Todos os tratados de xadrez
descrevem a celebre partido jogada por Philidor no século XVIII, a mais
romântica que os anais enxadrísticos mencionam. Tão sábia foi, tão imprevista e
audaciosa, que recebeu o nome de Partida Imortal. Embora depois dela se
jogassem pelo mundo milhões de partidas de xadrez, nenhuma ofuscou a obra prima
do famoso Philidor André Danican.
Também a “facada” do Indalício
Ararigboia, um saudoso amigo morto, se vem perpetuando nos anais da alta
malandragem como a La Gioconda do gênero ou como está admitido nas rodas
técnicas — a Facada Imortal. Indalício foi positivamente o Philidor dos
faquistas.
Lembro-me bem: era um rapaz
lindo, de olhos azuis e voz suavíssima; as palavras vinham-lhe como pêssegos
embrulhados em paina, e sabiamente camaralentadas, porque, dizia ele, o homem
que fala depressa é um perdulário que deita fora o melhor ouro da sua herança.
Ninguém dá tento ao que esse homem diz, porque quod abundat nocet. Se não valorizamos nós mesmos as nossas
palavras, como pretendermos que os outros as prezem?
Meu mestre nesse ponto foi o
general Pinheiro Machado, num discurso que lhe ouvi certa vez. Que astuciosa e
bem calculada lentidão! Entre uma palavra e outra o Pinheiro punha um intervalo
de segundos, como se sua boca estivesse perdigotando pérolas. E a assistência o
ouvia com religiosa unção absorvendo como pérolas era emitido. Substantivos, adjetivos,
verbos, advérbios e conjunções caiam sobre os ouvintes como seixos lançados à
lagoa; e antes que cada um chegasse bem lá no fundo, o general não soltava
outro. Cacetíssimo, mas de alta eficiência.
— Foi ele então o teu mestre
na arte de falar valorizadamente…
— Não. Nasci sonolento. O
Pinheiro apenas me abriu os olhos quanto ao valor monetário do Dom que a
natureza me dera. Depois de ouvir esse seu discurso é que passei a dedicar-me à
nobre arte de fazer com os homens o que fazia Moisés nas rochas do deserto.
— Fazê-los “sangrar”…
— Exatamente. Vi que se
somasse minha natural lentidão do falar com alguma psicologia vienense (Freud,
Adler), o dinheiro dos homens me atenderia como as galinhas atendem ao quit, quit das donas de casa. Para cada bolso há uma chave Yale. Minha
técnica se resume hoje em só abordar a vítima depois de descobrir a chave
certa.
— E como consegue?
— Tenho minha álgebra.
Considero os homens equações do terceiro grau — equações psicológicas, está
claro. Estudo-os, deduzo, concluo — e esfaqueio com precisão praticamente
absoluta. O mordedor comum é um ser indecoroso, digno do desprezo que lhe dá a
sociedade. Pedincha, implora; apenas desenvolve, sem a menor preocupação
estética, o surrado cantochão do mendigo: “Uma esmolinha pela amor de Deus!”
Comigo, não! Assumi essa atitude (porque o pedir é uma atitude na vida),
primeiro, por esporte; depois, com o fito de reabilitar uma das mais velhas
profissões humanas.
— Realmente, a intenção é
nobilíssima…
Indalício racionalizara a
“mordedura” ao ponto da sublimação. Citava filósofos gregos.
Mobilizava músicos de fama.
— Liszt, Mozart, Debussy,
dizia ele, nobilitaram essa coisa comum chamada “som” à força de harmonizá-lo
de certo modo. O escultor nobilitará até um paralelepípedo de rua, se lhe der
forma estética. Por que não nobilitaria eu o deprimentíssimo ato de pedir?
Quando lanço a minha facada, sempre depois de sérios estudos, a vítima não me
dá o seu dinheiro, apenas paga a finíssima demonstração técnica com que o
tonteio. Paga-me a facada do mesmo modo que o amador de pintura paga o arranjo
de tintas que o pintor faz sobre uma estopa, um quadrado de papelão, uma
relíssima tábua.
