6/09/2019

O Rouxinol do Imperador (Conto), de Hans Christian Andersen






O Rouxinol do Imperador

O palácio do imperador da China era uma das coisas mais bonitas que existiam no mundo. Construído em mármore branco, possuía torres de marfim, paredes revestidas com tecidos de cores variadas e quartos decorados com ouro e prata. Era realmente uma maravilha!

O jardim também era de enorme beleza; nele cresciam flores raras e belas. Havia inúmeros rios e lagos, onde nadavam peixes de todas as espécies e tamanhos.

Para além do jardim, se estendia uma mata, que chegava até o mar e no interior dela vivia um rouxinol de canto único. De sua pequenina garganta saíam melodias tão emocionantes, que faziam chorar quem as escutasse.

Turistas do mundo todo iam admirar o palácio do imperador chinês e ficavam maravilhados diante de tanta beleza. Mas, quando ouviam o canto do rouxinol, todos admitiam que aquilo sim era a coisa mais bonita e rara do grande império.

Entre os visitantes havia escritores que, ao retornar às suas pátrias, escreviam livros a respeito do prodigioso pássaro que vivia no centro da mata, próximo ao palácio imperial. E dedicavam a ele os maiores elogios, muito mais do que à maravilhosa casa do imperador chinês.

Um dia, um daqueles livros chegou às mãos do imperador. O soberano o leu e ficou, ao mesmo tempo, surpreso e enfurecido. Mandou logo chamar o primeiro-ministro.

— Incrível! No bosque que faz divisa com os jardins imperiais vive um rouxinol cujo canto é incomparável, e eu o desconheço! Tive que ler um livro estrangeiro para aprender que a maior maravilha de meu país é um pássaro de voz de ouro, e não este meu soberbo palácio! Diga-me, por que não fui informado?

— Eu também ignorava o fato, meu senhor — respondeu o primeiro-ministro, assustado com a ira do imperador. — Mas vou descobri-lo.

— E que seja muito breve. Nesta noite mesmo o rouxinol deverá cantar somente para mim.

O primeiro-ministro iniciou as buscas. Interrogou príncipes e nobres, guardas e cavaleiros. Ninguém sabia da existência de tal ave. Sem nada descobrir, o primeiro-ministro voltou ao imperador:

— Meu senhor, não se consegue encontrar o rouxinol. Talvez não exista, talvez seja apenas invenção do autor do livro.

Mas o imperador não quis explicações. Exigia o prodigioso rouxinol! Ou naquela noite o rouxinol cantava para a corte, ou o primeiro-ministro seria punido.

O pobre homem recomeçou a percorrer ruas e praças, perguntando a todos sobre o tal pássaro.

Por fim, encontrou na cozinha imperial uma serviçal que comentou:

— O rouxinol... Conheço-o, sim. Às vezes, à noite, paro no bosque para ouvir seu canto maravilhoso. Tem uma voz tão bela e harmoniosa, que chego a chorar de emoção.

— Poderia me ajudar a procurá-lo?

— Claro que sim, Excelência.

Imediatamente, ele mandou organizar uma comitiva de cavaleiros e cortesãos para, sob orientação da serviçal, ir procurar o rouxinol na mata.

Estavam andando já há algum tempo, quando se ouviu um mugido. Os cavaleiros pararam, curiosos.

— Deve ser o rouxinol cantando. Que voz agradável!

— Esse foi o mugido de uma vaca — riu a mulher. O rouxinol vive mais longe.

Após longa caminhada, a serviçal parou em frente a uma árvore e mostrou uma ave minúscula, de plumas acastanhadas, que saltitava entre os galhos.

— Ali está, aquele é o rouxinol, o pássaro de canto comovente.

O primeiro-ministro e seu séquito ficaram desapontados com o aspecto modesto do rouxinol. Nem de longe sua aparência era comparável à beleza do palácio. Porém, quando escutaram sua voz, todos ficaram encantados. E convidaram-no para ir à corte.

O rouxinol aceitou o convite.

Foram feitos grandes preparativos para sua chegada: flores por toda parte, assoalhos encerados e brilhantes, e uma gaiola toda de ouro, no meio da sala do trono, para o pequeno e ilustre cantor. Sentado no trono, o imperador aguardava com impaciência o momento em que escutaria as maravilhosas melodias que todos comentavam.

Assim que chegou, o rouxinol pousou sobre a gaiola, olhou com respeito o ilustre anfitrião — o imperador da China — e começou a cantar. Seu canto era tão comovente que o imperador chorou, emocionado. Terminado o concerto, ele disse para o rouxinol:

— Fique comigo para sempre, para minha felicidade. Em troca, terá tudo que pedir, tudo que mais o agradar! Tudo que quiser.

— Majestade — respondeu o passarinho. — Enquanto eu cantava, vi lágrimas em seus olhos. Isto, para mim, é a recompensa maior, não peço mais nada. Se Vossa Majestade assim o deseja, estou pronto para abandonar a mata e alegrar sua vida com minha voz, sempre que quiser.

E assim, o rouxinol ficou no palácio, abrigado na gaiola de ouro pendurada nos aposentos do imperador.

Cantava frequentemente para seu amo e uma vez por dia dava um passeio no jardim — mas preso pela patinha a um fio de seda conduzido pelo primeiro-ministro.

