Mambembes
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Com um vocábulo de origem
duvidosa — mambembe —, é costume se depreciar as companhias dramáticas do
interior.
Há nisso uma flagrante injustiça,
pois vai em tal depreciação um lastimável esquecimento dos serviços que essas
companhias têm prestado ao nosso teatro e à nossa cultura em geral.
Sem temor de errar, pode-se dizer
que as maiores glórias do palco nacional começaram e se educaram nessas
modestas troupes; e houve, mesmo há
ainda, dirigindo empresas teatrais ambulantes, diretores competentes, cuja
capacidade só não é verdadeiramente aquilatada e consagrada, devido à sua
invencível timidez e modéstia.
Todos conhecem os nomes
respeitados de Vicente Pontes, Capitão Cabral, Ribeiro Guimarães, Guilherme do
Rego, Capitão Dias e outros muitos que seria ocioso relembrar; todos se
recordam que João Caetano, Vasques, J. de Aguiar, Xisto Bahia, Amoedo, Eugênio
de Magalhães, Ferreira de Sousa se afirmaram grandes nos desdenhados mambembes.
E não podia ser de outra forma.
Entre nós jamais existiu uma
verdadeira escola dramática, um teatro normal, por isso as modestas companhias
da roça espontaneamente e inconvenientemente se transformam em fecundas escolas
e em viveiro de artistas do palco.
No nosso tempo, em que os
sociólogos muito encarecem a iniciativa individual, a vitalidade do esforço
desses obreiros humildes, desprotegidos dos poderes públicos e semidesdenhados,
obriga o estudioso a lhes dispensar consideração.
Demais, quem leva às populações
simples do nosso interior um pouco das puras emoções da arte e da beleza?...
Portanto, os serviços sociais dos
mambembes são valiosos; e se não imaginemos que, numa localidade qualquer,
naturalmente longínqua e pobre, um rapaz sente em si fogo sagrado da arte —
para onde se desse encaminhar? Para o mambembe.
Atira-se, faz pontas, desagrega o
seu talento, dá-lhe corpo e afinal procura um meio maior, onde se faz uma
celebridade. Pergunta-se: Quem o excitou? Quem o animou? Quem educou e dirigiu
a sua voação nascente?
O mambembe, não há como negar!
Objetarão que a escola é viciosa.
Não há dúvida que o é; mas se não há outra?...
Só se destrói o que se substitui.
Admitindo isso, se queremos ter atos corretos, impecáveis, devemos organizar
quanto antes um teatro normal, um conservatório dramático; então sim, o Brasil
poderá ter atores cômicos, dramáticos, trágicos perfeitamente superiores e as
exéquias serão cabidas.
Atualmente, forçoso é emendar, o
mambembe ainda é digno do respeito e da consideração do país inteiro.
O público e os ruralistas do
interior devem ter sempre em vista estas despretensiosas considerações; devem
ter em mira que, se nada há, a respeito de teatro, no próprio Rio de Janeiro,
exigir demasiado dos modestos e humildes atores do interior é disparatado; e
também não se deve esquecer que, entre os mambembeiros, pode estar um futuro
João Caetano, e que grande glória terá aquele que souber descobri-lo e
animá-lo.
No Brasil, é dessa massa que eles
se fizeram e se fazem.
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