O faquista comum, notem, nada
dá em troca do miserável dinheirinho que tira. Eu dou emoções gratíssimas à
sensibilidade das criaturas finas. Minha vítima tem que ser fina. O simples
fato da minha escolha já é um honroso diploma, porque nunca me desonrei em
esfaquear criaturas vulgares, de alma grosseira. Só procuro gente na altura de
compreender as sutilezas das paisagens de Corot ou dos versos de Verlaine.
Como se requintava a formosura
do Indalício nos momentos em que discorria assim! Envolvia-o a aura dos
predestinados, dos apóstolos que se sacrificam para aumentar de alguma coisa a
beleza do mundo. De sua barba loura, à Cristo, escapavam os suaves reflexos do
cendre.
As frases fluíam-lhe da boca
de fino desenho como o óleo ou o mel escorre duma ânfora grega suavemente
inclinada. Suas palavras traziam patins aos pés. Tudo no Indalício eram mancais
de esferas. Talvez ajudasse a circunstância de ser surdinho. Isso de não ouvir
bem põe veludos em certas pessoas, dá-lhes um macio de violoncelo. Como não se
distraem com a vulgaridade dos sons que todos nós normalmente ouvimos, atentam
mais em si próprios, “ouvem-se mais”, concentram-se.
Nosso costume naquele tempo
era reunir-nos todas as noites no velho “Café Guarany” com y grego — a reforma
ortográfica ainda dormia no calcanhar do Medeiros e Albuquerque; ficávamos ali
horas trabalhando para a Antártica e comentando as proezas de cada um. Rodinha
muito interessante e vária, cada um com a sua mania, a sua arte ou a sua tara.
Ligava-nos apenas uma coisa: o pendor comum pelas finuras mentais em qualquer
campo que fosse, literatura, perfídia, oposição ao governo, arte de viver,
amor. Um deles era absolutamente ladrão — desses que a sociedade trancafia. Mas
que ladrão engraçado! Estou hoje convencido de que roubava unicamente com um
fim: deslumbrar a rodinha com a primorosa estilização das proezas. Outro era bêbedo
profissional — e talvez pela mesma razão: informar à roda sobre o que é a vida
do clã de adoradores do álcool que passam a vida nos “botecos”. Outro era o
Indalício…
— E antes, Indalício? Que é
que fazia?
— Ah, perdia o tempo numa
escola do Rio como professor de meninos. Nada mais desinteressante. Fugi, farto
e refarto. Odeio qualquer atividade vazia dessa “emoção da caça” que considero
a coisa suprema da vida. Fomos caçadores durante milhões e milhões de anos, na
nossa longuíssima fase de homens primitivos.
A civilização agrícola é coisa
de ontem, e por isso ainda espinoteiam com tanta vivacidade, dentro do nosso
modernismo, os velhos instintos do caçador. Continuamos os caçadores que
éramos, apenas mudados de caça. Como nestas cidades de hoje não existem aquele Ursus speleus que no período das
cavernas nós caçávamos (ou nos caçavam), matamos a sede do instinto com as
amáveis cacinhas da civilização. Uns caçam meninas bonitas, outros caçam
negócios, outros caçam imagens e rimas. O Breno Ferraz caça boatos contra o
governo…
— E eu que caço? Perguntei.
— Antíteses, respondeu de
pronto o Indalício. — Fazes contos, e que é o conto senão uma antítese
estilizada? Eu caço otários, com a espingarda da psicologia. E como isso me dá
para viver folgadamente, não quero outra profissão. Tenho prosperado. Calculo
que nestes últimos três anos consegui remover do bolso alheio para o meu cerca
de duzentos contos de réis. Aquela revelação fez que o nosso respeito pelo
Indalício aumentasse de dez pontos.
