Charles Dickens: Um homem bom
Quando
a Editora Literária planejou em Moscou a publicação da coleção de trinta
volumes das obras de Charles Dickens, acreditava-se que iriam inscrever-se
200.000 pessoas. Inscreveram-se mais de 600.000! Mais de seiscentos mil
subscritores a uma edição de trinta volumes! Vale a pena pensar nisto. No mundo
moderno existem poucos literatos que escrevem sobre as transformações da vida,
sobre o terrível mal que magoa as almas humanas. Porém nem todas estas obras
são perduráveis. Só a arte em que arde a chama do amor ao homem resiste à prova
do tempo.
É
por isso que Dickens, até hoje, ocupa um lugar no coração de milhões de
leitores dos seus livros. Foi um homem que na juventude sofreu a pobreza e o
horror da arbitrariedade. Em sua alma ficou — para sempre — o ódio a toda
violência contra as pessoas, e todo o seu magnífico talento do narrador
consagrou-o em combater o mal.
Os
seus livros contam como um injusto regime social mutila as pessoas e como estas
resistem a ele; como o calor dos corações humanos derretem o gelo da crueldade
e do egoísmo. São livros que dizem: não há nada melhor no mundo que o amor ao
próximo, o desejo de fazer a vida bela e feliz, até para os mais oprimidos e
desgraçados.
Dickens
era um homem bom de verdade. Vale dizer, sabia também ser enérgico, quando via
como se torturava e atormentava as pessoas. Em seus trabalhos existem palavras
afetuosas e irritadas. Cobria de sarcasmo impiedoso aos inimigos da Humanidade,
sabia estigmatizar, com o desprezo, para sempre, aos que criavam um bem-estar à
custa da exploração, dos sofrimentos e da desgraça dos outros.
A
intolerância para com o mal é o primeiro sintoma da verdadeira nobreza. Dickens
foi um escritor desta nobreza. Porque sua cólera nunca expressava maldade. Há
escritores cujas linhas estão escritas com veneno. Dickens escrevia com o
sangue do coração. Indignava-se em nome do bem. Se há algo que se possa
reprovar a este grande escritor é talvez a sua crença ingênua em que os
exploradores e tiranos têm os corações que podem ser suavizados.
Dickens
punha sempre seus heróis ante duras provas. E os heróis as suportavam, sempre
honrados. Queria que os homens tivessem fé no triunfo do bem e tratava de
infundir a esperança nas almas humanas. Hoje os homens não só esperam, como
lutam pelo cumprimento de suas esperanças. Nesta luta os animam o calor da arte
profundamente humana de escritores como Charles Dickens.
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A.A.
Revista "Leitura", maio de 1962.
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2019)
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