Manoel Maria Barbosa du Bocage – Aspectos biográficos
Texto publicado originalmente na revista "Vamos Ler!", em edição de 1943. Transcrição e atualização ortográfica de Iba Mendes (2018).
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Manoel Maria Barbosa du Bocage, é, sem
qualquer sombra de dúvidas, uma das mais puras e imorredouras vozes líricas da
poesia portuguesa.
Nascido em Setúbal, a 15 de setembro
de 1765, Manoel Maria Barbosa du Bocage era descendente, pelo lado materno, de
uma família da Normandia, donde o aspecto francês de seu nome.
Aos 21 anos, engajou-se como guarda-marinha,
e partiu para as Índias. Ordenaram-lhe que prestasse serviços militares em Damão,
mas Bocage rebelou-se e fugiu, primeiro para Macau, e finalmente para Lisboa,
tendo chegado à metrópole lusa no ano de 1790 — em plena floração da mocidade e
da lira.
Sem qualquer laço que o prendesse em
suas estúrdias, sem nenhuma raiz de família, Bocage deixou-se arrastar por uma
vida de libertinagem e devassidão, o que o levou, no ano de 1797, devido à
publicação do poemeto Pavorosa ilusão da eternidade, ao cárcere do
Limoeiro, onde penou três meses, e depois aos calabouços de Santo Ofício e ao
Mosteiro de São Bento da Saúde.
Entre as suas obras originais, chegaram
até nossos dias, frescas e cantantes, como quando as compôs o poeta: Verdades
singelas ou Voz da Razão; Verdades duras ou Pavorosa ilusão
da eternidade, título do primeiro verso do poemeto; Gratidão, 1805; A
morte de Inês de Castro, cantata lírica, 1824; Medeia, cantata de
1826; Quadras, 1842; Pena de Talião, sátira feroz a José
Agostinho de Macedo, 1838. Em 1853, Inocêncio Ferreira da Silva publicou em
Lisboa os seis volumes de Obras Poéticas de Bocage.
Quanto ao caráter geral da poesia de
Bocage, têm os críticos dito coisas das mais curiosas. Segundo Teófilo Braga, é
Bocage, ao lado de Camões, "o único poeta de quem o povo se lembra,
dando-lhe vida em situações lendária como parasita, vagabundo, repentista
gracioso; e em volta de sua personalidade agrupou todas as velhas anedotas
picarescas da sociedade do século XVIII, bem características do antigo
regime".
Dos que com ele conviveram, muitos escritores
deixaram-nos testemunhos justos sobre a pessoa do poeta, que nunca fez questão
senão de ser "honrado, verdadeiro, liberal, muito amante da sua liberdade
e figadal inimigo da escravidão.”
Bocage, que tinha na Arcádia, o nome
de Elmano Sadino, também se dedicou a traduções de dramas e poemas de línguas
estrangeiras, e passou para o português dramas de Arnaud, poemas de Lacroir e
Castel, as Metamorfoses, de Ovídio, e as Bucólicas, de Virgílio
(fragmentos).
Tendo morrido a 21 de dezembro de
1805, o seu centenário foi comemorado, em 1905, por todo o mundo em que circula
a língua portuguesa.
A crítica moderna ocupa-se dele cada passo,
e a propósito da interpretação viciada do Bocage beberrão e femeeiro, houve
forte ação na imprensa portuguesa, visando reconstituir Bocage na sua figura exata
de altíssimo poeta, de caráter firme, honrado, liberal e patriota.
Revista “Vamos
Ler!”, agosto 1937.
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