— E sem abusar, continuou ele,
sem forçar a nota, porque meu intento nunca foi acumular dinheiro. Em dando
para o passadio à larga, está ótimo. O lucro maior que obtenho, entretanto,
está na contenteza de alma, na paz da consciência — coisas que nunca tive nos
anos em que, como professor de educação moral, eu transmitia às inocentes
crianças noções que hoje considero absolutamente falsas. As nevralgias da minha
consciência naquela época, quando provava nas aulas, com infames sofismas, que
a linha reta é o caminho mais curto entre dois pontos!
Com o perpassar do tempo o
Indalício desprezou completamente as facadas simples, ou do “primeiro grau”,
como dizia ele, isto é, as que apenas produzem dinheiro. Passou a interessar-se
unicamente pelas que representavam “soluções de problemas psicológicos” e lhe
davam, além do íntimo prazer da façanha, a mais pura glória ali da rodinha. Uma
noite desenvolveu-nos o teorema do máximo…
— Sim cada homem, em matéria
de facada, tem o seu máximo; e o faquista que arranca 100 mil réis dum freguês
cujo máximo é de um conto, lesa-se a si próprio — e ainda perturba a harmonia
universal. Lesa-se em 900 mil réis e interfere na ordem preestabelecida do
cosmos. Aqueles 900 mil réis estavam predestinados a mudarem-se de bolso
naquele dia, naquela hora, por meio daqueles agentes; a inépcia do mau faquista
perturba a predestinação, dessa arte criando uma ondulazinha de desarmonia que
até ser reabsorvida contribui para o mal-estar do Universo.
Essa filosofia ouvimo-la no
dia do seu “grande deslize”, quando o Indalício nos apareceu no Guarany
seriamente incomodado com a perturbação que essa sua “mancada” podia estar
determinando na harmonia das esferas.
— Errei, disse ele. Meu
assalto foi contra o Macedo, que, vocês sabem, é a maior vítima dos mordedores
de S. Paulo. Mas fui precipitado em minhas conclusões quanto ao seu máximo, e
dei-lhe um golpe de dois contos apenas. A prontidão com que atendeu, reveladora
de que estava ganhando três, demonstrou-me, da maneira mais evidente, que o
máximo do Macedo é de cinco contos! Perdi. Pois, três contos…
E o pior não está nisso, mas
na desconfiança em que fiquei de mim mesmo. Estarei por acaso decaindo? Nada
mais grotesco do que ferir em oitenta ao otário cujo máximo é de cem. O bom
atirador não gosta de acertar perto Há de enfiar as balas, exatinho, no centro
geométrico do alvo. Nesse dia foram necessários dez chopes para abafar a
inquietação do Indalício; e ao recolher-nos, lá apela meia noite, saí com ele a
pretexto de consolá-lo, mas na realidade para impedi-lo de passar pelo Viaduto.
Mas afinal descobri a aspirina adequada ao caso.
— Só vejo um meio de te
restaurares na confiança perdida, meu caro Indalício: dares uma facada no Raul!
Se o consegues, terás realizado a proeza suprema de tua vida. Que tal?
Os olhos de Indalício
iluminaram-se, como os do caçador que depois de perder um coati dá de frente
com um precioso veado — e foi assim que teve início a construção de grande obra
prima do nosso saudoso Indalício Ararigboia.
O Raul, velho companheiro de
roda, tinha-se, e era tido, como absolutamente imune a facadas. Rapaz de
modestas posses, vivia duns 400 mil réis mensalmente drenados do governo; mas
tratava-se bem, vestia-se com singular apuro, usava lindas gravatas de seda,
bons sapatos; para perpetuar semelhante proeza, entretanto, adquirira o hábito
de não por fora dinheiro nenhum, e hermeticamente fechara o corpo a facadas,
por mínimas que fossem.
Recebido o ordenado no começo
do mês, pagava as contas, as prestações, retinha os miúdos do bonde e pronto — ficava
até o mês seguinte leve como um beija-flor. Em matéria de facadas sua teoria
sempre fora de negação absoluta.
— “Morre” quem quer, dizia
ele. Eu por exemplo não sangrarei nunca porque de há muito deliberei não
sangrar! O mordedor pode atacar-me de qualquer lado, norte, sul, leste, oeste,
a jusante ou a montante, e com uso de todas as armas inclusive as do arsenal do
Indalício: inútil! Não sangro, pelo simples fato de haver deliberado não
sangrar — além de que por sistema não ando com dinheiro no bolso.
