Os três desejos
Uma noite de inverno, estavam os
dois sentados à lareira e começaram a falar na felicidade dos seus vizinhos e
conhecidos.
— Ah! (disse a mulher), se eu
tivesse o que desejo, com certeza sabia ser mais feliz do que todos eles.
— E eu (respondeu o marido)
queria viver no tempo das Fadas, e conhecer uma que fosse tão boa que me
fizesse quanto eu lhe pedisse. Seríamos bem felizes!
Nisto, a casa toda se iluminou,
por encanto, e eles viram diante de si uma formosíssima Senhora, que lhes
disse:
— Quereis conhecer uma Fada? Pois
eu o sou. Ouvindo a vossa conversa, apeteceu-me fazer-vos o que desejardes, mas
o meu poder não vai além de três dons. Escolhei pois o que quiserdes que vos
faça, mas atendei bem que serão apenas três coisas.
E, dito isto, desapareceu. E a
casa voltou à sua luz natural.
Os dois ficaram tão atarantados
que nem sabiam o que haviam de pedir.
— Cá por mim (disse a mulher), se
me deixasses pedir, sei muito bem o que queria, pois me parece que não há nada
tão bom como ter beleza, riqueza e nobreza.
— Ora (respondeu o marido), para
que serve tudo isso, se a gente estiver doente e triste, e morrer cedo?! Acho
melhor desejar saúde, alegria e uma longa vida.
— E de que serve viver muito, se
formos pobres? Só serve para sofrer durante mais tempo. A Fada fez muito mal em
só nos dar três coisas. Devia conceder-nos, ao menos, doze, para podermos
escolher.
— Pois é verdade! Mas, como temos
tempo, pensemos esta noite o que há de ser.
Nisto, como estava frio, a mulher
pegou na tenaz para mexer o lume e disse:
— Que belas brasas! Quem nos dera
aqui um chouriço que bem o assávamos e comíamos com gosto.
Mal acabou estas palavras, cai
pela chaminé abaixo um famoso chouriço.
— Grande gulosa! (gritou o marido
desesperado). Então não faz com que perca um dom! Era bem feito que o chouriço
fosse dependurar-se no teu nariz, para castigo. — Palavras não eram ditas e o grande
chouriço a saltar para o nariz da mulher e a agarrar-se tão fortemente que não havia
forças humanas que dele o soltassem. A mulher desatou numa gritaria,
descompondo o marido e querendo por força que ele desejasse tirar-lhe aquele
feio apêndice da sua bonita cara.
— Mas se eu desejo isso (observou
ele), não temos nada mais que desejar, e acabou-se tudo quanto a Fada nos podia
fazer!
— Não me importo! O que não quero
é ter isto dependurado no meu nariz! Para que foste mau em mo mandares para
cá?!
— Mas eu vou pedir para ser muito
rico, e depois mando-te fazer uma caixinha de ouro para lá o meteres.
— Nada, não quero! Ou desejas que
fique como era, ou então desejo eu morrer.
Para que tal desgraça não
sucedesse, o homem desejou que o chouriço se despegasse do nariz da mulher. E
então ela disse-lhe, já risonha:
— Olha, homem, eu desconfio que a
Fada esteve a fazer mangação de nós. Mas deixa lá, talvez tivesse razão! Quem
sabe se seríamos felizes, escolhendo outras três coisas!...
E foram assar o chouriço, e
comeram-no com alegria e boa paz.
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Fonte:
Ana de Castro Osório: Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa (Editado a partir da edição da Bibliôtronica Portuguesa)
Fonte:
Ana de Castro Osório: Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa (Editado a partir da edição da Bibliôtronica Portuguesa)
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