O Jogador
Era meia-noite quando abandonou
a mesa do jogo. Tinha perdido sua fortuna. Instintivamente tomou o caminho de
casa. Sua cabeça ardia. Caía-lhe no cérebro um peso enorme. E pensou na
família: sua mulherzinha que a essa hora devia esperá-lo gemendo de frio e de medo
ao lado do berço de seu filho adormecido.
— Que lhe direi?
O céu coberto de estrelas resplandecia
indiferente sobre sua pálida fronte. De vez em quando, um tresnoitado, com a gola
do gibão erguida até às orelhas, passava apressadamente ao seu lado, olhando-o
com desconfiança.
E o miserável voltava o rosto
com medo de ser conhecido, de que lessem em sua fisionomia a infâmia que cometera.
Chegou com mão trêmula, meteu a
chave na fechadura e tremeu ao ouvir o ruído dos gonzos que gemiam.
A voz do remorso gritou nesse
momento em sua consciência. Sentiu como que um punhal lhe atravessar as
entranhas.
— És tu?
E dois braços o apertaram, e os
lábios beijaram seus lábios.
— Olha! É uma coisa horrível. Estava
pensando que tinhas perdido tudo, que já não tínhamos onde colocar o berço do
nosso filho. Que loucura! É verdade?...
E ela dizia tudo aquilo com os olhos fitos nos
seus, apertando-lhe as mãos, feliz por tê-lo a seu lado.
— E se fosse certo?
Disse-o num tom frio, seco
como quem, conhecendo sua falta, pretende evitar o castigo, fazendo sentir a
superioridade de suas forças materiais.
E ela ficou com os olhos
muitos abertos, quase espantada.
Por que misterioso
pressentimento lhe dissera a verdade o coração?
— Que importa? Uma mãe sempre
acha com que alimentar seu filho — disse ela com uma das mãos apoiada ao berço.
E via tal majestade em sua
postura, tão corajosa altivez em seu olhar, que o miserável, caindo de joelhos:
— Perdão — gritou banhado em lágrimas.
Desde esse dia, Nicolau Tomás
foi o melhor dos esposos e o mais honrado dos homens.
Vencido pela virtude de uma mãe, a mãe de seu filho, não quis ser inferior a ela; e, artífice infatigável
no trabalho, recuperou com fartura a fortuna que havia perdido.
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A Alvorada, 9 de julho de 1911.
Pesquisa, transcrição e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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