Quando nasceu Eça de Queirós? Onde
nasceu?
Não é indiferente o apuramento do ano
e localidade porque a sua realidade leva a conhecer a situação que atuou na
organização psíquica daquele espírito sensível, impressionista, que se
constituiu com um caráter irônico. A Povoa de Varzim, ao prestar a Eça de Queirós
em 2 de novembro de 1906 a homenagem de uma lápide na casa em que nasceu o
grande romancista, acordou o ciúme de Vila do Conde, em cuja matriz fora batizado
em 1 de dezembro de 1845. Reclama-se aí a glória de ser Vila do Conde o berço
do genial escritor, filho de mãe incógnita,
por declaração de seu pai o Dr. José Maria de Almeida Teixeira de Queirós. A
comissão da Povoa de Varzim tratou de apurar e autenticar os seus fundamentos.
Fez-se a prova completa: em carta de 1 de setembro de 1901 o Dr. Queirós, então
juiz do Supremo Tribunal de Justiça, fornecia ao Sr. Elisiário Luís Monteiro
esta informação categórica: “meu filho nasceu numa casa, onde em 1845 morava o
meu falecido parente Francisco Augusto Pereira Soromenho, empregado que então
era da fiscalização do pescado. Ignoro a rua”. Na tradição corrente, de longe
se sabia que ali, na Rua da Praça, nascera Eça de Queirós. Em data de 6 de novembro
de 1906 a mãe de Eça de Queirós, D. Carolina Augusta Eça de Queirós, escrevia ao
mesmo cavalheiro: “Venho assegurar que meu filho José Maria Eça de Queirós
nasceu na Povoa de Varzim”. Depois destas duas provas irrefragáveis, ainda acresceram
as declarações das matriculas do primeiro ao quinto ano jurídico da
Universidade de Coimbra, de 1861 a 1866, sempre com a indicação “natural da Povoa
de Varzim”.
***
Nas informações que o Dr. Queirós
prestou acerca do nascimento de seu filho, evitou determinar a data: “meu filho
nasceu em uma casa, onde em 1845 morava o meu falecido parente Francisco
Augusto Pereira Soromenho...” Na carta de sua mãe D. Carolina Augusta Pereira
d'Eça, também se alude à data ignorada. Tornava-se necessário saber a data do
seu nascimento, para a lápide comemorativa na casa da Povoa de Varzim. Adotaram
a data de 1845-1900, evitando a fixação de 25 de novembro, do termo de batizado
de 1 de dezembro, na igreja de Vila do Conde. Era impossível que uma criança
nascida em 25 de novembro de 1845, fosse levada seis dias depois à pia batismal,
no maior rigor do inverno, e na distância que vai da Povoa de Varzim a Villa do
Conde.
Na carta do Dr. Queirós, de 18 de novembro
de 1845 a D. Carolina d'Eça, escreve: “meu pai novamente recomenda a criação de
meu filho e se me oferece para mandá-lo criar no Porto, em companhia de minha família...”
— “que no assento de batismo se designe ser meu filho, sem todavia se enunciar o nome da mãe”. Tratava-se pois em 18 de novembro
de 1845 da criação da criança no Porto, em casa da família do Dr. Queirós, pois
que ela fora entregue à criação de uma pobre mulher do povo.
Este drama amoroso, esboçado no termo
de “mãe incógnita" e na data equivoca do nascimento, fixaram os críticos, adotando-se
irrefletidamente a data de 25 de novembro de 1845! O Prior de Vila do Conde
José A. Ferreira, em carta de 6 de novembro de 1906, escreveu-nos: — “Eça de Queirós
nasceu em 25/11/1845, e foi batizado em 1/12/1845, e não em 1843, como
erradamente informaram vossa excelência.” Esta afirmação tem sido repetida por
quaisquer biógrafos de Eça. O absurdo põe-se em evidencia pela exposição dos anos
em que Eça de Queirós fez os exames preparatórios para a matrícula na
Universidade. O Dr. Mendes dos Remédios enviou as datas desses exames a Rocha
Peixoto, por ocasião da polêmica da naturalidade de Queirós. Essas datas dos
exames, na hipótese de Queirós nascido em 1845, dão-nos o seguinte absurdo:
1858 — Exame de Instrução primária.
— de Francês.
— de Latinidade.
— de Filosofia.
(Com treze anos de idade (!) em 1845;
mas com 15, por ter nascido em 1845).
1859 — Exame de Oratória, com 14 anos;
mas com 16, tendo nascido em 1845.
1860 — Exame de Retórica, tendo 17 anos
(nº 1845); exame de Física.
1861 — Exame de Matemática, com 18 anos
(nº 1845).
No primeiro de outubro de 1861
matriculou-se no 1º ano de Direito com 18 anos de idade (e não com 16, só
permitido por portaria especial).
Na biografia de Eça de Queirós que
publicamos em 1878 na Renascença, página
93, começávamos:
“José Maria Eça de Queirós nasceu em
25 de novembro de 1843, na terrível época de represálias políticas entre
setembristas e cartistas. Seu pai andava então refugiado por Viana do Castelo”.
Não esclarecemos mais o caso, que nos foi comunicado, desse amor do Delegado de
Ponte do Lima, Dr. Queirós, com uma menina D. Carolina, filha do Major Eça,
residente em Viana do Castelo, e da criança nascida em casa desse seu amigo, na
Povoa de Varzim. A perseguição dos Cabralistas começou de 1842 a 1844, triunfante
em Torres Vedras e Almeida. Em fins de 1842 a março de 1843 andou o Dr. Queirós
fugido de Ponte do Lima, tendo-se refugiado nos moinhos da Quinta de Cabanas, na
estrada de Afife, pertencentes a D. Maria Emília do Rego Barreto, filha do
general Luís do Rego, e casada com o juiz Dr. Tomás de Aquino Martins da Cruz.
O fato da Dr. Queirós estar já em 1845 em Ponte do Lima, e batizar o filho em
Vila do Conde, é o resultado da pacificação feita nesse ano pelo Ministério do
Duque de Palmela.
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TEÓFILO BRAGA
TEÓFILO BRAGA
"Eça
de Queiroz: In Memoriam" (1922)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019).
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019).
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