Um dia, o imperador da China recebeu um presente de seu amigo, o imperador do Japão: um maravilhoso rouxinol mecânico, todo de ouro. Suas asas eram enfeitadas com diamantes, a cauda exibia safiras e os olhos de rubis.

Bastava girar uma pequena chave, e o rouxinol mecânico cantava uma linda melodia.

Porém, o rouxinol verdadeiro cantava com o coração e o outro, com molas e cilindros de aço. As duas vozes não combinavam, e o imperador se aborreceu:

— Que o rouxinol mecânico cante sozinho! — ordenou.

Trinta vezes seguidas o belo brinquedo repetiu a mesma melodia sem mudar uma nota sequer, entre aplausos e elogios da corte que o ouvia.

Na trigésima primeira apresentação o imperador disse que já era o bastante.

— E agora, que cante o rouxinol verdadeiro! — ordenou.

Mas o passarinho não foi encontrado. Aproveitando-se do descuido geral, tinha voado pela janela aberta em direção à mata, onde sempre vivera em total liberdade. Mas o imperador não ficou triste, pois afinal estava satisfeito com o rouxinol mecânico.

Para que todos os súditos admirassem seu rouxinol, permitiu um espetáculo público. Muitos se deslumbraram. Mas quem já ouvira a voz do rouxinol verdadeiro, na mata, não se convenceu:

— Há enorme diferença entre os dois...

Não importava a opinião dos outros. O imperador, a cada dia que passava, ficava mais animado com aquele extraordinário brinquedo. O aparelhinho repousava em uma almofada de seda, ao lado da cama do soberano, que a cada momento lhe dava corda, contente com aquele canto sempre igual.

Certa noite, o delicado mecanismo se rompeu, produzindo um ruído estranho. O imperador mandou chamar um experiente relojoeiro, que encontrou uma mola quebrada e trocou-a.

Mas avisou ao imperador que o mecanismo já estava bem gasto, e que o rouxinol mecânico só poderia cantar uma vez por ano, para evitar que quebrasse definitivamente.

O imperador ficou muito triste com isso, mas foi obrigado a seguir o conselho do relojoeiro.

Passaram-se os anos, e um dia o imperador adoeceu gravemente. Repousava entre seus lençóis de cetim e as cobertas de seda bordadas mas, apesar de tanto luxo, estava só.

Nobres e ministros discutiam a sucessão ao trono, médicos pesquisavam novos remédios para receitar ao ilustre doente, a criadagem dormia. Ninguém fazia companhia ao enfermo.

Em certo momento, o imperador abriu os olhos e viu a Morte sentada a seu lado, em seu assustador manto negro, encarando-o silenciosamente. Entendeu que chegara sua última hora, e então se virou para o rouxinol mecânico e sussurrou:

— Cante, suplico-lhe. Cante, quero escutar sua voz mais uma vez, antes de morrer.

Mas o rouxinol permaneceu calado. Não havia ninguém que lhe desse corda, e ele, sozinho, não podia cantar.

De repente, uma melodia muito doce, enternecedora ressoou nos aposentos. No parapeito da janela, estava o rouxinol verdadeiro. O passarinho soubera da morte inevitável do imperador e viera trazer-lhe seu consolo musical, ainda que sem ouro, brilhantes, safiras e rubis.

A Morte também se pôs a escutar aquele doce canto e, quando o rouxinol se calou, pediu para que continuasse. A música se espalhou pelo amplo aposento e, a cada nota, o imperador se sentia melhor. Enquanto isso, dona Morte foi se afastando devagar.

— Repouse, agora, Majestade — disse com carinho o rouxinol. — Amanhã acordará curado.

E ficou ali, com seus gorjeios, entoando uma suave canção de ninar.

No dia seguinte, ao despertar, o imperador se sentia bem e se levantou. O rouxinol ainda estava no parapeito da janela.

— Meu salvador! — disse-lhe o imperador. — Fui ingrato com você, ao preferir o rouxinol mecânico. Mas agora pretendo me desculpar. Vou destruir aquele tolo brinquedo, se quiser, mas peço-lhe que nunca mais me abandone.

— Não me peça isso — respondeu o rouxinol. — Vou ficar com muito gosto junto de Vossa Majestade, mas com a condição de não me prender mais na gaiola. Deixe-me livre, permita que eu viva nos bosques. Virei cantar sempre que quiser, e também lhe contarei tudo o que vejo no seu império. Assim, saberá das injustiças que devem ser punidas, e das boas ações que merecem ser recompensadas. Seu povo poderá ser bem mais feliz.

O imperador concordou, e o rouxinol foi embora. Mais tarde, na hora em que os cortesãos, médicos e empregados entraram no aposento do doente, temendo encontrá-lo morto, viram-no em pé, alegre, feliz e bem-disposto. E nunca souberam, nem sequer imaginaram, o motivo de tal prodígio.


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Fonte:
"Contos tradicionais, fábulas, lendas e mitos": Ministério da Educação - Fundescola - Projeto Nordeste - Secretaria de Ensino Fundamental. Brasília, 2000 - Volume 2. (A imagem que acompanha o texto, não se inclui na referida obra).

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