Era um camponês muito ingênuo,
que um dia partiu para a cidade de Bagdá a fim de vender uma cabra; foi montado
num jumento, a puxar a cabra, que ia,
tlin, tlin, tlin, com um cincerro ao pescoço. Três ladrões resolveram
roubá-lo.
— Eu me encarrego de furtar a
cabra — disse um deles.
— E eu, de furtar o jumento —
disse o segundo.
— E eu, de furtar-lhe as
roupas — disse o terceiro.
Assim combinados; os três
malandros seguiram o pobre camponês. O
primeiro deu jeito de passar a
campainha do pescoço da cabra para o rabo do burro sem que o pobre homem
percebesse. Sempre a ouvir o toque da campainha, só muito lá adiante é que
olhou para trás e não viu cabra nenhuma.
Desesperado com aquilo, porque
aquele animalzinho representava muito para ele, pulou do jumento abaixo e pediu
a um homem que viu por ali que o segurasse enquanto ele ia em procura da cabra.
Com a maior boa vontade o homem prontificou-se a segurar o jumento — e, assim
que o camponês se afastou, fugiu. Esse homem era o segundo ladrão.
Quando o camponês voltou e não
encontrou nem sinal do jumento, abriu a boca, desesperado. Nisto deu com outro
homem que olhava para dentro dum poço, com grande aflição.
— Que houve? — perguntou o
camponês. — Perdeu também algum jumento?
— Perdi muito mais — disse o
homem com voz de desespero. — Imagine que fui encarregado de entregar um
escrínio de ouro ao califa, e sentando-me à beira deste poço, para descansar,
não sei que jeito dei que o escrínio caiu lá dentro.
— Por que não desce para
pegá-lo?
— Já pensei nisso, mas tenho
medo de resfriar-me. Sou muito sujeito a resfriados. Estou esperando que
apareça alguém que queira prestar-me este serviço.
— Quanto paga? — perguntou o
camponês.
— Oh, pago dez moedas de ouro,
porque se trata dum escrínio riquíssimo.
O camponês não disse mais
nada. Sacou fora a roupa e desceu ao poço. E o tal portador do escrínio, que
não era portador de escrínio nenhum e sim o terceiro ladrão, fugiu com a roupa
dele...
***
— Coitado! — exclamou
Narizinho. — A vida é bem cruel. Os ingênuos e os bons são sempre iludidos
pelos maus.
— Verdade, sim — concordou
dona Benta.
— Os homens de boa fé saem
sempre perdendo. Por isso o meu bisavô, que foi o homem mais matreiro da sua
zona, costumava dizer: "Quando alguém me procura para propor um negócio,
eu fico ouvindo e pensando cá comigo: "Onde estará o gato?" e
descubro, porque em todo negócio que alguém propõe há sempre um gato
escondido." Nesse pau tem "mé"! — dizem os caboclos.
Mas Narizinho não tirava da ideia
o pobre camponês.
— Coitado! Perder a cabrinha
já foi um desastre. Perdeu depois o jumento, que valia muito mais que a
cabrinha. E por fim acabou nu em pelo. E por quê? Só porque teve boa fé, só
porque acreditou nos três homens...
— Por isso é que eu não gosto
de gente — gritou Emília. — São os piores bichos da terra. Entre as formigas ou
abelhas, por exemplo — quem é que já viu uma furtando outra, ou mentindo para
outra, ou amarrando outra em rabo de burro bravo? Vivem em sociedade, aos
milhares de milhares, na mais perfeita harmonia. Ah, quem quiser saber o que é
honestidade de vida, vá a um formigueiro ou a uma colmeia. Aqui entre os homens
é que não fica sabendo disso, não. Quanto mais conheço os homens, mais aprecio
as abelhas e as formigas.
— E agora vovó? Que história
vai contar? — perguntou Pedrinho.
— Vou contar uma do Congo, na
qual os negros explicam como é que apareceram os macacos.
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Notas:
Extraído da obra: Histórias de Tia Nastácia.
Transcrição e atualização ortográfica: Iba Mendes (2018)
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