A PARÓDIA
Meus quarenta anos
(Paródia
dos "Meus Oito Anos", de Casimiro de Abreu)
I
Ah! que desgosto
que eu tenho,
Da noite de minha
vida,
Da minha
"chance" perdida,
De desfrutar muito
mais;
Que horror, que
tédio, que dores,
Nas minhas tardes
de inverno
A minha vida é um
inferno,
Debaixo dos
vendavais.
II
Como são tristes
os dias,
Do despontar da
velhice,
Difere da
meninice,
E em nada encontra
sabor;
O mar é — Iago
tristonho,
O céu — um teto
azulado,
O mundo — inferno
dourado,
A Vida — um pranto
de dor!
III
Que tardes, sem sol, sem vida,
Que tardes, sem sol, sem vida,
Que noites tão
invernosas
Nas aflições
clamorosas,
Do meu imenso
penar!
O céu, escasso de estrelas,
A tetra imunda e
tão feio,
Na praia não há
sereia,
Só há tristeza no
mar!
IV
Oh! dias da velha
idade!
Oh! meu lar, minha
casinha,
Que triste a minha
vidinha,
Neste contínuo
lutar!
Em vez dos sonhos
da infância,
Eu tenho as mágoas
de agora,
O peso de minha
senhora,
E os filhos, que
sustentar.
V
Preso aos laços da
família,
Eu vivo mal
satisfeito,
O suor descendo ao
peito,
— Mãos calosas —
já cansado;
Correndo para o
trabalho,
Às voltas com o
meu emprego,
Sem conquistar um sossego,
— Como qualquer
desgraçado.
VI
Nestes meus
dificultosos,
Dias que se vão
passando,
Vou sofrendo, vou
lutando,
Sem ter o menor
prazer;
E rezo o meu Padre
Nosso.
Não vejo o céu
estrelado,
Sempre adormeço
cansado,
E já desperto a
correr.
SOARES JÚNIOR
Revista “Careta”,
1949.
---
O ORIGINAL
O ORIGINAL
Meus oito anos
Oh! que saudades
que tenho
Da aurora da minha
vida,
Da minha infância
querida
Que os anos não
trazem mais!
Que amor, que
sonhos, que flores,
Naquelas tardes
fagueiras
À sombra das
bananeiras,
Debaixo dos
laranjais!
Como são belos os
dias
Do despontar da
existência!
— Respira a alma
inocência
Como perfumes a
flor;
O mar é — lago
sereno,
O céu — um manto
azulado,
O mundo — um sonho
dourado,
A vida — um hino
d'amor!
Que aurora, que
sol, que vida,
Que noites de
melodia
Naquela doce
alegria,
Naquele ingênuo
folgar!
O céu bordado
d'estrelas,
A terra de aromas
cheia
As ondas beijando
a areia
E a lua beijando o
mar!
Oh! dias da minha
infância!
Oh! meu céu de
primavera!
Que doce a vida
não era
Nessa risonha
manhã!
Em vez das mágoas
de agora,
Eu tinha nessas
delícias
De minha mãe as
carícias
E beijos de minha
irmã!
Livre filho das
montanhas,
Eu ia bem
satisfeito,
Da camisa aberta o
peito,
— Pés descalços,
braços nus —
Correndo pelas
campinas
A roda das
cachoeiras,
Atrás das asas
ligeiras
Das borboletas
azuis!
Naqueles tempos
ditosos
Ia colher as
pitangas,
Trepava a tirar as
mangas,
Brincava à beira
do mar;
Rezava às
Ave-Marias,
Achava o céu
sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a
cantar!
................................
Oh! que saudades
que tenho
Da aurora da minha
vida,
Da minha infância
querida
Que os anos não
trazem mais!
— Que amor, que
sonhos, que flores,
Naquelas tardes
fagueiras
A sombra das
bananeiras
Debaixo dos
laranjais!
CASIMIRO DE ABREU
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...