Uma opinião de peso
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
---
Na sala familiar de sua vasta
casa, mais cheia de bugigangas novas e esquisitas do que a Exposição da Arte
Retrospectiva, o venerável estadista, senador Faltanho da Consideração,
conversava com o seu amigo e discípulo Arantes Borromeu sobre os graves
problemas políticos, econômicos e sociais da nossa terra.
Sua filha Brunehilda, sentada a
uma cadeira de balanço, ouvia a conversa ou melhor contemplava o bacharel
Borromeu, cujo talento fora muito gabado na Academia, mas que adiava a sua
estreia na Câmara, por motivos que ele claramente confessava.
— Você, Borromeu, por que não
estreia na Câmara? Tem havido tantas questões interessantes... Você deve
aproveitar.
Ao amigo que assim lhe falava,
Arantes respondia:
— Estou ainda aprendendo.
— Como? Pois se você era o primeiro
orador do seu tempo, na faculdade? Como é isso?
— Aquilo era oratória de
estudante. Na Câmara, preciso outro estilo... Estou perdendo o ranço de
“acadêmico”, por ora!
A Srta. Brunehilda, porém, sabia
perfeitamente que são os deputados obscuros os que mantêm duradouramente o
mandato e, muitas vezes, sobem, além do que se espera.
De resto, seu pai mandava no
estado de...; e, sendo seu marido Borromeu, naturalmente ela seria durante toda
a vida mulher de deputado, se não fosse de senador, de ministro e — quem sabe?
— de presidente da República.
Os dois políticos continuavam a
conversar naquele vasto salão de uma vasta casa; e a moça ao lado permanecia
calada.
Borromeu observou:
— Uma das dificuldades para um
bom governo nesta terra é não haver um regular serviço de estatística. Não acha
vossa excelência?
— É; não há dúvida! Era preciso
que os dados fossem fornecidos com mais constância e fossem mais completos e
variados... Nos Estados Unidos...
— Não é preciso ir aos Estados
Unidos; São Paulo possui um belo serviço; e, se o Cincinato brilha com os seus
discursos de verdadeiro ministro do Fomento, ele o deve à perfeição de tal
serviço.
— Concordo contigo, Borromeu; mas
é preciso ver o campo de ação de um estado e o da União.
— Vossa excelência tem razão. O
governo federal, em face de qualquer estado, abrange um mundo.
— Há, entretanto, um serviço de
estatística, mantido pela União, que é digno de elogios.
— Qual é?
— É o de estatística comercial.
Conhecia?
— A repartição, de nome: mas,
publicações dela não vi jamais uma sequer.
— Pois tenho aqui, organizado por
ela, um boletim estatístico do comércio do Brasil com a França, durante os nove
primeiros meses de 1920.
— Aumentou a nossa exportação? Vossa
excelência que leu...
— Ao contrário: diminuiu de 194
milhões de francos, em período idêntico de 1919.
— E a importação?
— Aumentou terrivelmente,
principalmente em objetos de luxo. Nos nove primeiros meses do ano anterior
havíamos comprado à França sedas no valor de cinco milhões; e, em igual período
de 1920, a importação foi de fr. 2 milhões.
— É incrível!
— Pois é verdade, meu caro filho.
E joias, então?
— Devia, como já foi lembrado,
ser proibida a importação desses artigos. Até aí a filha do senador se havia
mantido calada. Mas, quando o Licurgo Arantes aventou a medida de tal
proibição, ela o aparteou com veemência:
— Com que nós nos havíamos de
vestir? Isso não pode passar!
Arantes não apresentou projeto
algum a respeito, e casou meses após, para felicidade dele, dela e do... povo,
com a Srta. Brunehilda da Consideração. Houve mirra e prédica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...