O homem que sabia Javanês
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
Em uma confeitaria, certa vez, ao
meu amigo Castro, contava eu as partidas que havia pregado às convicções e às
respeitabilidades, para poder viver.
Houve mesmo, uma dada ocasião,
quando estive em Manaus, em que fui obrigado a esconder a minha qualidade de
bacharel, para mais confiança obter dos clientes, que afluíam ao meu escritório
de feiticeiro e adivinho. Contava eu isso.
O meu amigo ouvia-me calado,
embevecido, gostando daquele meu Gil Blas vivido, até que, em uma pausa da
conversa, ao esgotarmos os copos, observou a esmo:
— Tens levado uma vida bem
engraçada, Castelo!
— Só assim se pode viver... Isto
de uma ocupação única: sair de casa a certas horas, voltar a outras, aborrece,
não achas? Não sei como me tenho aguentado lá, no consulado!
— Cansa-se; mas, não é disso que
me admiro. O que me admira, é que tenhas corrido tantas aventuras aqui, neste
Brasil imbecil e burocrático.
— Qual! Aqui mesmo, meu caro
Castro, se podem arranjar belas páginas de vida. Imagina tu que eu já fui professor
de javanês!
— Quando? Aqui, depois que
voltaste do consulado?
— Não; antes. E, por sinal, fui
nomeado cônsul por isso.
— Conta lá como foi. Bebes mais
cerveja?
— Bebo.
Mandamos buscar mais outra
garrafa, enchemos os copos, e continuei:
— Eu tinha chegado havia pouco ao
Rio estava literalmente na miséria. Vivia fugido de casa de pensão em casa de
pensão, sem saber onde e como ganhar dinheiro, quando li no Jornal do Comércio o anúncio seguinte:
"Precisa-se de um professor
de língua javanesa. Cartas, etc."
Ora, disse cá comigo, está ali
uma colocação que não terá muitos concorrentes; se eu capiscasse quatro
palavras, ia apresentar-me. Saí do café e andei pelas ruas, sempre a
imaginar-me professor de javanês, ganhando dinheiro, andando de bonde e sem
encontros desagradáveis com os "cadáveres". Insensivelmente dirigi-me
à Biblioteca Nacional. Não sabia bem que livro iria pedir; mas, entrei,
entreguei o chapéu ao porteiro, recebi a senha e subi. Na escada, acudiu-me
pedir a Grande Encyclopédie, letra J,
a fim de consultar o artigo relativo a Java e a língua javanesa. Dito e feito.
Fiquei sabendo, ao fim de alguns minutos, que Java era uma grande ilha do
arquipélago de Sonda, colônia holandesa, e o javanês, língua aglutinante do
grupo malaio-polinésico, possuía uma literatura digna de nota e escrita em
caracteres derivados do velho alfabeto hindu.
A Encyclopédie dava-me indicação de trabalhos sobre a tal língua
malaia e não tive dúvidas em consultar um deles. Copiei o alfabeto, a sua
pronunciação figurada e saí. Andei pelas ruas, perambulando e mastigando
letras.
Na minha cabeça dançavam
hieróglifos; de quando em quando consultava as minhas notas; entrava nos
jardins e escrevia estes calungas na areia para guardá-los bem na memória e
habituar a mão a escrevê-los.
À noite, quando pude entrar em
casa sem ser visto, para evitar indiscretas perguntas do encarregado, ainda
continuei no quarto a engolir o meu "A-B-C" malaio, e, com tanto
afinco levei o propósito que, de manhã, o sabia perfeitamente.
Convenci-me que aquela era a
língua mais fácil do mundo e saí; mas não tão cedo que não me encontrasse com o
encarregado dos aluguéis dos cômodos:
— Senhor Castelo, quando salda a
sua conta?
Respondi-lhe então eu, com a mais
encantadora esperança:
— Breve... Espere um pouco...
Tenha paciência... Vou ser nomeado professor de javanês, e...
Por aí o homem interrompeu-me:
— Que diabo vem a ser isso,
Senhor Castelo?
Gostei da diversão e ataquei o
patriotismo do homem:
— É uma língua que se fala lá
pelas bandas do Timor. Sabe onde é?
