É assaz conhecido o emprego nupcial das flores de laranjeira, como
emblema da castidade, da pureza absoluta e completa.
Este vegetal é celebrado desde tempos imemoriais, não só pelo aroma sem
rival das suas formosas flores, mas também pelos seus belos e deliciosos frutos.
Gubernatis escreve o seguinte relativamente à laranjeira:
"Nos contos populares piemonteses, o reino por excelência, o reino
rico, maravilhoso, é o reino de Portugal; e no Piemonte chamam
sempre portogalloti às laranjas. Portugal é a região mais ocidental
da Europa; no céu, é também no extremo ocidente, onde o sol se esconde, que
acreditam estar situado o reino dos bem-aventurados, o paraíso. Foi também no
extremo ocidente que Herácles descobriu o jardim das Hespérides com a árvore de
frutos de ouro. Por isso assim como o Portugal, a região ocidental, o paraíso e
o jardim das Hespérides são no mito, um mesmo e único recanto da "país", assim também a laranja, o portogaloto e a
maçã das Hespérides, são na linguagem mítica um único e mesmo fruto. Os gregos
como os piemonteses, chamam às laranjas πορτογαλιά os
albaneses protokale e os próprios curdos portoghal.
Como explicar tal denominação? Será por que as laranjas são melhores e
mais abundantes em Portugal do que em qualquer outra parte? Não, mas é porque
foi de Portugal que a cultura da laranjeira se propagou na Europa.
O jesuíta Le Comte, que viveu muitos anos na China, na segunda edição
das suas Nouveaux mémoires sur l'état présent de la Chine, dá-nos a
seguinte e curiosa informação: "Chamam-lhe em França laranjas da China,
porque as que vimos pela primeira vez tinham sido trazidas dali. A primeira e
única laranjeira da qual dizem provieram todas, existe ainda em Lisboa na casa
do conde de São Lourenço; é aos portugueses que devemos um fruto tão excelente".
A longa e angustiosa peregrinação da Virgem para fugir com o divino
filho aos que o queriam assassinar deu origem a grande numero de lendas, muitas
das quais se referem aos vegetais, pertencendo a esse numero a que apresentamos
relativa à laranjeira.
A sagrada família veio descansar uma tarde à sombra de uma laranjeira
guardada por um cego. A Virgem pediu ao cego uma laranja para dar ao filho e
aquele respondeu-lhe que colhesse quantas quisesse pois todas eram dela. Então
a Virgem colheu três, uma para o Cristo, outra para si e a terceira para São
José. E em paga da caridade do cego restituiu-lhe a vista.
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Eduardo Sequeira
- (Lenda dos Vegetais, 1892)
Pesquisa e
adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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