O franganito
Era uma vez um Franganito muito
esperto e engraçado, que, andando a esgravatar num monturo, achou uma
guedelhinha de lã.
Foi a correr, a correr, levá-la a
um alfaiate para que lhe fizesse uns calçotes, uns mangotes e uns corpitotes.
Assim vestido como uma grande personagem, pôs-se a caminho do Palácio real,
para ver o senhor Rei.
No meio da jornada encontrou um Texugo,
que lhe disse:
— Ai, Franganito, que te como
agora!
— Não me comas, que eu vou ver o
senhor Rei, e em vindo te contarei.
— Ah, sim?! Pois também eu quero
ir.
— Então mete-te aqui no meu
papinho.
Continuou a andar, a andar, e
mais adiante encontrou duas pedras a baterem uma na outra, que lhe disseram:
— Ai, Franganito, que te
esmagamos!
— Não me esmaguem, que eu vou ver
o senhor Rei, e em vindo vos contarei.
— Ah, sim?! Pois também nós
queremos ir.
— Então saltem para o meu
papinho.
As pedras lá se encaixaram, ao pé
do Texugo, e o Franganito continuou a andar até que esbarrou com um ribeiro,
que lhe disse:
— Ai, Franganito, que te afogo!
— Não me afogues, que eu vou ver
o senhor Rei, e em vindo te contarei.
— Pois também eu quero ir.
— Então mete-te aqui no meu
papinho. O ribeiro meteu-se no papinho do
Franganito, que muito lépido se
dirigia ao Palácio real.
Mais adiante encontrou um mestre
lobo,
que lhe disse, arreganhando os
dentes:
— Ai, Franganito, agora te engulo
eu!
— Não me engulas que eu vou ver o
senhor Rei, e em vindo te contarei.
— Ah, sim?! Pois também eu quero
ir.
— Então mete-te aqui no meu
papinho. O lobo saltou para o papo do Franganito, e ele continuou alegremente a
sua viagem. Chegando ao Paço dirigiu-se aos guardas com um ar muito importante,
dizendo que fossem anunciá-lo a Sua Majestade, pois certamente seria logo
recebido.
Eles desataram a rir e
agarraram-no sem cerimônia, indo apresentá-lo ao Rei. Este achou-lhe graça e,
depois de lhe fazer muita festa, mandou-o meter na capoeira.
Ora o Franganito não gostou da
sem-cerimônia, pois esperava ficar como cortesão, e logo que se viu na
capoeira, como qualquer vulgar pessoa da sua classe, disse ao texugo que lhe
saísse do papo e comesse a criação toda. O texugo, se bem lho mandaram melhor o
fez. Não deixou senão o amigo Franganito, que saltava de poleiro em poleiro,
como único senhor da casa.
Ao outro dia, quando os
cozinheiros vinham buscar galinhas para o almoço, não encontraram nada e foram
a correr dizer ao Rei que o Franganito tinha comido tudo.
O Rei ficou muito zangado, e
mandou-o meter na adega onde guardavam o vinho em grandes talhas de barro.
O Franganito, mal se viu fechado,
mandou sair as pedras que tinha guardado no buxo, e quebrou as talhas todas, de
modo que o vinho corria pelo chão como se fosse um rio.
Os criados que foram buscar vinho
para a mesa, viram o desastre e foram a correr dizer ao Rei do desatino do
Franganito.
O Rei, já muito enfadado, disse
que o metessem na cavalariça a ver se algum cavalo o pisava durante a noite.
Mal se viu entre aqueles animais
tão pouco da sua igualha, disse o Franganito para o lobo que lhe saísse do papo
e os matasse a todos. Ora, foi o que o lobo quis ouvir. De manhã não vivia um
para contar o que se passara.
Quando os criados, no dia
seguinte, vieram buscar os cavalos que costumavam levar o Rei a passeio, deram
com a mortandade, e foram fazer queixa do pinto calçudo ao seu Real Amo.
Desta vez, desesperado, o Rei deu
ordem para que metessem o atrevido no forno que estava aceso para cozer o pão.
Ora o Franganito, logo que sentiu
o calor nos pezinhos, disse ao ribeiro que saísse e apagasse o lume. O ribeiro
assim fez e, começando a correr, em breve alagou tudo.
Quando os criados vieram para
cozer o pão, viram o forno encharcado e o Franganito sacudindo as asas e
cantando:
— Qui-que-ri-qui!!...
Qui-que-ri-qui!...
Os criados foram a correr contar
o caso ao Rei que, temendo que fosse feitiçaria, deu dinheiro ao Franganito
para lhe abandonar a porta.
O espertalhão pegou no dinheiro,
foi para o campo, comprou uma casa, e ali viveu com a sua família até morrer,
já galo velho, com inúmeros netos que o prantearam sinceramente.
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Fonte:
Ana De Castro Osório: “Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa” (editado a partir da edição da Bibliotrônica Portuguesa)
Fonte:
Ana De Castro Osório: “Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa” (editado a partir da edição da Bibliotrônica Portuguesa)
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