Os
sete encantados
Havia uma rapariga, que morava com sua
avó, e esta a mandou vender três vinténs de linhas. A netinha foi e entrou num palácio
e viu em cima de uma mesa três vinténs; deixou lá ficar as linhas, e quando ia
para sair achou as portas todas fechadas. Ela lá ficou, e como era cuidadosa
fez as camas, arranjou os quartos, pôs tudo em ordem. À noite entraram sete
encantados, e ela com medo escondeu-se. Disseram eles:
— Quem tanto bem nos fez, se for homem
será nosso irmão, e se for mulher havemos de estimá-la como irmã.
Disseram isto muitas noites a fio, até
que por fim um deles disse:
— O que eu queria era quem me lavasse a
cabeça.
A menina nessa noite lavou a cabeça a
seis Encantados. O a quem ela não lavou a cabeça não quis dormir, mas fingiu
que dormia e estava acordado. Vai ela lavar-lhe a cabeça, e o encantado
pegou-lhe por um pulso. A menina começa a gritar com susto, e os outros
encantados acordaram, viram-na, e prometeram-lhe que nunca lhe fariam mal e que
só queriam o seu bem. Dali por diante nunca mais ela se escondeu dos
Encantados, que lhe apareciam sempre.
Ao fim de certo tempo, um rei que morava
defronte e era solteiro, e ainda tinha a mãe viva, que governava, falou-lhe em
casamento; ela lhe respondeu que havia de primeiro dizê-lo aos Encantados.
Assim fez; eles lhe disseram que casasse com o rei, mas que o não deixasse
tocar-lhe sem que dissesse primeiro: “Pelos sete príncipes encantados.” Ela
assim o prometeu.
Casou; quando o príncipe ia para abraçá-la,
ela começou a dar gritos, e a fugir. O príncipe muito zangado mandou-a meter
num quarto com uma criada para a servir, e nada lhe faltava, mas foi casando
com outra princesa. A criada veio cá abaixo e disse à princesa com quem o príncipe
casara segunda vez:
— Vossa alteza não sabe? aquela senhora
que está fechada, corta a cabeça e penteia-se no regaço, e depois torna-a a pôr
no seu lugar.
A princesa, para não ficar atrás da
outra quis fazer o mesmo, cortou a cabeça, mas morreu logo. O príncipe ficou
muito triste, e pôs a criada na rua. Casou com outra princesa; passados dias
vem outra criada e diz-lhe:
— Vossa alteza não sabe? Aquela senhora
que está fechada lá em cima, quando está fiando e lhe cai o fuso, corta a mão
que o vai apanhar ao chão, e torna a ficar no seu lagar.
A terceira esposa quis fazer o mesmo,
mas a mão gangrenou-lhe e passados dias morreu. O príncipe pôs a criada na rua,
e foi ter com a menina que tinha fechada, e assim que ia tocá-la, ela começava
aos gritos, que tremia o palácio.
Foi o príncipe muito aflito ter com a
rainha, que lhe disse:
— Filho, pede pelos sete príncipes
encantados, a ver o que ela te diz.
Ele assim fez, e nunca mais achou dificuldades;
dizendo-lhe a esposa:
— Aqui me tens, porque já soubeste falar.
E os sete príncipes desencantaram-se.
(Ilha de São Miguel)
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Pesquisa
e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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