O livro “A Crise brasileira da Educação”, de Sud Mennucci, é o mais claro, o mais lógico, o mais prático. É também o mais original no medo de encarar o problema e na solução que propõe. Principia o autor tratando da crise universal da educação. A ciência transformou as condições da vida ocidental. Todos os valores de tempo e distância passaram a ter outra significação. A escola antiga ficou fora de fase, atrasou-se tanto mais quanto já não encontra o apoio que sempre lhe deram a família de tipo romano e a oficina. O trabalho moderno é outro; outras são as condições da família em que o pátrio poder já não tem a extensão de outrora, em que a mulher vive e trabalha fora do lar. O surto da "escola nova" corresponde a tais circunstâncias. A escola nova quer ser de preferência internato, quer instalar-se em zona de campo, valendo-se do ar puro, do sol e da paisagem. Ela faz do treino sensorial o expediente máximo da sua pedagogia e se organiza com a preocupação do estudo psicológico e fisiológico do educando, do seu gênio, das suas aptidões, das suas preferências, dos seus interesses imediatos. Ela procura reunir tudo quanto cabia família e à oficina, complemento histórico dos antigos centros de educação. Condicionado o sistema educativo de cada época pela organização do trabalho então dominante, tivemos, no Brasil, o que o autor chama "saldo negativo" proporcionado pelo trabalho escravo. No segundo capítulo do seu livro o autor demonstra que a mentalidade nacional foi influenciada pelo preconceito do trabalho manual. Veio a república e com ela a obra de reconstrução educativa. Mas foram copiados os modelos clássicos, inspirados no que se via nos países industriais da Europa. O país ansiava por uma legislação educativa essencialmente rural; deram-lhe escolas urbanistas. E quando pensaram em fundar escolas rurais foi bem pior. Fizeram-se escolas de cidade localizadas no campo. Alberto Torres por isso mesmo escreveu que a nossa instrução pública era um sistema de canais de êxodo da mocidade do campo para as cidades e da produção para o parasitismo. Em vez de promover o progresso do campo, a escola oficial despovoa as lavouras. Delas o filho do lavrador não sai aperfeiçoado lavrador que o pai deseja... Passa depois o autor a definir o que lhe parece deva ser a escola brasileira, sempre de acordo com o ambiente regional. Só com a segmentação dos latifúndios, sustenta ele, será possível o nosso verdadeiro surto educativo. O êxodo dos campos desaparecerá. A posse da terra seria capaz de anular os resíduos psíquicos da velha prevenção contra os trabalhos de amanho da lavoura.
Como retalhar os latifúndios,
uma vez que a solução russa, violenta e imprópria, ou a romaica, baseada no
consenso dos possuidores, ou a francesa, baseada na herança — não podem ser
propostas? A solução de Sud Mennucci é a
campanha pelas oportunidades de repartir a terra. Juntem-se a União, os
Estados, os Municípios, às associações particulares nesse objetivo.
"Conheço clubes comercias, escreve o autor, para inúmeros fins, que
entregam aos seus prestamistas as coisas mais disparatadas que eles possam
desejar. Nunca ouvi falar de nenhum que sorteasse glebas de terras para o estabelecimento
de uma família... Sei de homens pois que deixam avultadas quantias para aumentar
patrimônios de todos os gêneros. Nunca me constou... que alguém houvesse doado
às casas de caridade grandes lavouras, sob a condição de apurar o espólio mediante
a venda a longos prazos desses terrenos a numerosas famílias de caboclos...”
Depois o autor considera o
lema do professor: "O professor não gosta do campo, porque o campo é atrasado...
mas o campo não progride porque o professor não lhe dá o seu entusiasmo”. Se ele
foi feito para a cidade...
O sistema de Sud Mennucci para
divulgar o ensino primário Brasil é, destarte, um todo harmônico, antes social
que pedagógico, cheio de originalidade e clareza. A posse da terra, a conquista
do meio às comodidades humanas, a formação do professor são as faces mais
salientes do seu edifício. "No terreno da prática, escreve Sud Mennucci, a
primeira dádiva a conceder ao meio rural seria destruir-lhe o isolamento. Um
simples aparelho de rádio obtido das administrações públicas ou mediante subscrição
popular, colocado no ponto central do bairro, dar-lhe-á o informante minucioso
e quotidiano das coisas acontecimentos da terra, ao mesmo tempo o recreio costumeiro
dos habitantes... O rádio substitui o jornal com vantagem, — alcança a
população analfabeta, chega na mesma hora aos pontos onde os jornais levam dias
a chegar; junto com o rádio, a energia elétrica.
Sud Mennucci no seu livro,
indica, pois, de maneira realmente superior, todas as condições sociais em que
se define o problema considerado. E indica, com clareza, simplicidade, entusiasmo,
de maneira prática, soluções modernas e possíveis.”
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Revista Fon-Fon, 19 de agosto de 1933.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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