Durante o reinado de D. Manuel
o nome oficial foi Província de Santa Cruz.
Uma carta de 1527 traz já
Santa Cruz do Brasil.
Os missionários nunca deixaram
o nome primitivo de Terra ou Província de Santa Cruz.
Está, no entanto, plenamente
verificado que na linguagem comum, e principalmente entre os comerciantes,
desde os primeiros anos se dizia — Terra
do Brasil. E assim se foi, pouco a pouco, esquecendo a primeira
denominação.
Apesar da relutância com que
se deixava o nome de Santa Cruz,
venceu, pois, o de Brasil, ficando
aquele como simples reminiscência histórica, e usado apenas em estilo acadêmico.
Quanto à extensão da terra,
por mais escassas que fossem as explorações feitas durante o reinado do rei venturoso, pode-se ter como já mais ou
menos conhecido em 1521 o relevo marítimo de uma grande parte da América do
Sul, do lado do Atlântico.
E pelo que respeita
particularmente à jurisdição portuguesa, o que se sabe é que durante quase todo
o período colonial nunca se conseguira determinar geograficamente os limites do
domínio pelo meridiano convencional de Tordesilhas.
A conquista alterou ainda
muito os confins com as terras de Espanha; e mesmo depois que a diplomacia
reconheceu, para simplificar o problema de contérminos, o uti possidetis, corrigindo a insuficiência de tratados antigos por
meio de novos convênios, mesmo assim continuou incerta a extensão do país.
Só depois da independência é
que se foram convencionando as linhas definitivas de fronteira com os povos limítrofes;
e esse trabalho delongou-se até os dias da República.
Só hoje, portanto, é que se
pode dar um cálculo aproximado de superfície total do Brasil; parecendo que se
não fica muito longe da verdade estimando-a era cerca de oito milhões e meio de
quilômetros quadrados.
Confinando com quase todos os
países da América do Sul, tem hoje o Brasil o seu vasto contorno continental
perfeitamente fixado.
2 - Quem pudesse abranger de
relance uma miniatura do nosso território, vê-lo-ia limitado, de uma parte, a
oriente, pelo oceano; e da oposta, pelas abas dessa maravilhosa região, que é a
única no globo — a das Cordilheiras como vastas muralhas a separar-nos daquele
outro mundo do Pacífico.
Dos Andes para leste, o solo
como que se vem abaixando até o Atlântico; e os acidentes do relevo desaparecem
na vastidão do continente: a altitude, a extensão, a massa das nossas
serranias, tudo se funde na grandeza do conjunto, para fazer, da porção
americana que ocupamos, uma superfície baixa e uniforme comparada com a zona
andina, e quase na sua totalidade uma
como verdadeira formação sedimentária, devido principalmente àquele descomunal
sistema de montanhas.
Neste amplo cenário parece,
ainda hoje, estar flagrante a história geológica do continente. Pelo menos os
grandes fenômenos da gênese continental se apanham de surpresa, desde a época
em que o hemisfério começou a emergir do oceano primitivo; e mesmo a maneira
como se foi constituindo e integrando até o presente.
Já se tem mesmo como até mais
que provável que as primeiras que apareceram na imensidade vazia devem ter sido
as terras do nosso planalto central e outras altas do país, como as cumeadas
das nossas cordilheiras, que teriam surgido com grandes ilhas no infinito das
águas.
Em seguida, levantaram-se os
Andes (quem sabe se coincidindo com a desaparição da lendária Atlântida!) como
para formar o arcabouço da figura continental.
Em relação às ilhas que lhe
ficavam a leste, deviam os Andes parecer, então, ainda muito mais altos.
Deu-se depois o solevamento
dessas ilhas e de grande parte das terras submarinas que jaziam entre elas e as
Cordilheiras.
Essas terras emergentes foram
apertando contra o baluarte ocidental, e constringindo-a cada vez mais, a
porção de oceano, de cuja existência ficaram vestígios, até hoje, em todo o
nosso interior até os Andes.