Indalício não ignorava a
inexpugnabilidade do Raul, mas como se tratasse dum companheiro de roda nunca
pensou em tirar o ponto a limpo. Minha sugestão daquele dia, porém, fê-lo mudar
de ideia. A inexpugnabilidade do Raul entrou a irritá-lo como intolerável
desafio à sua genialidade.
— Sim, disse o Indalício,
porque verdadeiramente imune a facadas não creio que haja ninguém no mundo. E
se alguém, como o Raul, faz essa ideia de si, é que nunca foi abordado por um
verdadeiro mestre — um Balzac como eu. Hei de destruir a inexpugnabilidade do
Raul; e se meu golpe vier a falhar, talvez até me suicide com a pistola de
Vatel. Viver desonrado aos meus próprios olhos, nunca!
E Indalício pôs-se a estudar o
Raul a fim de descobrir-lhe o máximo — sim, porque até no caso do Raul aquele
gênio insistia em ferir no máximo! Duas semanas depois confessou-me com a
habitual suavidade:
— O caso está resolvido. O
Raul realmente jamais levou facadas e considera-se em absoluto imune — mas lá
no fundo d’alma, ou do inconsciente, está inscrito o seu máximo: cinco mil
réis! Tenho orgulho em revelar a minha descoberta. Raul considera-se
inesfaqueável, e jurou morrer sem a menor cicatriz no bolso; a sua consciência,
portanto, não admite máximo nenhum. Mas o máximo do Raul é de cinco! Para
chegar a essa conclusão tive de insinuar-me nos desvãos de sua alma com a gazua
do Freud.
— Só cinco?
— Sim. Só cinco — o máximo
absoluto! Se o Raul se psicanalisasse, descobriria, com assombro, que apesar
das suas juras de imunidade a natureza o colocou na casa dos cinco.
— E vai o nosso Balzac
sujar-se com uma facada de cinco mil réis! Em que ficou a tua fixação do mínimo
em duzentos?
— De fato, hoje não dou
facadas de menos de duzentos, e me julgaria desonrado se me abaixasse a uma de
cento e oitenta. Mas o caso do Raul, especialíssimo, me força a abrir uma
exceção. Vou esfaqueá-lo em cinquenta mil réis…
— Por que cinquenta?
— Porque ontem,
inopinadamente, a minha álgebra psicológica demonstrou que há possibilidade de
um segundo máximo no Raul, não de cinco, como está inscrito no seu
inconsciente, mas de dez vezes isso, como consegui ler na aura desse
inconsciente!…
— No inconsciente do
inconsciente!…
— Sim, na verdadeira
estratosfera do inconsciente raulino. Mas só serei bem sucedido se não errar na
escolha do momento mais favorável, e se conseguir deixá-lo em ponto de bala por
meio da aplicação de diversas cocaínas psicológicas. Só quando Raul se sentir
levitado, expandido, como a alma bem rarefeita, é que sangrará no máximo astral
que eu descobri!…
Mais um mês gastou o Indalício
em estudos do Raul. Certificou-se do dia em que lhe pagavam no Tesouro, do
quanto lhe levavam as contas e prestações, e quanto costumava sobrar-lhe depois
de satisfeitos todos os compromissos. E não há por aqui toda a série de
preparos psicológicos, físicos, metapsíquicos, mecânicos e até gastronômicos a
que o gênio do Indalício submeteu o Raul; encheria páginas e páginas.
Resumirei dizendo que o ataque
em voo pique só seria realizado depois do completo “condicionamento” da vítima
por meio da sábia aplicação de todos os “matadores”. O nosso pobre Indalício
faleceu sem saber que estava lançando os fundamentos do moderno totalitarismo…
No dia 4 do mês seguinte
avisou-se da iminência do golpe.
