O falso testemunho da Lua
No princípio do Mundo, antes de
haver homens, Deus Todo-Poderoso, desejando ver de perto a obra que criara,
desceu da Sua cadeira de ouro, no mais alto dos Céus, e veio à Terra,
deitar-lhe a bênção.
Lúcifer, que era o mais belo dos
Anjos, e também o mais forte e orgulhoso, ao ver sem Deus o trono celestial,
encheu-se de soberba, e nele foi sentar-se com toda a majestade, fazendo-se
adorar por muitos Anjos que perderam a lembrança do que deviam ao Senhor.
Quando, após o seu passeio pela
Terra, e satisfeito com a Sua obra, Deus-Pai regressou às alturas e quis
sentar-se no trono de onde tudo criara e governava, encontrou-o ocupado por
aquele Anjo mau.
Deus Nosso Senhor não quis logo
usar do seu poder. Sem olhar a tão grande falta de respeito, disse, com
bondade:
— Levanta-te, Lúcifer, que esse
lugar não te pertence.
— Quem está bem deixa-se estar
(respondeu o rebelde).
— Levanta-te, Lúcifer, que esse
lugar não te pertence (tornou o Senhor, já com voz de quem ordena!)
— Quem está bem deixa-se estar!
E, voltando-se para o Sol, que
parecia admirado com tanta audácia, Lúcifer perguntou-lhe:
— Não é verdade, ó Sol, que quem
está bem se deixa estar?
— Não deixa, se o lugar lhe não
pertence. E essa cadeira é o Trono do Senhor de todos os Astros!
Assim respondeu o Sol,
confessando o Criador.
Lúcifer voltou-se, então, para o
Vento, que parara a ver a contenda entre o Pai do Céu e o Anjo rebelde, e
perguntou-lhe:
— Não é verdade, ó Vento, que
quem está bem se deixa estar?
— Não deixa, se o lugar lhe não
pertence. E esse Trono é só do Senhor das terras e das águas, da calma e das
tempestades!
Assim respondeu o Vento, em nome
de toda a Terra.
Mas o Anjo soberbo não quis
submeter-se, nem depois de ouvir os testemunhos da verdade. Voltou-se para a
Lua, que sorria, e perguntou-lhe:
— Não é verdade, ó Lua, que quem
está bem se deixa estar?
E a Lua respondeu com palavras
enganosas:
— Deixa. E fará seu o lugar que
não estava ocupado!
Então Deus Nosso Senhor abriu o
coração à Justiça eterna, e fechou-o à Bondade e ao Perdão, e, com todo o Seu
poder, fulminou o Anjo Mau. Este foi de repente arrancado ao Trono Divino, que
não lhe pertencia, e lançado fora dos Céus.
Com Lúcifer caíram, durante o
espaço de uma lua, os Anjos que lhe obedeceram e se revoltaram contra o Senhor.
E todos vieram padecer a merecida pena sobre a Terra e nos Infernos.
E para castigo do falso
testemunho da Lua, também Deus a condenou a não ter luz própria e a só viver e
brilhar da luz que lhe empresta o Sol.
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Fonte:
Ana de Castro Osório: Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa (Editado a partir da edição da Bibliotrônica Portuguesa)
Ana de Castro Osório: Contos, fábulas, facécias e exemplos da tradição popular portuguesa (Editado a partir da edição da Bibliotrônica Portuguesa)
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