Ao pôr do Sol
RAUL DA CUNHA MACHADO
“Távola do bom humor, Sonetos maranhenses” (1923)
Quando o sol do
horizonte se encaminha
E o crepúsculo a
terra vai deixando,
O ocaso em brasa
vai iluminando
O vasto mar do
qual já se avizinha.
Quando a brumosa
noite rompe o espaço
E a solidão do
oceano se levanta,
Tristeza infinda a
terra desencanta
E a estreita em
grande e fraternal abraço.
Quando fito esse
quadro de beleza
Fala-me a dor, a
dor indefinida
Porque me pesa
idêntica tristeza.
Nele se antolha
toda a minha vida:
Como o sol — a
esperança me despreza,
E' como a treva —
esta ilusão perdida!
Pôs-se o Sol
JOÃO XAVIER DE MATOS
Pôs-se o sol...
Como já, na sombra feia
Do dia, pouco a
pouco, a luz desmaia!
E a parda mão da
Noite, antes que caia,
De grossas nuvens
todo o ar semeia!
Apenas já diviso a
minha Aldeia;
Já do cipreste não
distingo a faia:
Tudo em silêncio
está. Só, lá na praia,
Se ouvem quebrar
as ondas pela areia.
Com a mão na face,
a vista ao Céu levanto,
E cheio de mortal
melancolia,
Nos tristes olhos
mal sustenho o pranto;
E se inda algum
alívio ter podia
Era ver esta Noite
durar tanto,
Que nunca mais
amanhecesse o dia!
Nascer do Sol
LUÍS DELFINO
"Algas e Musgos" (1927)
Acorda, como emir
voluptuoso,
Na cálida ebriez
de essências puras,
E traz a enorme
cicatriz do gozo
O sol, trajando as
largas vestiduras.
À noite, que de
esplêndidas loucuras,
Beijando uris em
raivas de amoroso!
E o divã, — entre
nítidas brancuras, —
Guarda mal o
segredo duvidoso.
Veem-se amarelos
sândalos na cama,
Lençóis esparsos,
véus da cor da chama,
Laca vermelha,
cintas e corais,
Sandálias de
esmeralda, ramalhetes,
Argolas de ouro,
fulvos braceletes,
E o acre rubor de
carnes ideais!
Um novo pôr do Sol
LUÍS DELFINO
"Imortalidades" (1941)
Vai acabar o dia.
— Helena, agora
Que a luz se
mescla à treva, e que perfuma
Tudo a brisa, que
sopra, e como a aurora
Dúbias nos mostra
as coisas uma e uma,
Olha a praia, onde
ali o mar espuma,
E mais acima a
zona, onde uma flora
Nova, só do
Brasil, variada e odora,
Em que a piteira
em haste a flor apruma,
E o ingá, e o
coco, e o cacto, e o mato reles,
Que na água azul o
mar estende e espelha,
E encanta mais que
um quadro bom de Apeles...
Sobre isto o pôr
do sol de hoje semelha
Uma paisagem do
Victor Meirelles,
Com sua eterna
luz, bela e vermelha.
O Vulcão e o Sol
(A Raimundo Correia)
AUGUSTO DE LIMA
“Contemporâneas” (1887)
I
Treme a montanha e
se abre em ímpetos indômitos:
ruge-lhe o ventre,
e um filtro ardente de atro enxofre
as veias lhe
percorre... até que, em rubros vômitos,
a descarga de fogo
arrebenta de chofre.
A bílis borrascosa
estruge-lhe na entranha,
como um feto
maldito. Os calcinados ossos
do velho
paquiderme estremecem na estranha
e sinistra mudez
dos quaternários fossos.
E parecendo ouvir
a voz lenta, vibrada,
da lendária
trombeta, o ictiossauro na gruta
subterrânea
escancara a inválida queixada
e, nas patas
firmado, atentamente escuta...
Do túrbido cairel
betuminoso e horrendo,
que a larga face
abrindo, arfa estentoreamente,
o colosso de fogo
aos céus alto se erguendo,
descreve na
amplidão mil roscas de serpente.
E dobrando,
solene, o dorso audacioso,
cinge os flancos
do espaço em tantálico ardor.
Entretanto, no céu
sereno e grandioso,
rola o sol
triunfante a luz do eterno amor.
II
Assim tu, coração,
enquanto em paroxismos
despedaças a flor
de nossos sentimentos,
e a atiras
desfolhada aos pérfidos abismos,
aos ímpetos dos
ventos;
Não importa!
refulge, esplêndido e espontâneo,
enchendo-nos de
luz, caudal veia por veia,
no pino da razão,
no ardente céu do crânio,
o eterno sol da
Ideia!
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