O Poeta do Paço
Quando a festa oficial ia
terminar, organizada pela Câmara da cidade do Rio Grande, que o Imperador
visitava, acompanhando o desenrolar da guerra no Sul, contra, o Paraguai, um menino
recitou-lhe, após romper a massa do povo, uns versos dedicados ao Monarca,
dizendo ao terminá-los:
— “Fui eu quem os fez!"
E pode-se acrescentar que desse
momento em diante é que se tornou notável a existência de Múcio Teixeira.
D. Pedro II beijou-o, mal
contendo as lágrimas, diz o historiador.
Mais tarde, publicadas aos quinze
anos suas primeiras poesias, uma poetisa pediu numa apresentação, que o escritor
Carlos Ferreira, depois de ler os escritos do apresentado, o fizesse conhecido
nos meios espirituais do Rio; Carlos Ferreira dividiu o pedido com Fagundes
Varela, e ambos trouxeram, pela imprensa, Múcio Teixeira à atenção dos intelectuais
ali residentes.
Nascera a 13 de setembro de 1857,
na capital rio-grandense e até 1864 deixou-se ficar no sul do país.
Na Escola Militar do Estado
natal, tantas fez, em companhia do príncipe D. Felipe, que se incompatibilizou
com a carreira das armas, com aquela vida de disciplinas que não lhe consentia
recitar em festa pública versos aos heróis da Inconfidência, aventura de que
lhe adveio o ser preso...
Poeta revolucionário, autor teatral,
foi como se caracterizou sua mocidade. Mais tarde, quando o Imperador houvesse
de chamá-lo ao paço, dando-lhe aposentos em palácio, jamais se haveriam de
esquecer seus inimigos dessa fase primeira em que tanto clamou contra o altar,
querendo derrubar o trono, coisas que propositadamente iriam causar susto ao
maldoso Laet...
Em 73, publicara as "Vozes
Trêmulas". Para um moço de quinze anos, a ninguém pareceu que elas não
tivessem de ecoar no porvir.
Não é de espantar que o menino de
seis anos, que atravessara dificultosamente uma multidão para receber o beijo
imperial, menos de dez anos mais tarde, adolescente, fosse clamar pela
República. Pois Múcio, como notou Romero de outra forma, teve sempre em vista
duas coisas: a "época" e o "meio".
Ninguém esquecerá, por certo —
faço então observar — que o meio fervilhava. A época era de revolta de alguns,
todos esses sendo jornalistas e poetas moços; os primeiros em busca de
popularidade, os segundos — de novas sensações.
Mais tarde, conhecendo de perto
essa figura nobre de estudioso e bom que foi Pedro II, com quem passou a lidar
e a quem estimou como poucos, procurando corresponder com gratidão e simpatia
aos benefícios dele recebidos, esqueceu aquelas revoltas, talvez mais poéticas
que sinceras, e que eram uma espécie de "tento" que as inteligências
moças pagavam para poderem entrar no jogo intelectual do tempo e conseguir
popularidade.
Muitos dos que combatiam o trono,
desses a que me refiro, pasmaram, como pasmou a nação brasileira toda, diante
de um 15 de Novembro de 1889... A maioria levou muito tempo a acreditar no fato.
Quase todos, calando a franqueza do pulsar íntimo, aplaudiram a vitória — porque
haviam instigado as fileiras — ainda que regularmente desconhecendo os heróis...
Aos vinte e dois anos, Múcio era
autor de dezesseis obras publicadas e depois secretário do governo espírito-santense.
Aos vinte e três agitou em torno de seu nome campanha política no Rio Grande; mas
voltou à cidade de Vitória.
— Já nos "Novos Ideais",
aparecia no poeta o cultor da filosofia, em "Interrogação Eterna'':
Donde saímos nós?... Da sombra do Mistério...
Aonde vamos? não sei; a cruz do cemitério
Pode ser uma porta aberta à eterna vida.
Mas pode ser também uma barreira erguida
Entre a luz e a treva.
LUÍS PAULA FREITAS
Ilustração Brasileira, agosto de 1928.
Pesquisa e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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