As espigas dos cereais foram sempre o símbolo da abundância, e a do
milho, pela cor dourada da semente era mais particularmente o símbolo da
riqueza.
Na África, entre os nativos, a espiga do milho representa a propriedade
do solo.
Conta o Dr. Schweinfurt, num dos seus livros de viagens, que na África,
as tribos depois da respectiva declaração de guerra, colocam no extremo dos
seus domínios, em local bem exposto, de modo a poder facilmente ser visto por
todos, uma espiga de milho, uma molhada de penas de ave e uma flecha, o que
quer significar que quem cortar uma espiga de milho ou agarrar uma ave, será
morto por uma flecha.
Na Calábria há a seguinte e graciosíssima lenda relativa ao milho, que
segundo Gubernatis não é mais do que uma variante, sob forma moderna, do
antigo conto mitológico de Midas que mudava em ouro todo o trigo que tocava.
Uma mãe tinha sete filhas, seis muito diligentes e cuidadosas e a sétima
preguiçosa em extremo. Eram todas tecedeiras, mas a mais nova, formosa entre as
formosas, passava o tempo a tratar da sua pessoa e a confeccionar belos vestidos
em vez de cuidar das suas obrigações caseiras.
Um domingo as irmãs mais velhas foram à missa e deixaram a coser sob a
vigilância da mais nova sete pães de milho. Como se demorassem a mais nova foi
comendo um a um os pães, de modo que quando as irmãs regressaram da igreja não
restava nenhum.
As irmãs faltando-lhe o almoço fizeram tal barulho que teve de intervir
para as apaziguar um dos mais ricos mercadores da cidade que naquele momento
passava por acaso na rua.
As irmãs falando todas ao mesmo tempo dizem-lhe que a mais nova comia
por sete, mas o homem compreendendo que o barulho era motivado por inveja das
outras irmãs e que a rapariga fiava por sete, tratou logo de se casar com ela.
Realizado o casamento o negociante partiu para longa viagem deixando à mulher,
como tarefa, um grande quarto cheio de linho para fiar.
Estava prestes o regresso do negociante e a mulher ainda não tinha fiado
nada. Por mais que quisesse não o podia fazer, e as irmãs jubilosas riam e
troçavam-na, contentes por calcularem que o marido logo que chegasse não
deixaria de lhe castigar severamente a preguiça.
A pobre rapariga chorava, chorava, pretendendo debalde fiar o linho
mesmo com lágrimas, mas nada, nada obtinha.
Um dia que estava à janela a lastimar a sua sorte passaram umas boas
fadas que, compadecendo-se da infeliz, lhe disseram que ao fiar, em lugar de
passar os dedos pelos lábios, os passasse por farinha de milho.
A fiandeira assim fez, e daí por diante, com grande júbilo, não só podia
fiar quanto queria mas também o fio, ao contato da farinha de milho,
transformava-se logo em rico fio de puro ouro.
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Eduardo Sequeira
- (Lenda dos Vegetais, 1892)
Pesquisa e
adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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