Partida de uma
andorinha
LUÍS DELFINO
"Algas
e Musgos" (1927)
Podeis ir, sóis
de amor, não mais vos fecho
Às mãos; —
parti, rolai noutras esferas:
Céu azul de
minha alma, isto é deveras?
Este era pois o
lúgubre desfecho?
Que veiga toda a
abrir-se em flores deixo!
Vale cheio de
sombra e de quimeras,
Meu confidente e
o dela há pouco inda eras!...
Deuses, não, não
de vós, de mim me queixo.
Nela um cálido
raio de ouro eu tinha
Daquele olhar
divinamente terno,
Idílio bom, que
embala a quem caminha.
E eu, que
julgava este meu sonho eterno,
Busco inda o voo
à última andorinha.
Mas donde vem
assim tão cedo o inverno?...
★★★
Gaivotas
LUÍS DELFINO
“Algas
e Musgos” (1927)
Do crespo mar azul brancas gaivotas
Voam — de leite
e neve o céu manchando,
E vão abrindo às
regiões remotas
As asas, em
silêncio, à tarde, e em bando.
Depois se perdem
pelo espaço ignotas,
O ninho das
estrelas procurando:
Cerras os
cílios, com teu dedo notas
Que elas vêm
outra vez o azul furando.
Uma na vaga
buliçosa dorme,
Uma revoa em
cima, outra mais baixo...
E ronca o abismo
do oceano enorme...
Cai o sol, como
já queimado facho...
Do lado oposto
espia a noite informe...
Tu me perguntas
se isto é belo?... e eu acho...
★★★
Pombos mensageiros
AUTA DE SOUZA
“Poesias”
Transformados em
pombos cor de neve,
Entraram-me a
cantar pela janela,
A tua carta
delicada e leve
E o beijo amigo
que envolveste nela.
Ó que alegria
para o coração
Onde a Saudade,
sempre em flor, renasce!
A carta leve me
pousou na mão
E o beijo amigo
acarinhou-me a face.
E então, a rir,
ó pomba idolatrada!
Eu transformei
meu coração em ninho:
N’ele repousa a
tua carta amada
E canta o beijo
a ária do carinho.
★★★
O Beija-Flor
AUTA DE SOUZA
“Poesias”
Acostumei-me a
vê-lo todo o dia
De manhãzinha,
alegre e prazenteiro,
Beijando as
brancas flores de um canteiro
No meu jardim —
a pátria da ambrosia.
Pequeno e lindo,
só me parecia
Que era da noite
o sonho derradeiro...
Vinha trazer às
rosas o primeiro
Beijo do Sol,
nessa manhã tão fria!
Um dia, foi-se e
não voltou... Mas, quando
A suspirar, me
ponho contemplando,
Sombria e
triste, o meu jardim risonho...
Digo, a pensar
no tempo já passado;
Talvez, ó
coração amargurado,
Aquele
beija-flor fosse o teu sonho!
★★★
A Andorinha
AUGUSTO DE LIMA
“Contemporâneas”
(1887)
Ah! que conte
não me peças,
choravas se eu
te contasse...
Não quero as
marcas impressas
da tristeza em
tua face.
.......................................................
Vês tu aquela
andorinha,
que voa de um a
outro lado?
Há muito tempo
se aninha
no beiral de meu
telhado.
Na solidão em
que vivo,
tem-me sido
companheira:
se estou alegre
e expansivo,
ela sorri
prazenteira;
gira, volteia,
incessante,
chilreando
doidamente.
E vem pousar
sobre a estante,
encarando-me de
frente.
Mas, se o prazer
me deixando,
choro, triste e
desolada,
começa então
pipilando,
como quem
chora... coitada.
A minha
existência insana
é um ente
familiar,
para ser uma
alma humana,
falta-lhe apenas
falar!
Ora, deu-se que,
o outro dia,
o telhado
concertaram
e o ninho (que
covardia!),
em minha
ausência, arrancaram.
Soube o que
havia ocorrido,
logo que em casa
me achei.
O passarinho
sentido
pensou que eu
fui que mandei.
Mas quando, mudo
e sombrio,
sentar-me à mesa
de estudo,
suspirando a ave
me viu,
compreendeu,
então, tudo.
E olhou-me com
tal tristeza,
que eu também
vim a chorar...
Tinha filhos com
certeza:
– só de mãe
aquele olhar!
.......................................................
Mas deixemos a
andorinha,
enxuga o pranto
da face:
– não disse que
tu, louquinha,
choravas, se eu
te contasse?
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