Oh! alma ingênua! O homem
esqueceu-se da minha dívida e disse-me com aquele falar forte dos portugueses:
— Eu cá por mim, não sei bem; mas
ouvi dizer que são umas terras que temos lá para os lados de Macau. E o senhor
sabe isso, Senhor Castelo?
Animado com esta saída feliz que
me deu o javanês, voltei a procurar o anúncio. Lá estava ele. Resolvi
animosamente propor-me ao professorado do idioma oceânico. Redigi a resposta,
passei pelo Jornal e lá deixei a carta. Em seguida, voltei à biblioteca e
continuei os meus estudos de javanês. Não fiz grandes progressos nesse dia, não
sei se por julgar o alfabeto javanês o único saber necessário a um professor de
língua malaia ou se por ter me empenhado mais na bibliografia e história
literária do idioma que ia ensinar.
Ao cabo de dois dias, recebia eu
uma carta para ir falar ao doutor Manuel Feliciano Soares Albernaz, Barão de
Jacuecanga, à Rua Conde de Bonfim, não me recordo bem que número. E preciso não
te esqueceres que entrementes continuei estudando o meu malaio, isto é, o tal
javanês. Além do alfabeto, fiquei sabendo o nome de alguns autores, também
perguntar e responder "como está o senhor?" — e duas ou três regras
de gramática, lastrado todo esse saber com vinte palavras do léxico.
Não imaginas as grandes
dificuldades com que lutei, para arranjar os quatrocentos réis da viagem! É
mais fácil — podes ficar certo — aprender o javanês... Fui a pé. Cheguei
suadíssimo; e, com maternal carinho, as anosas mangueiras, que se perfilavam em
alameda diante da casa do titular, me receberam, me acolheram e me
reconfortaram. Em toda a minha vida, foi o único momento em que cheguei a
sentir a simpatia da natureza...
Era uma casa enorme que parecia
estar deserta; estava mal tratada, mas não sei porque me veio pensar que nesse
mau tratamento havia mais desleixo e cansaço de viver que mesmo pobreza. Devia
haver anos que não era pintada. As paredes descascavam e os beirais do telhado,
daquelas telhas vidradas de outros tempos, estavam desguarnecidos aqui e ali,
como dentaduras decadentes ou malcuidadas.
Olhei um pouco o jardim e vi a
pujança vingativa com que a tiririca e o carrapicho tinham expulsado os
tinhorões e as begônias. Os crótons continuavam, porém, a viver com a sua
folhagem de cores mortiças.
Bati. Custaram-me a abrir. Veio,
por fim, um antigo preto africano, cujas barbas e cabelo de algodão davam à sua
fisionomia uma aguda impressão de velhice, doçura e sofrimento.
Na sala, havia uma galeria de
retratos: arrogantes senhores de barba em colar se perfilavam enquadrados em
imensas molduras douradas, e doces perfis de senhoras, em bandós, com grandes
leques, pareciam querer subir aos ares, enfunadas pelos redondos vestidos à
balão; mas, daquelas velhas coisas, sobre as quais a poeira punha mais antiguidade
e respeito, a que gostei mais de ver foi um belo jarrão de porcelana da China
ou da Índia, como se diz. Aquela pureza da louça, a sua fragilidade, a
ingenuidade do desenho e aquele seu fosco brilho de luar, diziam-me a mim que
aquele objeto tinha sido feito por mãos de criança, a sonhar, para encanto dos
olhos fatigados dos velhos desiludidos...
Esperei um instante o dono da
casa. Tardou um pouco. Um tanto trôpego, com o lenço de alcobaça na mão,
tomando veneravelmente o simonte de antanho, foi cheio de respeito que o vi
chegar. Tive vontade de ir-me embora. Mesmo se não fosse ele o discípulo, era
sempre um crime mistificar aquele ancião, cuja velhice trazia à tona do meu
pensamento alguma coisa de augusto, de sagrado. Hesitei, mas fiquei.
— Eu sou, avancei, o professor de
javanês, que o senhor disse precisar.
— Sente-se, respondeu-me o velho.
O senhor é daqui, do Rio?
