7/09/2019

Ópera-cômica (Crítica), de Martins Pena



Ópera-cômica

Teatro de São Francisco

Basta analisar o gênero da ópera-cômica para não surpreender a pouca duração do seu repertório e a dificuldade de se sustentar na cena. Estas óperas não são nem uma partição segundo o valor musical da palavra, nem um drama segundo o mérito literário que se exige em uma peça de teatro. O autor e o músico, escravos um do outro, raras vezes se pode reciprocamente mostrar, a fim de que resulte vantagem real para o drama e para a música. A poucos é dado vencer esta dificuldade; e a reunião de dois gênios que se compreendam não é tão fácil de encontrar-se. Para crédito da ópera-cômica dois nomes se ajuntam, muitas vezes:

Scribe e Auber. Ninguém tem sustentado melhor este gênero que Scribe, ninguém o tem abrilhantado com mais variedade de espírito e bom gosto. Em suas obras a cena é sempre maravilhosamente compreendida, e com naturalidade se presta à música; situações engenhosas e inesperadas excitam a atenção sem a afadigar, e as agradáveis e graciosas inspirações de Auber as vem realçar e embelezar.

O público do Rio de Janeiro já por muitas vezes tem gozado as obras primorosas destes dois gênios, e ainda esta semana duas ocasiões se lhe proporcionaram, com o Domino noir e os Diamants de la Couronne, de passarem agradáveis momentos. Já dissemos como estas óperas foram executadas, já contamos o seu entrecho, não voltaremos pois a este assunto; injustiça porém seria se não repetíssemos que os atores têm continuado a merecer aplausos, e que Mlle. Duval, alma e encanto da companhia, cada vez se faz mais credora do entusiasmo público.

Passando-se a companhia lírica francesa do imundo Teatro de São Januário para o de São Francisco, deu acertado passo. Deixava um pardieiro por um teatro elegante e um diretor ainda pouco versado no gosto do país, e receoso de se entregar a gastos extraordinários, por outro bem conhecido por seus trabalhos cênicos, aptidão e ânimo de despender, como não poucas vezes tem dado provas. Dizer o que o Sr. João Caetano dos Santos é capaz de fazer em um teatro que dirige, é repetir o que todos sabem e o que a experiência tem mostrado. Só, lutando com o colosso de São Pedro de Alcântara, sem outro auxílio mais que seus próprios e incansáveis esforços, tem sabido sustentar os eu teatro com luxo e esmero, e carregar com duas companhias. Não foi o desejo de lucrar que fez com que o Sr. João Caetano tomasse sobre si a Companhia Lírica Francesa; bem sabia ele que ia se encarregar de pesada e dispendiosa tarefa; mas o desejo de tornar o seu teatro brilhante e uma nobre emulação fizeram-lhe esquecer este inconveniente, ou antes, lembrando-se dele, o quis arrastar. Estamos que todos estes sacrifícios serão compensados e reconhecidos, e que o público não abandonará o artista que tanto se esmera para lhe agradar.

Sabemos que toda a companhia está muito satisfeita com o seu novo diretor, e que entre todos reina a maior harmonia. É isto uma garantia de próspero futuro.

Uma nova ópera-cômica de grande cenário, e por conseguinte de avultadas despesas, se prepara e subirá à cena no dia 24 do corrente; queremos falar do Cavalo de Bronze. Aventurando-se o Sr. João Caetano a dar-nos uma peça de maquinismo em um teatro de tão acanhadas proporções internas, mostra que para satisfazer ao público nada receia.

O Cavalo de Bronze é uma das óperas-cômicas de mais nomeada. O seu enredo é bem conduzido e engenhoso, e a música magnífica.

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Luís Carlos Martins Pena (1815-1848)
Pesquisa: Iba Mendes (2019)

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