2/26/2019

O Jogador (Conto), de Leon Tolstoi


O Jogador

Era meia-noite quando abandonou a mesa do jogo. Tinha perdido sua fortuna. Instintivamente tomou o caminho de casa. Sua cabeça ardia. Caía-lhe no cérebro um peso enorme. E pensou na família: sua mulherzinha que a essa hora devia esperá-lo gemendo de frio e de medo ao lado do berço de seu filho adormecido.

— Que lhe direi?

O céu coberto de estrelas resplandecia indiferente sobre sua pálida fronte. De vez em quando, um tresnoitado, com a gola do gibão erguida até às orelhas, passava apressadamente ao seu lado, olhando-o com desconfiança.

E o miserável voltava o rosto com medo de ser conhecido, de que lessem em sua fisionomia a infâmia que cometera.

Chegou com mão trêmula, meteu a chave na fechadura e tremeu ao ouvir o ruído dos gonzos que gemiam.

A voz do remorso gritou nesse momento em sua consciência. Sentiu como que um punhal lhe atravessar as entranhas.

— És tu?

E dois braços o apertaram, e os lábios beijaram seus lábios.

— Olha! É uma coisa horrível. Estava pensando que tinhas perdido tudo, que já não tínhamos onde colocar o berço do nosso filho. Que loucura! É verdade?...

 E ela dizia tudo aquilo com os olhos fitos nos seus, apertando-lhe as mãos, feliz por tê-lo a seu lado.

— E se fosse certo?

Disse-o num tom frio, seco como quem, conhecendo sua falta, pretende evitar o castigo, fazendo sentir a superioridade de suas forças materiais.

E ela ficou com os olhos muitos abertos, quase espantada.

Por que misterioso pressentimento lhe dissera a verdade o coração?

— Que importa? Uma mãe sempre acha com que alimentar seu filho — disse ela com uma das mãos apoiada ao berço.

E via tal majestade em sua postura, tão corajosa altivez em seu olhar, que o miserável, caindo de joelhos:

— Perdão — gritou banhado em lágrimas.

Desde esse dia, Nicolau Tomás foi o melhor dos esposos e o mais honrado dos homens.

Vencido pela virtude de uma mãe, a mãe de seu filho, não quis ser inferior a ela; e, artífice infatigável no trabalho, recuperou com fartura a fortuna que havia perdido.

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A Alvorada, 9 de julho de 1911.
Pesquisa, transcrição e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2019)

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