Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Ochefe político do distrito de
Anunciação, Felizardo José Senomenho, teve a ventura de obter do seu casal
quatro filhos varões: Manoel, José, Otávio e Carlos.
Lido como era nos Doze pares de França, o coronel sonhou
logo com os quatros filhos célebres d’Ay mon e desejou para os seus a glória
dos paladinos filhos deste.
Infelizmente, o nosso tempo não
pede guerreiros esforçados e invencíveis que andem pelo mundo a batalhar em
prol de um qualquer Carlos Magno. Pensou bem e viu que os quatro deviam ser
encaminhados para a política, porque só na política, atualmente, se obtêm
glórias retumbantes e proventos magníficos, mais magníficos do que os despojos
de reis mouros com suas mulheres estonteantes.
O primeiro trabalho de Felizardo
foi fazer os seus quatro descendentes bacharéis em direito ou coisa que o valha
— o que não lhe foi difícil, graças à vivacidade dos pequenos e a importância
social do coronel.
Sua mulher viu um a um chegarem
em casa formados nisto ou naquilo, em “escadinha”, com a regularidade anual do
nascimento deles.
Este fato contentou os dois velhos
de tal forma que, nos primeiros anos, os rapazolas nada mais fizeram que
divertir-se à grande nas fazendas dos pais e na capital do estado.
Um belo dia, porém, Felizardo
chamou o mais velho e disse:
— Maneco, já falei ao Magalão.
Sabes quem é? O presidente do estado. Tu vais ser o seu oficial de gabinete e
na próxima legislatura serás deputado.
Maneco fez malas, pois estava na
fazenda do papai e, em breve, sorria bondosamente aos pedintes, nas antessalas
do Palácio das Graças, na capital.
Não tardou que Felizardo viesse a
ver o seu notável rebento em lugar de tanta importância. Satisfez-se com os
modos, a um tempo doces e majestosos do filho, dentro do seu fraque talhado no
Rio, e tratou de encaminhar o José.
Este andava pela capital a
publicar versos inócuos em revistas de grandes descortinos. Procurou-o o pai no
seu aposento de solteiro e disse-lhe:
— Rapaz, esta vida não te serve.
Precisas fazer-te gente.
— Trabalho, papai.
— Em quê?
— Na arte.
— Que é isto? Nada; vais entrar
para a redação da Folha Independente.
— Como? Se ela é da oposição e o
senhor é do governo?
— Não tem nada. Vais entrar e
trabalhar com o senador Mariano. Veste-te. O José queria muito entrar para um
grande jornal e seguiu contente.
Felizardo entendeu-se com Mariano
e, no dia seguinte, o filho estreava com uma formidável descompostura ao
presidente do estado.
O coronel tinha já encaminhado os
dois; restava a outra metade. Resolveu-se a esperar. Acontece, semanas depois
da colocação do Zeca, que o chefe de polícia, por causa de um assassinato,
prende o principal capanga do senador estadual Juventino, amigo íntimo de
Magalão.
Juventino não obtém o
“abafamento” do processo; zanga-se com Magalão, por essa falta de consideração
aos seus amigos e briga. Houve a cisão no partido situacionista, devido a
divergências sobre os cardeais princípios da política republicana.
Felizardo, que era sabido,
determinou ao terceiro que aderisse a Juventino, sem detença. A coisa foi
feita. Estava encaminhado.
Restava o quarto. Como havia de ser?
Esperou uns tempos. Veio a dar-se que Brochado, deputado federal, grande amigo
de Mariano, rompe com este e funda na capital do estado uma folha, para
combater Mariano, Magalão e Justino. Felizardo agarra no último dos filhos e
coloca na folha de Brochado.
Estavam, afinal, os quatro
encaminhados. Vieram as eleições federais. Manoel, José, Otávio e Carlos foram
apresentados candidatos a deputado, respectivamente, por Magalão, Mariano,
Juventino e Brochado. Houve acordo no reconhecimento; e os filhos de Felizardo,
a um só tempo, sentaram-se na Câmara dos Deputados.
Não chegaram a paladinos; mas
foram pais da pátria.
Parece que foi escrito hoje para família Bolsonaro
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