A lenda do Tinkuã
(Rio Negro)
Um
chefe teve em outro tempo um filho que levou encantado, com a pele riscada, na
barriga de uma piraíba. Esta piraíba comia a gente que passava pelo lago. Os
tapuios diariamente punham uma criança ao velho piraíba para ele engolir e
deixar passar aqueles que iam pescar no lago.
Os
chefes viam que diariamente a gente desaparecia no lago e disseram, segundo
dizem:
—
Vamos já cortar uambé para fazer uma corda para pescar a piraíba que tem um
filho na barriga.
—
Vamos.
Foram,
depois disso, ao mato buscar uambé para fazer uma linha de pescar para puxar a
piraíba, e a isca deles foi uma criança bem bonita que atiraram no meio do
lago. A piraíba pegou no anzol que puxaram, porém, a piraíba era valente e
arrebentou a linha e fugiu. Depois um feiticeiro chamou os chefes e lhes disse:
—
Meus netos, vocês não peguem a piraíba porque ela não é boa, é coisa má, é a
alma do filho do chefe. Vocês agora façam uma linha de pescar com os cabelos de
vossas mulheres para então a pegarem.
As
mulheres imediatamente cortaram os cabelos e fizeram uma linha de pescar bem
grossa e depois puseram para isca uma criança e puxaram a velha piraíba. Os
pajés disseram-lhes:
—
Vocês a matem, abram-lhe a barriga e nela acharão um pássaro que é a alma do
filho do chefe. Vocês não o deixem fugir ou voar porque quando ele cantar: Tincuã!
Nós todos morreremos. Acharam o pássaro na barriga, mas fugiu da mão deles. O
pássaro subiu e cantou: “Tincuã! Tincuã!...”
O
céu ficou completamente escuro, a terra tremeu, o lago secou e a gente toda
morreu, e só ficou no mundo o pássaro cantando: “Tincuã! Tincuã!...”
O
pássaro feiticeiro que nós vemos hoje foi outrora o filho do chefe que estava
na barriga da piraíba.
Contam
que ele canta quando as notícias não são boas.
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Fonte:
João Barbosa Rodrigues (1842-1909):
"Poranduba amazonense" (1890)
Pesquisa: Iba Mendes (2019)
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