A lenda da Chicória
Chicória era uma princesa tão
formosa, que todos os homens ao vê-la ficavam para sempre perdidos de amores.
Dourara-lhe o sol os cabelos mais finos que a mais fina seda, o céu
emprestara-lhe aos olhos o seu doce azul, e a neve, a branca neve das
montanhas, tinha inveja à puríssima alvura da sua cútis.
Era um encanto.
O rei, seu pai, que a estremecia
doidamente, satisfazia-lhe todos os caprichos, todos os desejos, de modo que o
viver de Chicória deslizava entre afagos e desejos satisfeitos, numa completa e
intensa felicidade.
Porém um dia o amor tudo transtornou.
Um belo trovador, um daqueles
gentis boêmios que percorriam o mundo de lira no braço, deixando um rasto de
paixões no caminho percorrido, chegou ao palácio, onde foi recebido com todo o
carinho que então se dispensava ao seguro depositário das antigas tradições
guerreiras e das castas e belas lendas d'amor.
Berengère se chamava ele, e nunca
até então viera ao palácio real quem melhor soubesse dedilhar a lira, soltar ao
vento os magoados queixumes duma alma amorosa ou atingir o ápice do entusiasmo
na narrativa dos feitos audazes dos valentes guerreiros imortalizados em
campanhas feramente medonhas.
Chicória amou-o perdidamente, e
costumada a satisfazer todos os caprichos, pediu ao pai que a casasse com o
trovador. O rei, que nada recusava à filha, acedeu constrangido, mas o belo
trovador, que não queria perder a estremecida liberdade que tantas várias
aventuras galantes lhe proporcionava e tantos constantes prazeres seguros lhe
dava, ao saber dos desejos da formosa princesa fugiu do palácio para nunca mais
voltar.
A alegria de Chicória desapareceu
desde então para sempre. Passava os dias sentada no varandim do palácio olhando
pela estrada além a ver se o trovador, condoído do seu profundo amor, voltava
arrependido, trazendo-lhe a ventura perdida.
Mas debalde esperou.
Veio o inverno, e de sempre olhar
fixamente para os caminhos cobertos de neve, pouco a pouco desapareceu-lhe a
luz dos olhos...
Então, não podendo resistir a
este último golpe, a princesa morreu de paixão.
Sepultaram-na perto do palácio, à
beira da estrada, num local por ela designado, voltada para o sitio donde
sempre esperara o regresso do amante; pouco tempo depois, da sepultura da
gentil donzela morta de amor, brotaram as plantas que lhe conservam o nome, e
que dão uma flor que pelo belo azul que a tinge faz recordar os castos olhos da
candidíssima princesa.
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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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