— Não, sou de Canavieiras.
— Como? fez ele. Fale um pouco
alto, que sou surdo, — Sou de Canavieiras, na Bahia, insisti eu. Onde fez os
seus estudos?
— Em São Salvador.
— Em onde aprendeu o javanês?
indagou ele, com aquela teimosia peculiar aos velhos.
Não contava com essa pergunta,
mas imediatamente arquitetei uma mentira. Contei-lhe que meu pai era javanês.
Tripulante de um navio mercante, viera ter à Bahia, estabelecera-se nas
proximidades de Canavieiras como pescador, casara, prosperara e fora com ele
que aprendi javanês.
— E ele acreditou? E o físico?
perguntou meu amigo, que até então me ouvira calado.
— Não sou, objetei, lá muito
diferente de um javanês. Estes meus cabelos corridos, duros e grossos e a minha
pele basané podem dar-me muito bem o aspecto de um mestiço de malaio... Tu
sabes bem que, entre nós, há de tudo: índios, malaios, taitianos, malgaches,
guanches, até godos. É uma comparsaria de raças e tipos de fazer inveja ao
mundo inteiro.
— Bem, fez o meu amigo, continua.
— O velho, emendei eu, ouviu-me
atentamente, considerou demoradamente o meu físico, pareceu que me julgava de
fato filho de malaio e perguntou-me com doçura:
— Então está disposto a
ensinar-me javanês?
— A resposta saiu-me sem querer:
— Pois não.
— O senhor há de ficar admirado,
aduziu o Barão de Jacuecanga, que eu, nesta idade, ainda queira aprender
qualquer coisa, mas...
— Não tenho que admirar. Têm-se
visto exemplos e exemplos muito fecundos?...
— O que eu quero, meu caro
senhor...
— Castelo, adiantei eu.
— O que eu quero, meu caro Senhor
Castelo, é cumprir um juramento de família. Não sei se o senhor sabe que eu sou
neto do Conselheiro Albernaz, aquele que acompanhou Pedro I, quando abdicou.
Voltando de Londres, trouxe para aqui um livro em língua esquisita, a que tinha
grande estimação. Fora um hindu ou siamês que lho dera, em Londres, em
agradecimento a não sei que serviço prestado por meu avô. Ao morrer meu avô,
chamou meu pai e lhe disse: "Filho, tenho este livro aqui, escrito em
javanês. Disse-me quem mo deu que ele evita desgraças e traz felicidades para
quem o tem. Eu não sei nada ao certo. Em todo o caso, guarda-o; mas, se queres
que o fado que me deitou o sábio oriental se cumpra, faze com que teu filho o
entenda, para que sempre a nossa raça seja feliz." Meu pai, continuou o
velho Barão, não acreditou muito na história; contudo, guardou o livro. Às
portas da morte, ele mo deu e disse-me o que prometera ao pai. Em começo, pouco
caso fiz da história do livro. Deitei-o a um canto e fabriquei minha vida.
Cheguei até a esquecer-me dele; mas, de uns tempos a esta parte, tenho passado
por tanto desgosto, tantas desgraças têm caído sobre a minha velhice que me
lembrei do talismã da família. Tenho que o ler, que o compreender, se não quero
que os meus últimos dias anunciem o desastre da minha posteridade; e, para
entendê-lo, é claro, que preciso entender o javanês. Eis aí.
Calou-se e notei que os olhos do
velho se tinham orvalhado. Enxugou discretamente os olhos e perguntou-me se
queria ver o tal livro. Respondi-lhe que sim. Chamou o criado, deu-lhe as
instruções e explicou-me que perdera todos os filhos, sobrinhos, só lhe
restando uma filha casada, cuja prole, porém, estava reduzida a um filho, débil
de corpo e de saúde frágil e oscilante.
Veio o livro. Era um velho
calhamaço, um in-quarto antigo, encadernado em couro, impresso em grandes
letras, em um papel amarelado e grosso. Faltava a folha do rosto e por isso não
se podia ler a data da impressão. Tinha ainda umas páginas de prefácio,
escritas em inglês, onde li que se tratava das histórias do príncipe Kulanga,
escritor javanês de muito mérito.