— Vai ser amanhã, às oito da
noite, no Bar Baron, quando o Raul cair na leve crise sentimental que lhe
provocam certas passagens do Petit Chose de Daudet, recordadas entre a Segunda
e a terceira dose do meu vinho…
— Que vinho?
— Ah, um que descobri em
estudos in anima nobile — nele mesmo: a única vinhaça que de mistura com o
Daudet do Petit Chose deixa o Raul, durante meio minuto, sangrável no máximo
astral! Vocês vão abrir a boca. Estou positivamente criando a minha obra prima!
Aparece amanhã no Guarany às nove horas para ouvires o resto…
No dia seguinte fui ao Guarany
às oito e já lá encontrei a roda. Pu-los ao par dos desenvolvimentos da véspera
e ficamos a comentar os prós e contras do que àquela hora estaria se passando
no Bar Baron. Quase todos jogavam no Raul.
Às nove entrou o Indalício,
suavemente. Sentou-se.
— Então? Perguntei.
Sua resposta foi tirar do
bolso e sacudir no ar uma nota nova de cinquenta mil réis.
— Fiz um trabalho preparatório
perfeito demais para que me falhasse o golpe, disse ele. No momento decisivo
bastou-me um quit, quit dos mais
simples. Os cinquenta fluíram do bolso do Raul para o meu — contentes, felizes,
alegrinhos…
O assombro da roda chegou ao
auge. Era realmente escachante aquele prodígio!
— Maravilhoso, Indalício! Mas
põe isso em troca miúdo, pedimos. E ele contou:
— Nada mais simples. Depois do
preparo do terreno, a técnica foi, entre a Segunda e a terceira dose da vinhaça
e o Daudet, ferir fundo nos cinquenta — e o que eu esperava ocorreu. Ultra-surpreso
de haver no globo quem o avaliasse em cinquenta mil réis, a ele, que na
intimidade trevosa do subconsciente só admitia o miserável máximo de cinco,
Raul deslumbrou-se…
Raul perdeu o controle de si
próprio … sentiu-se levitado, rarefeito por dentro, estratosférico — e com os
olhos emparvecidos meteu a mão no bolso, sacou tudo quanto havia lá, exatamente
esta nota, e entregou-ma, sonambúlico, num incoercível impulso de gratidão!
Instantes depois voltava a si. Corou como a romã, formalizou-se e só não me
agrediu porque a minha sábia fuga estratégica não lhe deu tempo…
Maravilhamo-nos sinceramente.
Aquela Yale psicológica é talvez a
única, dos milhões de chaves existentes no universo, capaz de abrir a carteira
do Raul para um faquista; e o tê-la descoberto e manejado com tanta segurança
era coisa que indiscutivelmente vinha fechar com chave de ouro a gloriosa
carreira do Indalício — como de fato fechou: meses depois a gripe espanhola de
1918 nos levava esse precioso e amável amigo.
— Parabéns, Indalício!
Exclamei. Só a má fé te negará o Dom da genialidade. A Partida Imortal do
grande Philidor já não está sem pendant no mundo. Criaste a Facada Imortal
Como ninguém da roda jogasse
xadrez, todos me olharam perguntativamente. Mas não houve tempo para
explicações. Vinha entrando o Raul. Sentou-se, calado, contido. Pediu uma
caninha (sinal de rarefação no bolso). Ninguém disse nada... Esperamos que ele
se abrisse. Indalício estava profundamente absorvido nos “Pingos e Respingos”
dum “Correio da Manhã” sacado do bolso.
Súbito, veio-me uma infinita
vontade de rir, e foi rindo que rompi o silêncio:
— Então, seu Raul, caiu,
hein?…
Realmente desapontado, o
querido Raul não achou a palavra chistosa, o “espírito” com que em qualquer
outra circunstância comentaria um seu desaso qualquer. Limitou-se a sorrir
amareladamente e a emitir um “Pois é!…” — o mais desenxabido “Pois é” ainda
pronunciado no mundo. Tão desenxabido, que o Indalício engasgou-se de rir… com
o “Pingo” que lia.
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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2018)
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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2018)
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