Lord Byron e a fatalidade
Texto publicado originalmente na revista "Carioca", em edição de 1942. Transcrição e atualização ortográfica de Iba Mendes (2017)
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Há pessoas
que encarnam, sozinhas, movimentos vitais da humanidade, que personificam as
mais gloriosas viagens do espírito do homem. Se fecharmos os olhos relembrando
o Romantismo, vemos, em toda a sua palidez e seu diabolismo, o rosto belo de
George Gordon, sexto Lord Byron. Ele parece de fato o espelho humano feito para
refletir sua época complexa, melancólica mas ardente, desesperada e idealista,
triste e má.
A grandeza
de Victor Hugo, a fraqueza de Alfred de Musset aniquilando, antes do corpo, o próprio
espírito, num suicídio moral, os delirantes do Romantismo alemão, Lamartine,
todos, todos eles não conseguiram refletir seu tempo com a trágica exatidão com
que o fez Lord Byron.
Há uma
verdadeira biblioteca e de vez em quando surge um novo livro sobre o grande
poeta inglês que fez pasmar seus contemporâneos com seus versos, seu orgulho,
seu "anseio de fatalidade” e suas amantes. Entre todos, talvez, o mais
fascinante livro escrito sobre ele é este "Byron et le Besoin de Ia
Fatalité", de Charles Du Boss, o amigo de André Gide.
Só o
"amor", pelo menos o amor artístico a um tema, pode levar alguém a
escrever o livro — aliás a série — que Du Bos escreveu sobre Byron. Há nele um
verdadeiro luxo de psicologia, uma verdadeira mania de análise, uma verdadeira
determinação de "encontrar" Lord Byron; de, partindo de tudo o que
sua vida exteriorizou, ir buscar um Byron puro, inicial. Tratando-se de quem se
trata, a tarefa é ingente. Byron foi cruel com as amantes; frio, quase com
seres amados por todos como Shelley; incestuoso nas relações com Augusta;
heroico indo morrer pela liberdade grega; banal e vulgar inúmeras vezes...
Mas Charles
Du Bos, neste livro já relativamente antigo, consegue de fato mostrar-nos o
mais puro Byron que já encontramos, o mais interpretado e o mais compreendido. Desde
o título do livro como que temos uma "chave" para entender Byron. Esta
chave foi mesmo "le besoin, de fatalité", o fatalismo temperamental que
o fazia só enxergar estrelas do fundo dos abismos. Mais do que as circunstâncias
de sua vida o levaram, Byron, ele próprio, foi no encontro das suas
fatalidades...
Esse traço
fundamental do grande retrato que de Lord Byron pintou Du Bos é mesmo a viga
mestra da psicologia do poeta. Campo de batalha onde travaram luta renhida
todas as paixões, esta marcha para a fatalidade foi o sistema orientador, o
sentido da sua furiosa passagem por um mundo que não dominou muito mais ainda
porque atraiçoaria assim sua incurável ânsia de fatalidade...
A.
C. CALLADO
Revista
"Carioca", 8 de agosto de 1942.
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