Artigo publicado na revista "Vamos Ler", em edição de 1941. Pesquisa, transcrição e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2018)
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No ano de 1737, na cidade de Mariana, veio ao mundo
José de Santa Rita Durão. Os cursos primário e secundário ele os fez no Colégio
da Companhia de Jesus, no Rio, onde também passou toda a sua infância. A
exemplo do que se verificava com os filhos dos grandes senhores da época, Santa
Rita Durão também foi mandado para Portugal, a fim de instruir-se na célebre
Universidade de Coimbra, por onde diplomou-se em teologia. Muito cedo, sentiu o
nosso herói uma grande vocação pelo claustro e a solidão era para ele o maior
prazer de sua vida recatada. Resolve, por isso, ingressar na ordem dos eremitas
de Santo Agostinho, não tardando a ter seu nome popularizado como um dos
melhores oradores sacros. Uma circunstância veio, porém, perturbar a serenidade
da vida que então levava. D. João Cosme, bispo de Leiria, dera à publicidade
uma pastoral, louvando o ato do Marquês de Pombal expulsando os jesuítas. Santa
Rita Durão que adorava os padres da Companhia de Jesus, não se sentiu disposto
a guardar silêncio ante a campanha movida contra aqueles que o iniciaram na
vida que francamente abraçara. E de público, ele censurou aqueles que atacavam
os jesuítas, valendo-lhes esse seu gesto a inimizade do bispo de Leiria, que
passou a mover-lhe tenaz perseguição. E tão grande tornou-se a perseguição, que
Santa Rita resolveu deixar Portugal, seguindo viagem para a Espanha e depois
Itália.
Por essa época rebenta a guerra entre os reinos de
Portugal e Espanha motivada pelo famoso pacto de família. Durão achava-se,
então, na Espanha. Suspeito de espião, é preso e encarcerado no castelo de Segóvia
até o fim da guerra. Finda a luta, Santa Rita é posto em liberdade, seguindo
então para Roma, onde encontrou-se com Basílio da Gama, em cuja companhia fixou
residência. Depois de uma permanência de alguns anos na tradicional capital
italiana, regressa Durão a Portugal, que experimentava grandes progressos nas
artes, ciências, indústria, comércio e agricultura, promovidos pelo Marquês de
Pombal. A cátedra de teologia da Universidade de Coimbra encontrava-se vaga.
Aberto concurso para o seu preenchimento, consegue Santa Rita destacar-se dos
demais candidatos, sendo então nomeado lente. Na abertura do seu curso recitou
Santa Rita a célebre oração de sapiência, escrita em latim, a qual encerra
notável noções de história e de literatura. Durão nunca abandonou, entretanto,
a sua ordem, o meio de onde saíra e que lhe dera o nome que já então possuía.
Apesar de professor do maior centro de cultura da época, continuou residindo no
convento dos eremitas de Santo Agostinho, chegando mesmo a atingir o grau de
prior. Foi ai, em meio do silêncio do claustro e da melancolia da solidão, que
ele escreveu o seu célebre poema Caramuru,
em cujos versos historia toda a existência de Diogo Álvares Correia. Quis o
destino que o autor dessa grande obra não sobrevivesse por muito à publicação
do poema que segundo ele próprio afirmara “só o amor da pátria” o incitou a
escrever. Na cidade Lisboa termina Santa Rita Durão os seus dias, assistido até
o derradeiro instante por seus companheiros de claustro, aqueles a quem ele
nunca se cansou de amar. Ainda hoje, no hospício de Coleginho, pode-se
contemplar o túmulo desse poeta, tratado com todo o carinho pelos seus irmãos
de Santo Agostinho.
AGNALDO AMADO
"Vamos
Ler!", fevereiro de 1941.
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