilômetros quadrados, que Rio Branco conseguiu, não
foram tirados de qualquer país irmão, mas as suas vitórias reintegraram o
território brasileiro com todas essas extensões, em disputa, mas que Rio Branco
demonstrou serem plena e absoluta propriedade do Brasil. Ele foi o servidor
constante do direito, tanto que, por vezes, fez concessões para favorecer os países
limítrofes e concluiu o tratado da Lagoa Mirim e do Rio Jaguarão, um ato de justiça,
pelo qual, sem qualquer solicitação, reciprocidade ou compensação, o Brasil
concedeu à República Oriental do Uruguai o condomínio da lagoa e rio
mencionados.
Esse
é o grande aspecto que avulta na obra de Rio Branco, nume tutelar da Pátria e Deus terminus da sua integridade, na frase
consagradora de Rui Barbosa. No entanto, a atividade do benemérito brasileiro
não se circunscreveu a esse esforço, que bastaria para a glorificação do seu
nome. A sua passagem pelo Itamarati, em dez anos de labor, cercou a nossa
chancelaria de uma fulgente auréola. O cardinalato, a 3ª Conferência
Internacional Americana, a 2ª Conferência da Paz, na Haia, tratados, visitas de
homens ilustres ao Brasil e outros acontecimentos constituem provas
significativas da sua grande gestão no Itamarati. Mas ela foi marcada sobretudo
pelas diretivas que Rio Branco traçou à política Internacional do Brasil. A ele
devemos a reafirmação de solidariedade com os Estados Unidos da América, como
elemento tradicional da nossa diplomacia; de arbitragem, como solução pacífica
das diferenças internacionais; do pan-americanismo, como destino do
engrandecimento deste hemisfério; da paz como ideal de coordenação e cooperação
entre os povos. A sua escola diplomática, da mesma forma que a dos grandes
próceres americanos, deveria produzir os frutos magníficos desta hora, quando a
América se uniu infrangivelmente para repelir a agressão e salvar a liberdade.
A vitória, que estamos prestes a celebrar, é também obra de Rio Branco, no
sentido de que a posição brasileira podemos estar seguro — foi aquela em que
nos teria colocado o grande chanceler, foi a que seguiu a sua diretiva, a que
realizou seus ensinamentos e foi a da coerência com seus princípios.
O
Barão do Rio Branco é, assim uma das nossas glórias mais puras e mais
legítimas... Evoquemos, pois, a glória de Rio Branco, o seu patriotismo, o seu
fervoroso amor à nossa terra que ele aumentou, à nossa gente que ele
dignificou, o seu desinteresse, a sua confiança inabalável na grandeza da
Pátria.
***
A
figura do grande chanceler está profundamente ligada à história da diplomacia
brasileira. Graças à sua erudição, cultura, inteligência, tato e entusiasmo — o
Brasil resolveu os casos mais graves da sua política exterior, no período
republicano. Rio Branco, além disto, traçou as diretrizes fundamentais da
política exterior do nosso país, durante a sua Iuminosa gestão no Itamarati.
Filho
de um dos maiores estadistas do Império — o Visconde do Rio Branco, que também
foi um notável diplomata — nasceu ele no Rio de Janeiro, a 20 de abril de 1845.
Iniciou
o curso de direito na Faculdade do Recife, mas foi terminá-lo em São Paulo,
onde deixou — além de uma auréola de boêmia — a tradição de sua seriedade nos
estudos e ativa participação nos movimentos literários e políticos da época.
Uma vez formado, seguiu para a Europa, em viagem de aperfeiçoamento.
Regressando ao Brasil, lecionou, durante certo tempo, Corografia e História, no
Colégio Pedro II. Quando o Visconde do Rio Branco seguiu para o Paraguai,
depois da guerra, em importante missão do governo imperial, o Barão do Rio
Branco o acompanhou como seu secretário.
Foi
deputado geral pelo Estado de Mato Grosso, sendo, na mesma época, redator de a
"Nação".
Em
1876, foi nomeado cônsul geral do Brasil, em Liverpool, onde se aprofundou nos
seus estudos de história e geografia do nosso país.
Publicou
por esse tempo uma tradução anotada da História
da Tríplice Aliança, de Schneider, a "Esquisse de Histoire du
Brésil", uma biografia de D. Pedro II, além de artigos.
Preparou,
durante muito tempo, uma história Militar do Brasil.
Quando
faleceu o Barão de Aguiar, em Washington, foi nomeado para o substituir na
chefia da missão especial encarregada de defender os direitos do Brasil na
questão de limites com a República da Argentina, submetido pelos dois países à
arbitragem do presidente Cleveland. Com suas demonstrações irrefutáveis
apresentadas na notável Memória Brasileira, o Barão do Rio Branco, levou ao
árbitro a convicção de que era brasileiro o território em disputa. E assim, em
5 de fevereiro de 1895, 30.662 quilômetros quadrados do território litigioso
eram definitivamente incorporados ao território do Brasil.
Novos
triunfos obteve, mais tarde, o Barão do Rio Branco nas questões de limites com
a Guiana Francesa.
O
Congresso Nacional declarou-o benemérito, votando uma pensão anual para ele e
seus filhos.
Quando
servia como ministro do Brasil, em Berlim, o presidente Rodrigues Alves, em
1902, convidou-o para a pasta das Relações Exteriores. Nesse posto prestou
novos e relevantes serviços ao Brasil, liquidando, então, de maneira admirável,
a questão do Acre, aumentando, mediante compensações, em dinheiro e em
território, a superfície do Brasil em cerca de 200.000 quilômetros quadrados.
Assinala-se,
ainda, pela conclusão das questões de limites com o Peru
e o Uruguai e pela medida profundamente simpática, reconhecendo à República
Oriental do Uruguai o direito ao condomínio das águas da Lagoa Mirim e Rio
Jaguarão.
Foi
conservado na pasta das Relações Exteriores nos governos de Afonso
Pena, Nilo Peçanha e Marechal Hermes da Fonseca.
Rio
Branco faleceu nesta capital no dia 10 de fevereiro de 1912.
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"A Manhã", 20 de abril de 1945.
"A Manhã", 20 de abril de 1945.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba
Mendes (2019)
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