Logo informei disso o velho Barão
que, não percebendo que eu tinha chegado aí pelo inglês, ficou tendo em alta
consideração o meu saber malaio. Estive ainda folheando o cartapácio, à laia de
quem sabe magistralmente aquela espécie de vasconço, até que afinal contratamos
as condições de preço e de hora, comprometendo-me a fazer com que ele lesse o
tal alfarrábio antes de um ano.
Dentro em pouco, dava a minha
primeira lição, mas o velho não foi tão diligente quanto eu. Não conseguia
aprender a distinguir e a escrever nem sequer quatro letras. Enfim, com metade
do alfabeto levamos um mês e o Senhor Barão de Jacuecanga não ficou lá muito
senhor da matéria: aprendia e desaprendia.
A filha e o genro (penso que até
aí nada sabiam da história do livro) vieram a ter notícias do estudo do velho;
não se incomodaram. Acharam graça e julgaram a coisa boa para distraí-lo.
Mas com o que tu vais ficar
assombrado, meu caro Castro, é com a admiração que o genro ficou tendo pelo
professor de javanês. Que coisa Única! Ele não se cansava de repetir: “É um
assombro! Tão moço! Se eu soubesse isso, ah! onde estava!”
O marido de Dona Maria da Glória
(assim se chamava a filha do Barão), era desembargador, homem relacionado e
poderoso; mas não se pejava em mostrar diante de todo o mundo a sua admiração
pelo meu javanês. Por outro lado, o Barão estava contentíssimo. Ao fim de dois
meses, desistira da aprendizagem e pedira-me que lhe traduzisse, um dia sim
outro não, um trecho do livro encantado. Bastava entendê-lo, disse-me ele; nada
se opunha que outrem o traduzisse e ele ouvisse. Assim evitava a fadiga do
estudo e cumpria o encargo.
Sabes bem que até hoje nada sei
de javanês, mas compus umas histórias bem tolas e impingi-as ao velhote como
sendo do crônicon. Como ele ouvia aquelas bobagens!...
Ficava extático, como se estivesse
a ouvir palavras de um anjo. E eu crescia aos seus olhos!
Fez-me morar em sua casa,
enchia-me de presentes, aumentava-me o ordenado. Passava, enfim, uma vida
regalada.
Contribuiu muito para isso o fato
de vir ele a receber uma herança de um seu parente esquecido que vivia em
Portugal. O bom velho atribuiu a coisa ao meu javanês; e eu estive quase a
crê-lo também.
Fui perdendo os remorsos; mas, em
todo o caso, sempre tive medo que me aparecesse pela frente alguém que soubesse
o tal patuá malaio. E esse meu temor foi grande, quando o doce Barão me mandou
com uma carta ao Visconde de Caruru, para que me fizesse entrar na diplomacia.
Fiz-lhe todas as objeções: a minha fealdade, a falta de elegância, o meu
aspecto tagalo. — "Qual! retrucava ele. Vá, menino; você sabe
javanês!" Fui. Mandou-me o visconde para a Secretaria dos Estrangeiros com
diversas recomendações. Foi um sucesso.
O diretor chamou os chefes de
secção: "Vejam só, um homem que sabe javanês — que portento!"
Os chefes de secção levaram-me
aos oficiais e amanuenses e houve um destes que me olhou mais com ódio do que
com inveja ou admiração. E todos diziam: "Então sabe javanês? É difícil?
Não há quem o saiba aqui!"
O tal amanuense, que me olhou com
ódio, acudiu então: "É verdade, mas eu sei canaque. O senhor sabe?"
Disse-lhe que não e fui à presença do ministro.
A alta autoridade levantou-se,
pôs as mãos às cadeiras, concertou o pince-nez no nariz e perguntou:
"Então, sabe javanês?" Respondi-lhe que sim; e, à sua pergunta onde o
tinha aprendido, contei-lhe a história do tal pai javanês. "Bem, disse-me
o ministro, o senhor não deve ir para a diplomacia; o seu físico não se
presta... O bom seria um consulado na Ásia ou Oceania. Por ora, não há vaga,
mas vou fazer uma reforma e o senhor entrará. De hoje em diante, porém, fica
adido ao meu ministério e quero que, para o ano, parta para Bâle, onde vai
representar o Brasil no Congresso de Linguística. Estude, leia o Hovelacque, o
Max Muller, e outros!"
