O noivado
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Era uma tarde tranquila e fresca de maio.
Um grupo
alegre e festivo de gente de aldeia, à frente do qual vinha uma rapariga de
branco pelo braço de um rapaz grosso e desajeitado, de sorriso triunfal, metido
no talhe esquisito de um arruinado fraque de pano, ainda luzente nas costuras
da última passagem ferro — descia, lento e palrador, o adro da igrejinha
amarela onde pastava o “baio” do cura, sossegado e feliz, erguendo de vez em
quando a cabeça e voltando o pescoço para olhar aquela boa família em festa que
por ali passava.
O ruído fino e miúdo de um
pequeno sino pendendo de uma corda amarrada a um travessão de madeira firmado
em dois paus ao alto, ao lado direito do pequenino templo — vibrava vivo no ar,
num contentamento de sons que o badalo fazia, desforrando-se da longa mudez
melancólica, a que o condenava a raridade das festas. E assim tangendo-o, numa
preocupação de profissional e de artista, o sacristão esforçava-se, jogando
destramente ao espaço esfuziadas de notas nítidas e bem ritmadas.
Na frente
dos noivos corriam pela estrada, dispersos, numa imensa e jocunda algazarra, os
meninos da vizinhança, antegostando já, na sua gulodice insaciável e
devoradora, o sabor das deliciosas broas de polvilho, tão comuns nessas bodas
dos sítios, tão torradas e tão tenras que se esfarelam no paladar.
Moças
curiosas, saudáveis e de faces da cor dos morangos maduros, o olhar aceso e
inquieto, assistiam à passagem do noivado com risinhos maliciosos e espertos, a
beliscarem-se entre si, num cochicho zumbidor de colmeia, debruçadas nas
porteiras.
Os canários
loiros, os pardos que amarelam ao sol meses depois de nascidos, e os coleiros
luzidios que devoram, em bandos rapinantes, os arrozais viçosos pelas margens
dos banhados — chilreavam alegremente nos espinheiros da estrada, onde as
roseiras silvestres, tocadas de florzinhas de nácar, se misturavam às
perfumosas boas-noites, estrelando festivamente as cercas com as suas pétalas
sulferinas e de um recorte delicado.
No céu o sol
escondia já a sua luz mágica e de ouro por trás dos montes de oeste.
E daí a
instantes a cinza fina do crepúsculo principiava a cair, negra, silenciosa e
nostálgica...
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