É assim que se podem
considerar as grandes bacias divergentes do Amazonas e do Prata como
compreendendo hoje as vastas zonas que estiveram cobertas pelo antigo
mediterrâneo, e que foram emergindo e solidificando à custa principalmente do
desbastamento dos Andes.
Estas ideias já não se reduzem
ao domínio das hipóteses: têm por si a opinião de muitos homens de ciência.
3 - O nosso sistema orográfico, de ordem
secundária no continente, como acabamos de ver, é constituído por duas grandes
cadeias — a marítima e a central —, e pelas montanhas da vertente norte do
Amazonas.
A cordilheira Marítima (ou
Serra do Mar) começa no sul um pouco acima da lagoa dos Patos; e, perlongando a
fita marítima, aproximando-se nuns, e noutros pontos afastando-se mais ou menos
da costa, cai até o Rio Grande do Norte (perto do cabo de São Roque).
Em toda esta longa extensão
(de mais de 500 léguas) amplia-se irregularmente, ou se aperta, e projeta em
muitos pontos grande número de ramais e contrafortes.
Pelas alturas do Rio de
Janeiro, correspondentes, no interior, ao norte de São Paulo e ao sul de Minas,
a ramificação é mais profusa e desordenada, dividindo-se a massa da cordilheira
em duas linhas quase paralelas — a da Marítima propriamente, e a da
Mantiqueira.
A cadeia central, ou das
Vertentes, é ainda mais extensa e complicada, mas é menos notável pela
altitude. Estende-se do extremo noroeste de Mato Grosso, e tomando direção de
sueste, vem até confins de Goiás e de São Paulo, e daí dobra-se para nordeste
até o Ceará.
A Cadeia de Parima (ou das
Guianas) no extremo norte, confins do Brasil com os domínios da França, da
Holanda e da Inglaterra, e com a Venezuela, é a menos considerável.
A nossa nesografia geral
compreende: — ilhas oceânicas (como as de Fernando de Noronha e as da Trindade);
— ilhas costeiras (como a de Marajó, a Caviana, a Mexiana, e outras, no
estuário do Amazonas; a do Maranhão, onde está a cidade de São Luís; Itamaracá,
na costa de Pernambuco; Itaparica, à entrada da baía de Todos os Santos; a do Governador,
na baía do Rio de Janeiro; a ilha Grande; a de São Sebastião, a de São Vicente
e a de Santa Catarina); e ilhas fluviais (como a do Bananal, na bacia do
Tocantins-Araguaia; e grande número de outras no Amazonas, e em todos os nossos
maiores rios).
4 - A nossa potamografia geral pode reduzir-se a
três seções: a amazônica, a platina, e a terceira compreendendo as bacias
secundárias que se não incluem nessas duas.
A do Amazonas — Tocantins é a
mais ampla e opulenta vertente fluvial do mundo: abrange uma região de mais de
oito milhões de quilômetros quadrados, pertencendo ao Brasil mais de dois
terços dessa amplitude. Em Tabatinga, ao entrar em território brasileiro, é de
três quilômetros a largura do rio.
Quando se estreita um pouco, e
sobretudo na época das cheias (de novembro a março), as águas se espalham por
largas redes de furos, canais e lagunas.
Os mais notáveis afluentes do
Amazonas são: o Javari (limite do Brasil com o Peru), o Madeira, o Tapajós, o
Xingu, e o Tocantins (da margem direita); e o Putumaio, o Japurá e o Negro (da
outra).
A bacia do Prata, na parte que
pertence ao Brasil, compreende águas do Paraná, no interior; do Paraguai a
leste; e do Uruguai ao sul.
O maior dos rios que ficam
fora das duas grandes bacias indicadas, é o São Francisco.
Além deste: o Parnaíba (limite
de Maranhão com o Piauí), o Itapicuru, o Apodi, o Doce, o Paraíba do Sul e
outros muitos de menor curso.
