Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Acidade de L. era uma cidade
muito pobre que vivia sempre a pedir dinheiro emprestado, usando de expedientes
dignos dos mais célebres “facadistas” de rua.
Dinheiro depositado nos cofres,
era dinheiro sumido e ninguém sabia para onde ele ia.
Entretanto, para servir aos
interesses do chefe político Leitão, a sua municipalidade possuía um exército
de funcionários e até os seus vereadores eram pagos regiamente.
Justificava-se esse pagamento
pela carência absoluta de homens ricos que quisessem ocupar os lugares de edis,
de modo que só os pobres concorriam a eles e precisavam do subsídio para
manter-se.
Como esses pobres tivessem muitos
parentes, naturalmente também pobres, os vereadores tinham necessidade de
colocar os filhos, sobrinhos, primos, netos, genros etc.
Para isso, não encontravam outro
caminho senão criar lugares na secretaria do conselho e o faziam com abundância
e tenacidade.
A cada conselho novo correspondia
nova reforma na secretaria e a criação de mais meia dúzia de oficiais,
amanuenses, redatores de debates, taquígrafos etc., e de tal forma que a Câmara
Municipal de L. veio a ter mais empregados na sua secretaria que o Senado e a
Câmara federais nas deles.
Lembrem-se bem de que esses dois
últimos corpos legislativos não são parcimoniosos em tal assunto, embora
estejam sempre dispostos a censurar a burocratomania do Executivo e do
Judiciário.
Não havia, portanto, Câmara
Municipal mais homogênea e unânime, conquanto seja da essência das assembleias
a heterogeneidade de opiniões dos seus membros.
As suas sessões eram marcadas,
regradas, como cenas de opereta, e traíam o ensaiador, o contrarregra e outros
úteis auxiliares de peças de teatro.
Aconteceu um dia que o chefe dos
chefes políticos do país, uma espécie do falecido general Pinheiro Machado,
veio a falecer e Leitão perdeu consequentemente todo o prestígio, pois não
tinha outro senão aquele que lhe emprestava o tal chefe dos chefes.
Logo que tal fato se deu, os
fabricantes de delegados do povo se insubordinaram e os vereadores de L.
começaram a palpitar qual deles seria o mais poderoso. Um tratou de agradar Cunegundes;
outro namorou Bernardino; um outro requestou Bertoldo; e todos brigaram entre
si.
O fato é que as sessões que eram
até aí harmoniosas como as representações de óperas, passaram a ser um
charivari de todos os diabos.
Houve bate-bocas terríveis e
descomposturas de mercado.
Toda a gente imaginou que o diabo
tinha entrado no corpo daquela gente, mas logo se soube a explicação natural da
profunda desavença que surgiu entre os vereadores de L.
Aproximava-se a terminação da
sessão ordinária e cada um dos edis desejava a prorrogação em extraordinária,
para poderem vencer o respectivo subsídio.
Estavam todos brigados e houve
temor de que o respectivo projeto não fosse aprovado.
Um mais ousado, porém,
apresentou-o e, ao contrário da expectativa, a coisa passou por unanimidade.
Estava feito o congraçamento dos
partidos.
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