Soneto de todos os cornos
BOCAGE
Não lamentes, Alcino, o teu estado,
Corno tem sido
muita gente boa;
Corníssimos
fidalgos tem Lisboa,
Milhões de vezes
cornos têm reinado.
Siceu foi corno, e
corno de um soldado;
Marco António por
corno perdeu coroa;
Anfitrião com toda
a sua proa
Na fábula não
passa por honrado;
Um rei Fernando
foi cabrão famoso
(Segundo a antiga
letra da gazeta)
E entre mil cornos
expirou vaidoso;
Tudo no mundo está
sujeito à greta;
Não fiques mais,
Alcino, duvidoso,
Pois isto de ser
corno é tudo peta.
★★★
Soneto da cópula canina
BOCAGE
Quando no estado
natural vivia
Metida pelo mato a
espécie humana,
Ai da gentil
menina desumana,
Que à força a
greta virginal abria!
Entrou o estado
social um dia;
Mandou a lei que o
irmão não foda a mana,
É crime até
chuchar uma sacana,
E pesa a
excomunhão na sodomia;
Quanto, lascivos
cães, sois mais ditosos!
Se na igreja
gostais de uma cachorra,
Lá mesmo, perante
o altar, fodeis gostosos;
Enquanto a linda
moça, feita zorra,
Voltando a custo
os olhos voluptuosos,
Põe num altar a
vista, a ideia em porra.
★★★
Soneto do caralho decadente
BOCAGE
Com quem magoas o
não digo! Eu nem te vejo,
Meu caralho
infeliz! Tu, que algum dia
Na gaiteira
amorosa filistria
Foste o regalo do
meu pátrio Tejo!
Sem te importar o
feminino pejo,
Atrás da mimosa
virgem, que fugia,
Ficando a terna,
fadigada Armia,
Lhe pegavas no
coninho um beijo.
Hoje, canal de
fétida remela,
O misantropo do
país das bimbas,
Apenas olha a
cândida donzela!
Deitado dos
colhões sobre as tarimbas,
Só com a memória
em feminil canela
Às vezes pívia
casual cachimbas.
★★★
Soneto da dama a cagar
BOCAGE
Cagando estava a
dama mais formosa,
E nunca se viu cu
de tanta alvura;
Porém ver cagar a
formosura
Mete nojo à
vontade mais gulosa!
Ela a massa
expulsou fedentinosa
Com algum custo,
porque estava dura;
Uma carta de amor
de limpadura
Serviu àquela
parte malcheirosa;
Ora mandem à moça
mais bonita
Um escrito de amor
que lisonjeiro
Afetos move,
corações incita;
Para o ir ver
servir de reposteiro
À porta, onde o
fedor, e a trampa habita,
Do sombrio palácio
do alcatreiro!
★★★
Soneto do velho escandaloso
BOCAGE
Tu, ó demente velho descarado,
Escândalo do sexo
masculino,
Que por alta
justiça do Destino
Tens o impotente
membro decepado!
Tu, que, em torpe
furor incendiado
Sofres de ímpia
paixão ardor maligno,
E a consorte
gentil, de que és indigno,
Entregas a
infrutífero castrado!
Tu, que tendo
bebido o menstruo imundo,
Esse amor
indiscreto te não gasta
De ímpia mulher o
orgulho furibundo!
Em castigo do
vício, que te arrasta,
Saiba a ínclita
Lísia, e todo o mundo
Que és vil por
gênio, que és cabrão, e basta.
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