LUÍS
DELFINO
“Imortalidades” (1941)
O AMOR
O amor!... Um sonho, um nome,
uma quimera,
Uma sombra, um perfume, uma
cintila,
Que pendura universos na
pupila,
E eterniza numa alma a
primavera;
Que faz o ninho, e dá
meiguice à fera,
E humaniza o rochedo, e o
bronze, e a argila,
Sem o afago do qual Deus se
aniquila
Dentro da própria luminosa
esfera.
A música dos sóis, o ardor do
verme,
O beijo louco da semente
inerme,
Vulcão, que o vento arrasta
em tênues pós:
Curvas suaves, deslumbrantes
seios
De vida e formas variegadas
cheios,
É o amor em nós, e o amor
fora de nós.
O AMOR E A ETERNIDADE
Helena, o amor não é um sol
bendito,
Não é o idílio dentro de uma
gruta;
É o abismo sem fundo, é a
treva abrupta,
Que se abre em longo e
doloroso grito;
É andar neste exício em que
me agito;
É conhecer a dúvida na luta;
Fala o universo, e temeroso o
escuta
O amor, o pobre escravo do
infinito.
Não ela dor, a dor de idade
em idade;
Quem não ama, e interrompe o
pensamento
De um Deus, emenda-o, e nele
enfim se evade.
Não é mais folha solta
entregue ao vento:
é com amor a vida a
eternidade,
É sem amor a vida um só
momento...
AMOR EXTINTO
É preciso tratar bem a
ventura:
Se eu te arrancasse o meu
amor, querida,
Deixaria em teu flanco uma
ferida,
Por onde, com teu sangue de
mistura,
Saíra morta a tua formosura,
E entrara a dor, verme
agarrado à vida:
A chaga cerra; a cicatriz
perdura:
Nem tu, nem mais ninguém o
caso olvida.
Está sempre o estigma ali,
sempre ali fala,
Cipo de um templo em pé, de
heras coberto,
Junto à tristeza insólita,
que exala
Outra maior talvez, de haver
por perto
Um esqueleto grande em larga
vala,
Um império enterrado num
deserto!...
AMOR E MOCIDADE
Tem, Helena, no amor o seu
poema
À mocidade: é o seu idílio
eterno,
Que faz chorar, que faz que a
voz nos trema,
Que faz que se tirite em frio
inverno
Na quadra do prazer, ante o
galerno
Quente e cheiroso da estação
suprema
Dos risos, em que o azul é
suave e terno
E o sol no meio é coruscante
gema.
Então as folhas límpidas da
vida,
Uma a uma ela a juventude
esfolha:
E uma aqui, outra ali lá jaz
caída
Por vergéis e caminhos, que
após molha
Com prantos, quando volve
atrás e olha,
Sem ver mais uma só visão
querida...
AMOR SEM FIM
Amor nos leva ao céu da vez
primeira;
Amor é o mesmo em todas as
idades:
Momentos cheios de
imortalidades
Amor nos dá de insólita
maneira.
Orfeu nos montes, Pã na selva
inteira
Cantando o amor, e as suas
variedades,
Deram-lhe uma áurea e
triunfal carreira,
Templos lhe erguendo brenhas
e cidades.
Nasceu, Helena, o nosso amor
eterno:
Foi primavera; não terá inverno:
Como nasceu, há de viver
assim.
O nosso amor divinamente
humano
De instante, e hora, e dia, e
mês, e ano
Há de ir, sem ter jamais
parada ou fim.
AMOR ETERNO
Testemunhas sois vós, astros
supernos!
Enquanto eu tiver sede, e tu
quiseres,
Eu tenho em ti milhares de
mulheres,
Helena, ricos mananciais
eternos,
Sempre novos. Não pode haver
invernos,
Enquanto meus prazeres tu
fizeres;
Enquanto tu me dês quanto
tiveres,
E me prometem teus olhares
ternos.
É tua toda minha vida; é tua
Mesmo já quando o sol não
doire a esfera,
Quando a noite não veja a luz
da lua,
Pois fundir-nos em Deus amor
espera,
E aí seremos sempre era após
era,
Quando Ele, enchendo o espaço
e só, flutua.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...