A nossa rede fluvial interna é
admirável pela grandeza do teatro que há de abrir à capacidade da raça em
futuro não longínquo.
A Amazônia comunica-se,
através da Venezuela, com o mar das Antilhas; pela Bolívia, pelo Equador e pela
Colômbia, seguindo o curso de numerosos afluentes do rio-oceano, aproxima-se do
Pacífico; e pelos grandes tributários que lhe vão do sul, alcança o Amazonas as
contravertentes do Prata; e por outros, como o Tocantins, ganha o São
Francisco, e por este vem ao Atlântico; alcança ainda o Paraná, e por afluentes
deste chega até a cordilheira marítima, à vista do oceano.
5- Passando à nossa
climatologia geral, o mais que é possível acerca de um país cujo território abrange
quase 40 graus de latitude, a maior parte no hemisfério do sul, é assinalar a
regularidade das modificações que as circunstâncias climatológicas determinam.
Para isso, o que é mais
simples é dividir o país em zonas, onde seja possível reduzir a variedade de
diferenças locais a médias aproximativas, de algum valor para a apreciação do
conjunto.
O critério para tal divisão
tem de fundar-se na própria natureza do país e na proporcionalidade dos vários
elementos que entram na formação dos climas.
Teremos assim: a zona
marítima, compreendendo toda a faixa litorânea, do cabo Orange ao extremo sul;
e a zona do interior.
A primeira é a mais uniforme,
não obstante a desigualdade de latitude.
Uma singularidade notável, e
que é talvez a mais perfeita característica do clima, é sem dúvida a que
consiste na pequena oscilação termométrica que se verifica em todo o nosso
litoral.
As mais completas observações
locais em longos anos registradas dão apenas 3 a 4 graus de diferença entre as
médias, desde o Rio Grande do Sul até o extremo norte.
O clima de toda a costa é
muito semelhante ao do Rio de Janeiro.
Mesmo as ligeiras diferenças
que se notam quase que desaparecem sob a ação das contínuas correntes
atmosféricas que lavam toda a região marítima.
Outra particularidade notável
é que a diferença entre os extremos termométricos é crescente de norte para
sul: e daí resulta a crescente regularidade das estações à medida que se vai do
sul para o norte.
Dá-se ainda um fenômeno, que
parece estranho à primeira vista, mas que é perfeitamente explicável se não
esquecermos que é preciso aqui juntar sempre, ao da latitude, outros vários
coeficientes essenciais do clima: é o aumento da máxima termométrica também de
norte para sul, pelo menos até certa latitude, e em todo o continente. É assim
que, de janeiro a março, se sente muito mais calor em Buenos Aires do que em
Manaus ou Belém.
A zona do interior é muito
mais acidentada; e tem de ser subdividida em três seções: a da bacia amazônica;
a dos chapadões que dividem as águas das duas grandes bacias; e a do sul,
compreendendo os Estados de São Paulo, do Paraná, de Santa Catarina e do Rio
Grande.
No seu aspecto geral, o do
Amazonas é um clima quente, mas muito longe de ser abrasador. A máxima
termométrica só excepcionalmente é que excede ali a 33 graus; e a oscilação é
de 13 a 14. A média é de 26 graus.
Na segunda seção do interior a
média geral fica sempre entre 20 e 25 graus. É esta seção delimitada pelos
paralelos 15 e 24.
Grande parte de São Paulo e
todo o território do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul
constituem a terceira seção. Aqui a média regula por 17 ou 18 graus.
6 - No Brasil é fácil
determinar o valor do regime dos ventos como fator decisivo do clima. Aqui, a
terra, entre o oceano e os Andes, produz deslocações muito regulares. A
atmosfera sobre o mar é muito mais fria do que em terra. Mais fria ainda é a
camada vizinha das Cordilheiras. Entre umas
e outras massas de baixa temperatura,
fica o nosso ambiente continental, de temperatura em regra mais elevada. Daí a
regularidade das duas correntes gerais, que explicam o que tem de particular o
nosso clima — a que nos vem do Atlântico e a que sopra dos Andes, e que,
encontrando-se, tomam rumo para o norte ou para o sul.