Imagina tu que eu até aí nada
sabia de javanês, mas estava empregado e iria representar o Brasil em um
congresso de sábios.
O velho Barão veio a morrer,
passou o livro ao genro para que o fizesse chegar ao neto, quando tivesse a
idade conveniente e fez-me uma deixa no testamento.
Pus-me com afã no estudo das
línguas maleo-polinésicas; mas não havia meio!
Bem jantado, bem vestido, bem
dormido, não tinha energia necessária para fazer entrar na cachola aquelas
coisas esquisitas. Comprei livros, assinei revistas: Revue Anthropologique et Linguistique, Proceedings of the English-Oceanic
Association, Archivo Glottologico Italiano, o diabo, mas nada! E a minha
fama crescia. Na rua, os informados apontavam-me, dizendo aos outros: "Lá
vai o sujeito que sabe javanês." Nas livrarias, os gramáticos
consultavam-me sobre a colocação dos pronomes no tal jargão das ilhas de Sonda.
Recebia cartas dos eruditos do interior, os jornais citavam o meu saber e
recusei aceitar uma turma de alunos sequiosos de entenderem o tal javanês. A
convite da redação, escrevi, no Jornal do
Comércio um artigo de quatro colunas sobre a literatura javanesa antiga e
moderna...
— Como, se tu nada sabias?
interrompeu-me o atento Castro.
— Muito simplesmente:
primeiramente, descrevi a ilha de Java, com o auxílio de dicionários e umas
poucas de geografias, e depois citei a mais não poder.
— E nunca duvidaram? perguntou-me
ainda o meu amigo.
— Nunca. Isto é, uma vez quase
fico perdido. A polícia prendeu um sujeito, um marujo, um tipo bronzeado que só
falava uma língua esquisita. Chamaram diversos intérpretes, ninguém o entendia.
Fui também chamado, com todos os respeitos que a minha sabedoria merecia,
naturalmente. Demorei-me em ir, mas fui afinal. O homem já estava solto, graças
à intervenção do cônsul holandês, a quem ele se fez compreender com meia dúzia
de palavras holandesas. E o tal marujo era javanês — uf!
Chegou, enfim, a época do
congresso, e lá fui para a Europa. Que delícia! Assisti à inauguração e às
sessões preparatórias. Inscreveram-me na secção do tupi-guarani e eu abalei
para Paris. Antes, porém, fiz publicar no Mensageiro
de Bâle o meu retrato, notas biográficas e bibliográficas. Quando voltei, o
presidente pediu-me desculpas por me ter dado aquela secção; não conhecia os
meus trabalhos e julgara que, por ser eu americano brasileiro, me estava
naturalmente indicada a secção do tupi-guarani. Aceitei as explicações e até
hoje ainda não pude escrever as minhas obras sobre o javanês, para lhe mandar,
conforme prometi.
Acabado o congresso, fiz publicar
extratos do artigo do Mensageiro de Bâle,
em Berlim, em Turim e Paris, onde os leitores de minhas obras me ofereceram um
banquete, presidido pelo Senador Gorot. Custou-me toda essa brincadeira,
inclusive o banquete que me foi oferecido, cerca de dez mil francos, quase toda
a herança do crédulo e bom Barão de Jacuecanga.
Não perdi meu tempo nem meu
dinheiro. Passei a ser uma glória nacional e, ao saltar no cais Pharoux, recebi
uma ovação de todas as classes sociais e o presidente da república, dias
depois, convidava-me para almoçar em sua companhia.
Dentro de seis meses fui
despachado cônsul em Havana, onde estive seis anos e para onde voltarei, a fim
de aperfeiçoar os meus estudos das línguas da Malaia, Melanésia e Polinésia.
— É fantástico, observou Castro,
agarrando o copo de cerveja.
— Olha: se não fosse estar
contente, sabes que ia ser?
— Quê?
— Bacteriologista eminente. Vamos?
— Vamos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...