Segundo reza
a tradição fielmente conservada através centenas e centenas de gerações, nunca
houve nas ilhas do Sol Nascente princesa mais sedutoramente formosa do que a
companheira bem-amada do príncipe Yoshimitsu.
Pintor algum
por mais talento que possua, não será nunca capaz de, com as cores mais finas e
custosas, criar imagem mais graciosa do que a da bela japonesa.
Ela era mais
fresca que as alvoradas, mais alegre que as searas maduras, mais formosa que o
sol e mais sábia que o mais sábio bonzo.
A justiça
vacilava em dar sentença em negócio intrincado, dois esposos desarmonizavam-se,
pleiteavam vizinhos em encarniçada questão que nada parecia poder sanar, era só
fazer a princesa Touki Bouki sabedora do caso e ela tudo resolvia com a mais
imparcial justiça, tudo aplanava e, o que mais era digno de nota, a contento de
ambas as partes que ficavam abençoando a Providência das ilhas do Sol Nascente,
a boa, a doce, a justa e a santa princesa Touki Bouki.
Por isso
todo o mundo a adorava, todos a bendiziam desde o miserável habitante das
tristes choupanas até ao opulento morador dos labirínticos palácios construídos
de porcelana e forrados de custosa seda de mil cores diversas.
Um dia porém
o império onde só parecia residir a felicidade foi assolado por um terrível
flagelo, uma medonha peste que dizimou espantosamente a população. Tudo era
dor, lágrimas e luto.
A gente
aterrada, perdia a cabeça e a nada atendia. Aglomerava-se ante os templos,
pedindo aos deuses, em altos gritos, o termo da praga cruel para que não sabiam
remédio.
Quem lhes
valeu porém no aflitivo transe foi a boa princesa Touki Bouki. Corria de casa
em casa tratando dos doentes, amortalhando os mortos de quem todos fugiam com
horror, tomando conta dos pobres órfãos abandonados, consolando e animando os
tristes. E a sua popularidade cresceu tão espantosamente que, quando aparecia,
todos se lhe lançavam aos pés, e era adorada com fanatismo, como nenhum Deus
até então o fora.
Mas —
crueldade da sorte! — quando a peste terminava, quando já todos, aplacado o
pavor, rendiam graças ao céu por terem escapado ao mal dizimador, a princesa
atacada pela doença cruel que desbastara o seu povo estremecido, foi
instantaneamente arrebatada pela morte, como se esta receasse que demorando-se
alguns minutos o amor dos súditos lhe não deixasse empolgar a bela presa
preciosa.
Então o luto
foi geral, e todos, velhos e novos, choravam doidamente a perda da sua bondosa
protetora, da sua amiga, da sua providência, do seu bem.
O enterro da
santa princesa foi a coisa mais maravilhosa que sonhar-se pôde. Toda a nação a
acompanhou até junto da sepultura aberta no centro de um extenso e alegre campo
de arroz.
Poucos dias
depois — caso estranho! — o local onde jazia o corpo da gentil princesa
assinalava-se por uma profusão de flores estranhas, desconhecidas de todos, que
espontaneamente brotaram do solo, com as pétalas graciosamente encaracoladas
como o fora o cabelo da morta gentil, e de mil coloridos diversos desde o negro
como os seus olhos negros, vermelho tão vivo como o que em vida lhe tingia os
lábios, e amarelo intenso como o oiro dos seus cabelos até ao branco impecável
da sua alma puríssima.
De toda a
parte, desde os mais remotos confins do império, o povo, celebrando o milagre,
corria a visitar o túmulo milagroso para colher hastes das plantas sagradas que
se tornaram logo as prediletas de todos, espalhando-se rapidamente por todo o
país.
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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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