E aí estão os quatro ventos
gerais dominantes: os alísios, os de leste, os do sul e os do norte — é claro
que sujeitos às variações devidas à intercorrência de causas secundárias
derivativas.
Este regime dos ventos
determina a frequência e a quantidade de chuvas em todo o país. Na parte da
costa onde dominam os alísios livres da cordilheira marítima {da Paraíba para
além) há muito mais irregularidades que no resto até o sul. Daí talvez as condições
excepcionais daquele trecho sob o ponto de vista meteorológico. Por ali tanto
se conhecem longas chuvas torrenciais
como grandes secas.
Ao regime das chuvas
correspondem a frequência e intensidade das trovoadas. Ainda sob este aspecto a
nossa meteorologia geral pode ser discriminada em grandes zonas: a costeira, a
contígua formada pelas serranias paralelas no litoral, e a do interior.
A medida que se vem do norte
para o sul, na primeira zona, são mais frequentes as trovoadas. Nos pontos da
costa onde a cordilheira marítima corre mais distante do oceano (mesmo no Rio
de Janeiro), as trovoadas são, no entanto, raras. Nos pontos onde a serra é
mais elevada, há paragens em que, durante os meses de novembro a março, troveja
quase diariamente.
Na zona do interior, quanto a
trovoadas, dá-se o mesmo que assinalamos quanto às chuvas. Em regra, é o relevo
orográfico, depois do regime dos ventos, o que regula melhor a frequência das
trovoadas. É assim que mesmo no interior, em regiões de planura, o fenômeno não
é tão frequente. Quanto, porém, mais nos aproximamos dos Andes, vai sendo, não só
mais frequente, como de mais violência.
Uma ordem de fenômenos, da
física terrestre, quase desconhecidos no Brasil, é o de movimentos sísmicos.
Não se tem notícia até hoje senão de vagos tremores, que nunca passaram de
repercussões de terremotos nos Andes.
7 - Das condições físicas aí
ligeiramente esboçadas decorre a salubridade geral do país. Todos os cronistas
dos primeiros séculos têm uma só palavra de admiração pela excelência da terra.
O único mal que atacava os
índios em certas situações era a malária. Mas, esse mesmo não se conhecia nos
núcleos policiados.
Com o tempo isso mudou.
Aumentava a população, formavam-se grandes centros, que se punham em
comunicações com outros portos do exterior, e sem que a essas mudanças
correspondessem medidas de cautela contra os "ares novos" que assim
se iam criando.
Começamos, pois, a perder,
desde o século XVI, a nossa imunidade contra invasões de epidemias; e para
isso, além das causas referidas, concorria também a importação de africanos em
massa.
Por cerca de duzentos anos (de
1666 a 1880) os morbos que nos invadiram quase todos levaram a flagelar-nos
periodicamente; e alguns, de certa época em diante, com insistência tal que
chegaram a persuadir de que se tratava mesmo de males endêmicos, ou quando
menos, de epidemias sempre iminentes, de modo especial o da febre amarela, que
todo mundo acreditava ser o nosso grande inimigo, e que afinal foi
completamente extinta em todo o país.
E uma observação que a ninguém
escapa é que, desde que começamos a proscrever a velha desídia por tudo quanto
respeita à higiene e à saúde pública, também melhorou a salubridade geral do
nosso meio. A julgar pela coragem com que se reage em toda parte contra a
incúria colonial, tudo nos autoriza a confiar que o Brasil vai ser em breve
outra vez o que foi como natureza — terra capaz de criar homens fortes e sãos, tal
como a encontraram os primeiros europeus que vieram aqui viver.
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