Amigos!
AFONSO CELSO
"Poesias Escolhidas" (1902)
Amigos!..
Quantos... quantos tive
Nos belos
tempos!... Mas, depois,
Foi começar fatal
declive,
Permaneceram três,
ou dois.
Não me lastimo. Na
amizade,
Como no amor, o
coração
Reduz a um ponto a
imensidade,
Num ser confina a
multidão.
O sentimento, se é
completo,
Concentra e apura
o seu calor:
— Quem dividiu em
roda o afeto,
Só folhas deu, não
deu a flor.
Em cada braço um
companheiro...
Para que mais?!
Nem há lugar...
— Basta, no transe
derradeiro,
Ter duas mãos para
apertar.
Aos amigos
NORBERTO DE SOUSA
SILVA
"O livro dos meus amores" (1849)
Brindemos a amor!
J. BONIFÁCIO
Os negros
desgostos
De pressa fugiram;
Lá vão, lá expiram
Momentos cruéis!
Momentos tão
agros,
De tanta amargura,
Adeus! Que
ventura!
Adeus!... Não
volteis!...
De minha ventura,
De minha alegria
Já lá raia o
dia...
Já raia... raiou!
— Pesares —
desgostos
— Cruentos rigores
Agora em amores
Tudo se trocou.
A vida que dantes,
Me era pesada,
Tão amargurada,
Tão cheia de fel,
E ora existência
De ternas
venturas,
De gratas doçuras,
De amores e mel.
Os copos dourados,
Amigos enchamos,
Amigos, bebamos
À Armia, e à amor!
Os cantos sonoros,
Os vivas ruidosos,
Os brindes
faustosos,
Sejam em seu
louvor!
À minha amiga
(Eutália de Barros Gurgel do Amaral)
CÁRMEN FREIRE
"Visões e Sombras" (1897)
Sabes dum mal que
leva ao desvario,
Que faz do sono
uma segunda vida
E torna o rosto
mais jovial sombrio?
Que ao desespero o
coração convida,
Que os olhos
dilatando a vista encurta,
E, dando forças,
toda a força embrida?
Sabes dum mal que
a inteligência furta,
Que fala muito
quando nada fala
E a mais extensa
vida torna curta?
Que se um minuto
uma ilusão embala
O nosso pensamento
entre venturas,
Todo o prazer ele
irrompendo cala?
Sabes dum mal que
leva as criaturas
De pesar, em
pesar, de dor em dor,
Por uma galeria de
loucuras?
Dizes que é o
ódio, eu digo que é o amor.
Amigo
AUGUSTO DE LIMA
“Contemporâneas” (1887)
O rochedo é
deserto. Ele avança.... recua...
e é preciso
morrer, contudo. O vento geme
pavorosas canções
nas árvores; a lua
pela face do mar,
triste, indecisa treme.
Ele vacila; o
abismo é pérfido, quem sabe
se a morte não
será pior que a própria vida,
que a vida
tormentosa e estúpida que cabe
àquele, cujo peito
é uma aberta ferida?
Porém, silêncio –
um grito ao longe como um canto
de saudade gemeu,
um lamento de dó,
e logo um cão
chegava, em cujo olhar o pranto
parecia pedir que
o não deixasse só.
Ansiava soturno, o
olhar na imensidade,
o tronco erguido
ao vento, o aspecto hirto, selvagem;
meditou: vida...
morte... inferno... eternidade...
– o corpo ergueu,
volteou e... tombou na voragem.
Por um momento o
cão esperou anelante;
pressentindo,
porém,
que ele não vinha
mais, num uivo lancinante,
atirou-se também.
Ode à Amizade
JOSÉ BONIFÁCIO DE
ANDRADA E SILVA
"Poesias" (1861)
Amitié, don du ciel, soutien des grandes
ames!
VOLTAIRE
De novo, ó musa,
as asas empenemos;
Firam-se as áureas
cordas
Da lira
abandonada;
Os frescos vales
do sagrado Pindo
Mais esta vez
trilhemos.
Novo Alcides a
clava sopesando,
As hidras, as
quimeras
Caíam aos pés
exangues;
A soberba
enrugada, a vil mentira,
E tu, lisonja
astuta!
Musa, filha do
céu! que espírito aceso
Me alumia a mente?
Não é furor
fingido. —
Nem são
inspirações da velha Delfos,
É da amizade o
estro!
Já desce lá do
empíreo a sã verdade:
Fujam, profanos,
fujam!
Aqueles que
sentiram
Uma vez da amizade
os meigos laços,
Venham ouvir meu
canto.
Não em dourados
tetos levantados
De marmóreo
palácio,
Ou em dóricas
arcadas,
Que sustentam as
salas majestosas,
Mora a virtude
santa.
Ó doce paz,
sagrada liberdade,
Únicos bens do
sábio!
Os ídolos da terra
Não vos conhecem. —
Vós dormis tranquilas
No seio da
amizade.
Enquanto na
esquentada fantasia
Criando ocos
fantasmas,
Frenéticos humanos
Suspirão por
privanças e quimeras,
Que os sustos
envenenam;
Nos campos
inocentes, onde brinca
Zéfiro
prazenteiro,
O sábio solitário
Ri desses doidos,
ri do velho mundo
Com o discreto
amigo.
Se sisuda tristeza
lhe bafeja
Com hálito
empestado,
Beijando a cara
amada,
Em quem moram
Cupidos cento e cento,
Inveja faz aos
deuses.
E lá quando do
negro trono estende
O plúmbeo cetro a
noite
Sobre o cansado
globo,
Sentado com o
amigo à parca mesa
Conversa
ledamente.
Umas vezes
sondando altos mistérios
Vedados à vil
turba,
Deixando o peso
inerte,
Nada no espaço
imenso, os globos pesa,
Milhões de soes
encara!
Outras vezes
baixando à humilde terra
Contempla a
natureza:
As douradas
espigas,
Que os prados
vestem de formosas ceifas,
Observa, e se
enternece.
Tu, Leibniz
imortal, tu, grande Newton,
A razão lhe
vigoras!
E incrédulo admira
Os vastos
turbilhões, partos sublimes
Do criador
Descartes.
Locke,
Montesquieu, Rousseau, Voltaire,
Virgílio, Pope,
Homero,
Camões, o padre
Horácio,
Repartem os seus
dias venturosos
Com a cândida
amizade.
Assim, meu bom
Filinto, caro amigo,
Com teu amigo
Elísio
Possas viver teus
dias!
E deixa que
casquilhos repimpados
Namorem
senhoritas.
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